Anac prejudica Receita Federal nos aeroportos

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“A exigência dessas inspeções constantes prejudica o trabalho de controle aduaneiro e, de certa forma, retirando do servidor da Receita Federal do Brasil a imprescindível “agilidade” que as ações de fiscalização necessitam. Do ponto de vista de um órgão que realiza apreensão de drogas, contrabandos, descaminhos, armas, munições, detenção de passageiros, a Receita Federal do Brasil faz parte das ações de segurança que permeiam os nossos aeroportos. Há uma incoerência na resolução da ANAC, pois o que deveria ocorrer é uma integração das ações desse órgão com as ações da Receita Federal, com o objetivo de fortalecer a segurança aeroportuária”

*Geraldo Seixas

Ações de combate ao contrabando e descaminho ocorrem diariamente nos Aeroportos Internacionais do Brasil, todas realizadas pelos servidores da Receita Federal, destacando a atuação dos Analistas-Tributários. São inúmeros casos de apreensões de drogas ilícitas, armas, aparelhos eletrônicos irregulares, produto piratas, todos ocorrendo nas instalações aeroportuárias e que são identificados pela atuação de equipes altamente treinadas da Aduana brasileira.

Na madrugada de sábado, 26 de janeiro, durante operação no Aeroporto de Guarulhos, os cães de faro da Divisão de Vigilância e Repressão ao Contrabando e Descaminho (Direp) da Receita Federal em São Paulo, identificaram duas bagagens que continham drogas ilícitas, uma iria para a República da Guiné e a outra o Líbano. Essa ação de controle aduaneiro, realizada em um dos maiores aeroportos do país, resultou na apreensão de 11 kg de cocaína e na prisão de duas pessoas por tráfico internacional de entorpecentes. Ao longo de 2018, quase duas toneladas de drogas foram apreendidas pela Receita Federal, em atuação conjunta com a Polícia Federal, no Aeroporto Internacional de Guarulhos, em São Paulo.

Em Viracopos, outro importante aeroporto do maior estado do Brasil, o valor das apreensões realizadas pela Receita Federal chegou a R$ 74,3 milhões em 2018. Na lista dos produtos ilegais identificados e apreendidos pela Aduana brasileira em Viracopos cabe destacar duas aeronaves, seis cavalos, R$ 1,1 milhão de cigarros, dois motores para aviação e medicamentos. Neste mesmo terminal aeroportuário alfandegado os servidores da Receita Federal do Brasil realizaram, em setembro de 2018, a apreensão de US$ 1,4 milhão e R$ 55 mil em dinheiro, e cerca de 20 relógios, avaliados em US$ 15 milhões, com membros de uma comitiva da Guiné Equatorial que desembarcava no Brasil com a presença do vice-presidente do país africano, Teodoro Obiang Mang.

Essa rotina de apreensões não é diferente em outros aeroportos internacionais brasileiros. No norte do país, no Aeroporto Internacional Eduardo Gomes em Manaus, estado do Amazonas, a Receita Federal apreendeu R$ 42 mil em pérolas e brilhantes em bagagem de passageiro de voo doméstico, pertencentes a uma empresa envolvida na Operação Elemento 79, que desarticulou organização criminosa voltada ao comércio ilegal de ouro. Já no sul do país, no Aeroporto Salgado Filho, em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, a fiscalização da Receita Federal, somente no primeiro semestre de 2018, realizou 394 apreensões que resultaram em 429 termos de retenção, com um valor dos bens retidos de mais de R$ 1,747 milhão. As multas aplicadas somaram mais de R$ 219 mil.

De cocaína a joias a Receita Federal do Brasil, através da atuação dos Analistas-Tributários e demais servidores do órgão realiza nos Aeroportos Internacionais um trabalho que tem por objetivo o exercício da administração aduaneira, que compreende a fiscalização e o controle sobre o comércio exterior, essenciais à defesa dos interesses fazendários nacionais, em todo o território aduaneiro, previsto no artigo 37 da Constituição Federal. Esse controle aduaneiro promovido pela Aduana brasileira não tem caráter arrecadatório, pois o bem tutelado pelo Estado não é o tributo, mas a segurança da sociedade. A fiscalização aduaneira verifica, por exemplo, se a mercadoria recebeu as devidas anuências, oferecendo, portanto, condições de sanidade e segurança para o uso do
consumidor, ou identifica produtos ilícitos sendo retirados ou entrando no país e que certamente são frutos de diversos crimes pretéritos e que ocasionaram ilicitudes futuras.

Todo o trabalho de excelência realizado pela Receita Federal do Brasil nos aeroportos foi retratado no canal National Geographic, que escolheu o Aeroporto Internacional de Guarulhos, em São Paulo, como palco para as filmagens de uma série que já está na sua quarta temporada. O canal define Guarulhos como a principal conexão do Brasil com o resto do mundo, e no monstruoso terminal aéreo transitam cerca de 37 milhões de pessoas por ano, o que fez dele um ponto estratégico na rota da droga e a atuação da Receita Federal é apresentada como fundamental no combate ao tráfico e ao contrabando. Ainda no campo do reconhecimento a Organização Mundial das Aduanas destacou o trabalho em fiscalização aduaneira realizado por Analistas-Tributários no Aeroporto Internacional de Guarulhos no relatório “Operation WESTERLIES 3 – A joint enforcement operation against illicit trafficking in methamphetamine by air passengers” (Operação Westerlies 3 – Uma operação de fiscalização conjunta contra o tráfico ilícito de metanfetaminas por passageiros de transportes aéreos), demonstrando a qualidade das ações da Receita Federal.

Mesmo diante de todas as atividades realizadas pela Receita Federal do Brasil nos aeroportos internacionais e do reconhecimento internacional, relacionadas diretamente à segurança da sociedade, a Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC), em 2013, promoveu, por meio da Resolução ANAC nº 278/2013, alteração na Resolução ANAC nº 207/2011, instituindo a exigência para que todos os servidores da Receita Federal do Brasil, Analistas-Tributários e Auditores-Fiscais, passassem a ser obrigatoriamente submetidos à inspeções de segurança múltiplas a cada ingresso nas áreas de acesso restritos dos aeroportos brasileiros, comprometendo sobremaneira a execução das atividades de controle aduaneiro nas dependências internas dos terminais aeroportuários. Diante desse
absurdo normativo, decidido de forma unilateral pela ANAC, no qual se verifica uma verdadeira lesão no exercício da função inerente à Carreira Tributária e Aduaneira da Receita Federal do Brasil, o Sindireceita (Sindicato dos Analistas- Tributários) e o Sindifisco Nacional (Sindicato dos Auditores-Fiscais) impetraram conjuntamente Mandado de Segurança, tombado sob o número 0043545-
86.2013.4.01.3400, para afastar a aplicação da malfadada Resolução da ANAC.

Ainda em 2013, após regular trâmite processual, a justiça federal do Distrito Federal concedeu liminar suspendendo os efeitos da referida Resolução “quanto à obrigação de os Auditores-Fiscais e Analistas-Tributários substituídos dos Sindicatos impetrantes, em exercício nos aeroportos brasileiros, serem submetidos à inspeção de segurança”. Infelizmente, em dezembro de 2018, após 05 anos de suspensão liminar dos efeitos da norma, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), em decisão monocrática do relator, concedeu efeito suspensivo ao recurso de apelação interposto pela Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC), restabelecendo, com isso, os efeitos da Resolução ANAC 278/2013, que impõe a realização de múltiplas e constantes inspeções de segurança para servidores da Carreira Tributária e Aduaneira da Receita Federal do Brasil em exercício na fiscalização e controle aduaneiro nos aeroportos internacionais do País. Vale salientar que durante os 05 anos de vigência da liminar, período em que o Brasil sediou a Copa do Mundo da Fifa de 2014 e as Olimpíadas do Rio de Janeiro de 2016, não fora registrado nenhuma atuação de Receita Federal que comprometesse a segurança aeroportuária, muito ao contrário! O que se registrou foi uma atuação que mereceu o reconhecimento de órgãos internacionais, conforme noticiado acima.

As consequências negativas dessas inspeções físicas constantes, às quais estão submetidos os Analistas-Tributários e outros servidores da Receita Federal do Brasil, são de fácil compreensão. As equipes que atuam no controle de bagagem, de cargas e de pistas da Receita Federal do Brasil, durante sua jornada de trabalho, deslocam-se diversas vezes por várias áreas dos aeroportos. Cada
movimentação de uma área para outra passa a requerer que o servidor seja obrigado a se submeter à nova inspeção pessoa de segurança. Se o servidor está na área de bagagem e precisa ir ao pátio onde está ocorrendo um desembarque de bagagem ou cargas, ele deve se submeter à inspeção, ao retornar sofrerá nova inspeção, se sair para ir ao banheiro ao retornar, nova inspeção. Se for realizar na área externa do aeroporto o acompanhamento de algum passageiro suspeito, determinado pela análise de risco, ao retornar precisa de inspeção. Enfim, no decorrer de cada jornada de trabalho o servidor acaba sendo submetido a inúmeras inspeções.

Durante as operações de vigilância com a utilização de veículos para circulação no pátio interno dos aeroportos, durante o deslocamento das equipes, ao se transitar por áreas controladas, o veículo e os servidores sofrem inspeção e, para surpresa, até o agente canino das equipes K9 (cão de faro), importantíssimas na identificação de cargas e malas contendo drogas ilícitas, são alvos da inspeção física de segurança.

A exigência dessas inspeções constantes prejudica o trabalho de controle aduaneiro e, de certa forma, retirando do servidor da Receita Federal do Brasil a imprescindível “agilidade” que as ações de fiscalização necessitam. Do ponto de vista de um órgão que realiza apreensão de drogas, contrabandos, descaminhos, armas, munições, detenção de passageiros, a Receita Federal do Brasil faz parte
das ações de segurança que permeiam os nossos aeroportos. Há uma incoerência na resolução da ANAC, pois o que deveria ocorrer é uma integração das ações desse órgão com as ações da Receita Federal, com o objetivo de fortalecer a segurança aeroportuária.

A incoerência ululante dessa resolução da ANAC reside no fato de que, sendo a Receita Federal um órgão que atua em favor da segurança da sociedade e, consequentemente, dos aeroportos, a ANAC deveria ter promovido uma integração de ações que refletissem em reforço na segurança aeroportuária, não algo que além de não integrar, compromete a agilidade na atuação do outro órgão de controle.

A Receita Federal do Brasil já conta com um quadro funcional reduzido (50% do que seria minimamente necessário), realidade que prejudica o controle aduaneiro em nossas fronteiras terrestres que sofrem com a falta de servidores e agora, como se não bastasse, a ANAC, com essa inovação, tenta comprometer ainda mais a atuação do órgão que inclusive é o responsável pela autorização de alfandegamento dos aeroportos internacionais. Pergunta-se: a quem interessa o enfraquecimento do órgão responsável pelo controle aduaneiro dos aeroportos?

*Geraldo Seixas – presidente do Sindicato Nacional dos Analistas-tributários da Receita Federal (Sindireceita)