Conversa com Guilherme Vaz

Publicado em Crônicas
1/12/1982. Crédito: Marcos de Oliveira/CB/D.A Press. Brasil. Brasília – DF. Entrevista com o compositor Guilherme Vaz.

 

Severino Francisco

Guilherme Vaz é uma das pessoas mais brilhantes que conheci.Ele criou mais de 60 trilhas sonoras para filmes e foi um dos compositores mais premiados do cinema brasileiro. E não se distinguia apenas pela quantidade, mas, principalmente, pela inventividade.Ele nos deixou em 2018.

Uma conversa com Guilherme era sempre um diálogo polêmico, provocador e imaginativo. Em 2012, quando eu escrevia o livro Da poeira à eletricidade – Uma história da música em Brasília, discuti muito com ele por e-mail.

Era um pensador e um franco-atirador, disparava em todas as direções. Admirava o rock candango da década de 1980 e considerava Renato Russo um dos raros intérpretes do silêncio e do vazio de Brasília.

Credito: Reproducão Facebook. Guilherme Vaz.

Eu dizia que Renato era o antistar, torto, gauche, deslocado até do rock. E Guilherme devolvia:”O bacana no Renato Russo é que ele não se tornou ‘um tropicalista de litoral’. Não fez sambinhas para agradar os malandros de litoral, mas permaneceu ‘candango’ elétrico e cantando

‘desafinado’ e de forma desajeitada dançando no palco. Permaneceu punk de cerrado,fiel a Brasília. Esse valor é muito claro nele, não negou a sua origem candanga.”

Incentivei Guilherme a escrever o texto sobre Renato, mas, infelizmente, ele adoeceu e não pôde registrar as ideias sobre o poeta do rock.

Crédito: Mila Petrillo/CB/D.A Press. Renato Russo, vocalista da banda Legião Urbana

E um outro tema frequente de nossas conversas era a mítica viagem de Tom Jobim e Vinicius de Moraes a Brasília em 1961 para compor a Sinfonia da Alvorada. Repassei o que cada um escreveu sobre a nova capital e Guilherme considerou os textos melhores do que o poema sinfônico da dupla: “Sim, mas digo a sonoridade é das matas na sinfonia do Tom. O que é muito bom, mas não é do cerrado, faltam espaços de silêncio. Ali, ainda não temos uma sonoridade do cerrado em tudo que se toca. Temos uma literatura, a de Guimarães Rosa.”

Acabou o espaço. Depois, continuo a evocar a fala provocadora de Guilherme:”Acho que ninguém mais moderno que o noel rosa, o único ‘sambista cadango’que conheço. A modernidade e a limpeza das suas letras,o jogo arquitetônico, o combogó das palavras, a clareza. Ele é o fundador do ‘samba punk’ de Brasília.”

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