Relatório da MP 870 fragiliza a atuação da Receita Federal e enfraquece o combate à corrupção no Brasil

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“Se essas alterações na Lei 10.593, de 6 de dezembro de 2002 já estivessem em vigor, operações como a Lava Jato jamais teriam a dimensão que todos reconhecem. Não faz sentido, especialmente, após uma eleição presidencial marcada pelo forte discurso de combate à corrupção que se desmonte as estruturas de controle e que se crie no país dificuldades para a atuação integrada desses órgãos”

Geraldo Seixas*

O senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE) apresentou dia 7, seu relatório sobre a Medida Provisória 870, que tem por objetivo reorganizar a estrutura administrativa do governo. No entanto, o texto que deveria se limitar às mudanças administrativas em ministérios e órgãos da Presidência da República recebeu uma preocupante emenda.

A emenda que não guarda relação com o teor específico do projeto reduz o poder de atuação da Receita Federal do Brasil e compromete as ações de combate à corrupção e o enfrentamento a crimes como caixa dois, evasão de divisas, lavagem de dinheiro e outros. Sob a justificativa de promover maior segurança jurídica e preservar as garantias constitucionais da intimidade e do sigilo de dados, a referida emenda, na prática, impede que operações de combate à corrupção possam ser executadas a partir de informações que venham a ser descobertas em ações fiscais empreendidas pela Receita Federal. Se essas alterações na Lei 10.593, de 6 de dezembro de 2002 já estivessem em vigor, operações como a Lava Jato jamais teriam a dimensão que todos reconhecem.

O relatório apresentado e que pode ser votado essa semana propõe alterações na Lei 10.593 e determina que mesmo que a Receita Federal se depare com indícios de crimes diversos, durante à investigação de crimes contra a ordem tributária e/ou relacionados ao controle aduaneiro, esses indícios não podem ser compartilhados, sem ordem judicial, com órgãos ou autoridades a quem é vedado o acesso direto às informações bancárias e fiscais do sujeito passivo.

É importante ressaltar que a Receita Federal do Brasil possui normas internas e regras expressas em portarias que regulamentam as representações fiscais para fins penais e atos de improbidade que são encaminhadas pela RFB ao Ministério Público Federal competente para promover ações penais.

Recentemente, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, em memorial enviado aos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), sustentou que o compartilhamento, com o Ministério Público, de informações bancárias e fiscais obtidas por autoridades fazendárias no curso de fiscalizações não necessita de prévia autorização judicial. O entendimento foi defendido pela procuradora-geral da República que argumentou que a troca de informações, com a devida transferência do sigilo, é constitucional e que não há necessidade de a Justiça autorizar o compartilhamento de informações bancárias da Receita Federal ao Ministério Público, porque a transferência de dados não implica quebra de sigilo bancário, já que o MP continuará a resguardar as informações compartilhadas pelo órgão fiscal. Entendimento que, inclusive, tem sido aplicado pelo STF que reconhece a legalidade da utilização da prova obtida diretamente pelo Fisco para fins penais.

Se essa MP for aprovada com a inclusão dessa emenda, esforços empreendidos no País para combater a corrupção serão comprometidos. Não faz sentido, especialmente, após uma eleição presidencial marcada pelo forte discurso de combate à corrupção que se desmonte as estruturas de controle e que se crie no país dificuldades para a atuação integrada desses órgãos. Mais ainda, essa emenda segue em sentido contrário às boas práticas internacionais que avançam, cada vez mais, no sentido da integração de órgãos de controle, de inteligência e de combate a crimes como corrupção, lavagem de dinheiro, evasão de divisas que estão interligados ao crime organizado.

É preciso que a Comissão que analisa a MP 870 avalie e retire do texto essa emenda, que vai na contramão do desejo da sociedade que deu um recado claro a todas as autoridades e que cobra, cada vez mais, eficiência e transparência do Estado e exige que se dê um basta à corrupção.

*Geraldo Seixas – presidente do Sindicato Nacional dos Analistas-Tributários da Receita Federal do Brasil (Sindireceita)

Lava Jato/RJ: Operação Rizoma revela que fundos dos Correios – o Postalis – e Serpros eram usados em esquema criminoso

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Doleiros da organização criminosa do ex-governador do Rio, Sérgio Cabral, foram usados para lavar dinheiro a empresário envolvido em fraudes em fundos de pensão

A força-tarefa da Lava Jato do MPF no Rio e a Polícia Federal (PF) deflagraram hoje, 12, a Operação Rizoma, fase que envolve desvio de verbas dos fundos de pensão dos Correios – o Postalis – e do Serpros. Nesta manhã, foram cumpridos 10 mandados de prisão preventiva e 21 de busca e apreensão nos estados do Rio de Janeiro, em São Paulo e Brasília, além da intimação de um investigado a comparecer a PF para depoimento.

As medidas cautelares embasam-se em ilícitos ligados a crimes de evasão de divisas, de lavagem de dinheiro, inclusive no âmbito transnacional, de corrupção e contra o sistema financeiro nacional, encabeçado pelo empresário Arthur Machado, um dos fundadores e CEO da Americas Trading Group (ATG), empresa que atua diretamente no mercado financeiro e foi considerada a “nova bolsa de valores brasileira”.

Em 2010, mesmo ano da fundação da ATG, Arthur Machado constituiu o fundo de investimentos em participação Eletronic Tranding Brazil (FIP ETB), para angariar recursos na “nova bolsa”. Tal projeto teve dois grandes investidores iniciais, as empresas de responsabilidade do próprio empresário e o fundo de pensão Postalis, que ingressou como cotista investindo R$ 119 milhões.

Em 2013, o Serpros começou a adquirir cotas do FIP ETB, realizando até 2015, o aporte total de R$ 72 milhões no fundo de investimento. Além disso, os dois fundos compraram títulos de dívidas (debêntures) nos valores de R$ 107 mil e R$ 241 mil, respectivamente de outra empresa ligada a Arthur Machado, a Xnice Participações.

Com o auxílio de acordo de colaboração premiada, foi possível descobrir que os investimentos dos referidos fundos de pensão se deram em contrapartida a vantagens indevidas pagas por Arthur Pinheiro Machado.

Para gerar os reais em espécie no Brasil, necessários para o pagamento de vantagens indevidas aos responsáveis pelos fundos de pensão, o empresário empregou uma série de sofisticados esquemas de lavagem de dinheiro, com o auxílio de doleiros da organização criminosa de Sérgio Cabral.

O esquema de lavagem de dinheiro contou ainda com o auxílio do operador financeiro Edward Penn, que possibilitou o envio de R$ 45 milhões para contas internacionais, que posteriormente voltaram ao Brasil em espécie.

Também são investigadas nessa fase da operação investimentos feitos por fundos de pensões no empreendimento LSH, de propriedade de Arthur Soares, que já tinha sido investigado na Operação Unfair Play.

“Tal etapa afeta em especial os trabalhadores, uma vez que envolve o desvio de verbas dos fundos de pensão Postalis e Serpros. Atualmente, muitas pessoas buscam investir em um fundo complementar de aposentadoria a fim de garantir uma velhice digna, com uma aposentadoria satisfatória. Contudo, os desvios de numerário dos fundos de pensão geram um déficit nas contas do fundo, o que obriga aos trabalhadores a realizarem contribuições extraordinárias para cobrir o rombo”, analisa o juiz Federal, em sua decisão, ao autorizar a cautelar.

A Operação Rizoma é desdobramento das Operações Eficiência, Hic et Ubique e Unfair Play, tendo como finalidade aprofundar as investigações relacionadas à organização chefiada por Sérgio Cabral.

A partir de acordo de colaboração premiada, bem como provas obtidas por medidas cautelares autorizadas pelo Juízo da 7ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro, foi revelado como doleiros da organização criminosa de Sérgio Cabral foram utilizados para lavar dinheiro para esquema criminoso envolvendo os fundos de pensão.

Prisões preventivas

Os mandados de prisão preventivas e busca e apreensão foram expedidos contra Arthur Mario Pinheiro Machado, Edward Gaed Penn, Ricardo Siqueira Rodrigues, Marcelo Borges Sereno, Carlos Alberto Valadares Pereira (Gandola), Adeilson Ribeiro Telles, Henrique Santos Barbosa, Milton de Oliveira Lyra Filho, Patricia Bittencourt de Almeida Iriarte e Gian Bruno Boccardo Lanz Lahmeyer Lobo. Já Maurício Pinto foi intimado para prestar depoimento.

O nome da Operação de hoje, Rizoma, refere-se ao conceito da biologia que significa um tipo de caule subterrâneo que se ramifica por debaixo da terra, escondido, similar ao processo de lavagem de dinheiro.