Militares fora da reforma

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Padilha diz que governo se sensibilizou com os pleitos da caserna. Tempo na ativa será de 35 anos

CELIA PERRONE

O governo cedeu às pressões, e os militares ficarão de fora da reforma da Previdência Social. Havia uma cobrança enorme da equipe econômica para que as mudanças que estão sendo propostas acabassem com todos os privilégios, mas a gritaria da caserna prevaleceu. Segundo o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, a Constituição garante aos integrantes das Forças Armadas aposentadorias sem contribuição, pois todos estão permanentemente à disposição do Estado, seja quando estão em serviço, seja quando passam para a reserva.

A única mudança que o governo admite fazer, dentro do que está sendo proposto pelo Ministério da Fazenda, é ampliar de 30 para 35 anos o tempo do serviço militar. Com isso, se adiaria os gastos com a Previdência. Mas mesmo esse ponto ainda será negociado para que se chegue a um consenso. O Palácio do Planalto acredita que conseguirá convencer os comandantes do Exército, da Aeronáutica e da Marinha, que são contra, da importância de se estender o prazo para a aposentadoria. Neste ano, o sistema que garante benefícios aos militares registrará rombo próximo de R$ 32 bilhões, quase a metade de todo o buraco previsto para o regime dos servidores públicos.

O ministro da Defesa, Raul Jungmann trabalhou pesado para que os militares não fossem incluídos na reforma. Para ele, era uma questão de reconhecimento do governo com o comprometimento das Forças Armadas com questões cruciais para o país. Na avaliação do ministro, não era aceitável que os militares fossem inseridos no projeto de unificação dos sistemas previdenciários defendido pela Fazenda. Tal unificação seria, no entender de Jungmann, uma injustiça, pois militares e civis têm funções muitos distintas, sendo que o primeiro grupo executa missões constitucionais.

Filhas solteiras

Outro argumento apresentado pelo governo para excluir os militares da reforma foi o de que distorções como pensões para filhas solteiras foram corrigidas. Desde 2001, as descendentes daqueles que entraram nas Forças Armadas a partir daquele ano não têm mais direito ao benefício. O problema é que as filhas que continuam recebendo as pensões custam caro e muitas delas não são casadas no papel, mas têm marido e filhos, burlando o que diz a lei.

Segundo Padilha, o presidente interino, Michel Temer, está sensível a todos os pleitos dos militares. E isso já foi avisado à equipe econômica. A meta do governo é enviar a reforma da Previdência ao Congresso até o fim do ano, para que as medidas sejam aprovadas ainda no primeiro semestre de 2017. Os especialistas temem que o recuo do governo no caso de militares seja estendido a outras carreiras, como policiais e professores, que podem se aposentar depois de 25 anos de trabalho.

Reforma da Previdência cria divisão no governo

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Unificação dos sistemas previdenciários de servidores civis, militares e trabalhadores da iniciativa privada provoca choque entre a Casa Civil e o Ministério da Defesa. Forças Armadas querem manter regime próprio que garante benefícios à carreira. Para especialista, pensão de militares é pouco discutida. Deficit atuarial da categoria era de R$ 1,3 trilhão. Jungmann alega que membros da caserna não têm direitos garantidos aos civis

CELIA PERRONE

O governo começou a rachar em relação à reforma da Previdência antes mesmo de o projeto ficar pronto. O ministro da Defesa, Raul Jungmann, e o da Casa Civil, Eliseu Padilha, divergem em relação à proposta de unificar os sistemas previdenciários de trabalhadores da iniciativa privada, servidores e militares. Jungmann é contra a unificação. “Os integrantes da carreira militar são obrigados a renunciar a uma série de direitos que são garantidos aos servidores civis”, tem dito ele em reuniões em que o assunto vem à baila. Para Padilha, não pode haver distinção e é preciso que todos deem sua cota de sacrifício e abram mão de privilégios.

Ex-ministro da Previdência no governo Fernando Henrique Cardoso, José Cechin considera natural que setores da sociedade lutem para preservar benefícios, mas diz que cabe ao governo decidir. “A carreira militar é altamente hierarquizada, com afunilamento progressivo, e tem de ser assim. Isso a faz diferente das outras, mas não justifica que ela tenha privilégios em relação às demais”, ressaltou.

Cechin explicou que, após exercer por 10 anos a mesma função, o militar é obrigatoriamente reformado. “Esse é um dado típico dos militares no mundo inteiro. No entanto, não necessariamente ele deve ser promovido e levar o último salário integral para o resto da vida. Deve receber o valor mensal correspondente ao que contribuiu. Há que se reconhecer o esforço contributivo de cada um”, defendeu.

O professor da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da Fundação Getulio Vargas (Ebape/ FGV) Istvan Karoly Kasznar salienta que a Constituição estabelece que todos são iguais perante a lei. Portanto, ela é desrespeitada quando se proporciona aposentadoria integral para funcionários públicos civis e militares, e o mesmo não é concedido a trabalhadores da iniciativa privada. Ele concorda, contudo, que a categoria militar tem certas peculiaridades que devem ser contempladas na legislação.

Guerra

A lei deve ter a flexibilidade de prever que militares e civis sejam tratados igualmente em tempos de paz e de modo diferenciado em épocas de periculosidade, como uma guerra. A última vez que o Brasil mandou homens para um conflito foi na Segunda Guerra Mundial. Já se vão mais de 70 anos”, argumentou Kasznar. “Também temos que olhar os riscos que policiais militares correm em cidades como São Paulo e Rio de Janeiro. Só neste ano 70 policiais civis e militares morreram no Rio. A aposentadoria especial e pensões para mulheres e filhos desses policiais, nesses casos, é essencial”, frisou.

O professor José Roberto da Savóia, da Universidade de São Paulo (USP), que foi secretário de Previdência Social de 2001 a 2003, ressaltou que o sistema de previdência dos militares é tratado como um não assunto pelo governo. “Falta transparência. A pensão dos militares não é tema de análises. No balanço da União não aparece o regime militar, mas precisamos mudar esses parâmetros”, afirmou. “O período mais curto de atividade talvez seja o ponto mais crítico para a construção de uma proposta mas, contornando isso, podemos, sim, fazer a unificação dos sistemas. As regras de proporcionalidade caberiam na aposentadoria do militar. O que não dá mais é carregar o deficit atuarial dessa categoria que atingiu a astronômica cifra de R$ 1,3 trilhão em 2014”, disse.

Preocupação

A reforma do sistema previdenciário tem causado inquietação no Ministério da Defesa. Na pasta, o assunto é acompanhado e discutido em reuniões com a participação do secretário-geral do ministério, Joaquim Silva e Luna e representantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica. Jungmann observa que as discussões ainda são preliminares. Portanto, será possível chegar a um projeto de consenso, e que o que for decidido será acatado. “Mas acho justo um tratamento diferenciado para os militares”, frisa.