Coluna no Correio: A articulação de Temer

Publicado em Economia

ANTONIO TEMÓTEO

 

Quem acompanha com lupa as movimentações políticas em Brasília e os impactos nos mercados das decisões tomadas na Esplanada dos Ministérios se impressionou com a capacidade de articulação do presidente da República, Michel Temer. Considerado carta fora do baralho por deputados e senadores que decretaram o fim da gestão do peemedebista, o chefe do Executivo mostrou ao país que, mesmo alvejado por graves denúncias de corrupção, mantém influência sobre a base parlamentar.

 

Não à toa, Temer deu duas demonstrações de força. Em um dia, aprovou a reforma trabalhista no Senado Federal com 50 votos favoráveis. No outro, conseguiu apoio de 40 deputados para rejeitar relatório da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, que recomendava o prosseguimento da denúncia contra ele por corrupção passiva. Mesmo que a guerra não tenha sido ganha, já que o tema ainda precisa ser apreciado pelo plenário da Casa, o chefe do Executivo termina a semana fortalecido.

 

Na última semana, o presidente foi vítima de fogo amigo que já dava como certa a ascensão do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), ao posto de presidente de República. Pesquisas realizadas por consultorias e veículos de comunicação profetizavam a derrota de Temer na CCJ. Para evitar o pior dos cenários, uma intensa troca de membros da comissão foi negociada. Com o apoio de líderes da base aliada, a estratégia garantiu a vitória do peemedebista.

 

Mesmo que não signifique o fim das investigações, o fato mostra que, diferentemente da antecessora Dilma Rousseff, ele está disposto a fazer qualquer negócio para se manter no Palácio do Planalto. “Uma derrota na comissão criaria o ambiente perfeito para que a denúncia fosse aceita pelo plenário na Câmara. Se o presidente não tem força para conseguir votos em uma comissão, imagine os de 172 deputados. Agora o jogo mudou”, afirma um banqueiro que acompanha diariamente as movimentações políticas na capital.

 

Louros

 

Pesa a favor de Temer o fato de conhecer como ninguém os corredores do Congresso Nacional e de ser um dos líderes do PMDB, partido com maior número de assentos no Legislativo. “É mentira essa conversa de que o mercado pouco se importa se Maia ou Temer estiverem no Planalto, desde que as reformas avancem”, disse outro banqueiro que já ocupou cargos na Esplanada. Segundo ele, Maia não governaria sem o apoio do PMDB e não tem a mesma força de articulação, mesmo tendo aliados na oposição. “O presidente, mesmo sem o apoio de Renan Calheiros (PMDB-AL), tem força no próprio partido. E isso é essencial. Dilma, por exemplo, não era petista histórica e não tinha apoio do próprio PT”, relembra.

 

O resultado de toda a articulação de Temer foram quatro dias seguidos de alta na Bolsa de Valores de São Paulo (B3) e queda no dólar. Na quinta-feira os Credit Default Swaps (CDS) brasileiros chegaram a 229 pontos, o menor patamar desde 16 de maio, dia anterior à revelação de que Joesley Batista havia grampeado o chefe do Executivo. Ontem, os seguros contra calote se mantiveram no mesmo patamar. “Mesmo que a condenação de Lula tenha causado euforia, fica claro que o movimento de recuperação da bolsa se desenhava desde o início da semana. E isso ocorreu não porque o ambiente externo está lindo, como de fato está. E sim pela capacidade de articulação do presidente”, sentencia um economista.

 

Resta saber se as vitórias conquistadas por Temer no Legislativo são os últimos atos de bravura de uma gestão que pode ser abatida no plenário da Câmara. Os mesmos banqueiros que se surpreenderam com as vitórias expressivas do presidente sabem que o preço para se livrar de denúncias às vezes são altos demais. “Da Câmara e dos deputados brasileiros esperamos tudo. Resta acompanhar o que ocorrerá nos próximos dias. Novas delações e gravações podem ser reveladas”, alerta.