Aumento de jornada é inconstitucional, dizem especialistas

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Estatais que queiram alterar o horário de expediente terão que consultar, primeiro, os trabalhadores e conquistar o consentimento de cada um. O Comando Nacional dos Bancários conseguiu impedir a execução da MP 905/2019 até que seja concluída a negociação entre a Febraban e a representação da categoria. A próxima reunião será no dia 26 de novembro

Às vésperas do feriado de Proclamação da República, os servidores levaram um susto com a decisão da Caixa Econômica Federal de ampliar a jornada de trabalho de seis para oito horas (com exceção dos caixas), para se adequar às determinações da Medida Provisória (MP 905), editada na terça-feira, que flexibiliza os contratos de trabalho. Horas depois, o banco recuou. Admitiu que não poderia ferir as regras dos editais dos concursos de seus funcionários. Mas a dúvida entre servidores do Executivo e no Judiciário que só trabalham seis horas por dia, se serão ou não afetados, permaneceu. Segundo especialistas, os servidores podem ficar tranquilos. As novas regras só podem valer para os futuros concursados.

Caso o governo decida aplicar as imposições da MP ao pessoal atualmente na ativa, vai dar tiro no pé. Terá que iniciar imediata expansão de gastos. Seria um contraste com as metas de ajuste fiscal da equipe econômica do presidente Jair Bolsonaro. “Não é possível aumentar a carga horária sem aumentar o salário proporcionalmente. Caso contrário, a medida é inconstitucional e fere o princípio da irredutibilidade de vencimentos”, garante Mônica Sapucaia Machado, especialista em direito político e econômico e professora da Escola de Direito do Brasil (EDB).

A Caixa – ou qualquer empresa estatal com a intenção de alterar o expediente – teria que consultar primeiro os trabalhadores e conquistar o consentimento de cada um. “Os contratos de trabalho da CEF são originários de editais de processo seletivo público. Se nos editais não existir aumento de carga horária com aumento de vencimentos, será necessário negociação com o empregado e aceitação do mesmo da nova jornada”, afirma Mônica Sapucaia Machado. A advogada constitucionalista Vera Chemim, especialista em direito público administrativo, explica que, apesar dos objetivos de modernização da MP 905, alguns pontos podem ser contestados.

Normas

Entre eles, o respeito ao direito adquirido. “Assim, tal regra, se aprovada, só valerá para trabalhadores ou servidores admitidos a partir da data de sua vigência. Há que se respeitar, respectivamente, o contrato de trabalho e as normas que vigiam à época da admissão por concurso público”, enfatiza a advogada. Vera Chemim alerta que, mesmo que apenas os futuros servidores venham a ser admitidos em novo modelo, a forma de contratação não pode ferir o direito fundamental individual.

“Regras diferenciadas para os trabalhadores em geral correm o risco de afrontar o princípio da igualdade”, lembra. Os servidores também devem ficar atentos. Na hipótese de haver na MP 905 um dispositivo já tenha constado em MP anterior (a MP 881, por exemplo, da liberdade econômica), o item deve ser excluído, já que a Constituição proíbe a reedição na mesma sessão legislativa. Ou seja, no mesmo ano em que o outro dispositivo foi editado e rejeitado pelo Congresso Nacional.

Bárbara Anacleto, do núcleo trabalhista do Nelson Wilians e Advogados Associados, detalha que os funcionários da Caixa estão sujeito às normas da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT). Como a MP 905 prevê a alteração da jornada do bancário, põe fim ao expediente de seis horas e determina o trabalho aos sábados e domingos, os futuros servidores não poderão contestar as regras, que deverão estar detalhadas nos editais dos concursos daqui para frente. “Com a MP em vigência, que tem eficácia imediata, é possível a alteração da jornada dos bancários. E é preciso considerar os benefícios dos maiores períodos diários e aos sábados. Será um benefício para quem busca a agências físicas e tem dificuldades para ir a um posto bancário no horário comercial nos dias de semana”, defende Bárbara Anacleto.

Sem apoio

O Senado Federal abriu consulta pública sobre a MP 905, com a pergunta “Você apoia essa proposição?” (https://www12.senado.leg.br/ecidadania/visualizacaomateria?id=139757 ). Até as 18h55 de quinta-feira (14), o “não” estava à frente, com 39.352 votos, contra 936 votos pelo “sim”. Ontem, o Comando Nacional dos Bancários se reuniu com a Federação Nacional dos Bancos (Fenaban) para tratar do assunto. “O Comando Nacional conseguiu segurar a implantação da MP 905/2019 até que seja concluída a negociação com a representação da categoria. A próxima reunião será no dia 26”, informam os bancários. Juvandia Moreira, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf) crê que, pelo texto da MP, “não resta dúvidas de que alguns artigos foram incluídos a pedido dos bancos”.

“Fomos negativamente surpreendidos pela publicação desta MP, que é, na verdade, um aprofundamento da reforma trabalhista”, disse Juvandia. Por meio de nota, o Ministério da Economia (ME) informa que não há qualquer dispositivo na MP 905 que afete o serviço público federal. “De acordo com a Lei nº 8.112, a jornada de trabalho dos servidores deve respeitar a duração máxima de 40 horas semanais, com a exceção das demais jornadas estabelecidas em leis especiais, como para alguns cargos da área de saúde, por exemplo”.

O órgão lembrou ainda que a Instrução Normativa nº 2, de setembro de 2018, “estabelece que o servidor público da administração pública federal direta, autárquica e fundacional pode requerer a redução da jornada de trabalho”. Também por meio de nota, a Caixa informa que “os reflexos da MP 905/2019 estão em avaliação, e eventuais medidas serão comunicadas oportunamente”. Os servidores estão de olho no desenrolar nas discussões. Rudinei Marques, presidente do Fórum Nacional das Carreiras de Estado (Fonacate) lembra que o serviço público não está preparado para aumento de jornada. “Algumas estatais, como é o caso do Banco do Brasil, já fizeram adequação do pessoal de oito horas, para seis horas, com indenizações, inclusive, para evitar ações judiciais”.

Sérgio Ronaldo da Silva, secretário-geral da Confederação Nacional dos Trabalhadores no Serviço Público (Condsef) concorda que a “medida foi açodada, sem consulta aos maiores interessados e deve causar uma enxurrada de ações judiciais”. Os servidores estão se organizando. Na segunda-feira (18), a Condsef se reúne em São Paulo com as centrais sindicais. Na terça-feira (19), a Frente Parlamentar em Defesa do Serviço Público vai traçar, em Brasília, estratégias de convencimento de deputados e senadores. No dia 23, haverá plenária, no Sindicato dos Bancários, com servidores das três esferas (estadual, municipal e federal). E de 3 a 15 de dezembro, a Condsef fará um Congresso para construir um método de defesa para 2020.

Andes – Governo faz nova reforma trabalhista com a MP 905/2019

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O Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes) alerta que, sob o pretexto de geração de empregos, a Medida Provisória 905/2019, publicada ontem (12) no Diário Oficial da União (DOU), faz “um verdadeiro desmonte da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT)”. A MP da “Carteira verde e amarela” – como foi apelidada – garante uma série de isenções fiscais aos empregadores, flexibiliza a legislação para permitir trabalho aos domingos e feriados, institui a contribuição previdenciária do Seguro Desemprego, entre outros, aponta

De acordo com o Antes, com ganho mensal limitado a 1,5 salário mínimo por mês (hoje, R$ 1.497), a nova modalidade de contratação poderá ser adotada para qualquer tipo de atividade, inclusive para substituição transitória de pessoa permanente. Veja os dados elencados pelo sindicato:

Benefícios para as empresas

Com as mudanças na legislação, os empregadores terão exoneração de mais de 30% no custo das contratações. Segundo dados apresentados pelo Ministério da Economia, o custo da desoneração gira em torno de R$ 2 bilhões/ano.

As empresas que contratarem trabalhadores sob o novo regime serão beneficiadas com isenção da contribuição previdenciária patronal e o salário-educação, tributos que incidem sobre a folha de pagamento, e sobre as contribuições ao Sistema S.

Também terão redução da alíquota de contribuição do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), de 8% para 2%, e redução da multa do FGTS em caso demissão sem justa causa, de 40% para 20%, desde que haja acordo entre as partes.

Prejuízo para os trabalhadores

De acordo com o governo, a desoneração das empresas será financiada pelos trabalhadores desempregados, dos quais será cobrada a contribuição previdenciária do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). O recolhimento será feito a uma alíquota de 7,5% durante os meses em que o trabalhador desempregado receber o benefício, que, na legislação atual, é entre três a cinco parcelas. Com isso, o governo espera arrecadar R$ 2,2 bilhões/ano.

A MP reduz uma série de direitos, como a multa sobre o saldo do FGTS em caso de demissão sem justa causa, que será de 20%. E institui no corpo da lei o banco de horas para os trabalhadores.

A nova medida extingue, ainda, vários dispositivos da CLT, muitos dos quais relacionados aos órgãos e mecanismos de fiscalização e aplicação de penalidades vinculados ao Ministério do Trabalho.

Além disso, a MP 905 altera diversas legislações específicas referentes a regulamentação e registro de profissões como jornalistas, publicitários, corretores de seguro, químicos, arquivistas, radialistas, músicos, estatísticos, sociólogos, secretários, entre outras.

Avaliação

Antonio Gonçalves, presidente do Andes-SN, destaca que essa medida provisória tem como objetivo claro intensificar a expropriação do trabalho, para manter o processo de acumulação do Capital.

“Em um momento em que o desemprego está extremamente elevado e há ampliação da extrema pobreza, o governo sinaliza com uma medida que tem como pressuposto a ampliação do emprego, mas que, na verdade, estimulará o subemprego. Extingue inclusive vários mecanismos de fiscalização e punição para o combate à precarização das condições de trabalho”, avalia.

Para o presidente do Sindicato Nacional, a MP 905/2019 irá promover um rebaixamento de salário, dos direitos sociais e uma substituição de mão de obra. “Um governo que não tem nenhum compromisso com a fiscalização em diversas áreas, também não será capaz de impedir que os trabalhadores atuais, contratados nos moldes da CLT, sejam paulatinamente substituídos por essa nova forma de contratação”, explica.

Gonçalves alerta para o fato de que, com a MP, a política econômica ultraliberal do governo avança, na medida em são atacadas a contratação via CLT e também a contratação pelo Regime Jurídico Único (RJU). “São ações combinadas. Se avaliarmos de um modo mais amplo, essas medidas anunciadas recentemente pelo governo afetam a contratação do mercado privado e também de servidores públicos. Com essa medida, o governo promove uma nova reforma trabalhista. E com as PEC do Plano Mais Brasil, sinaliza para uma nova constituinte”, aponta.

Protesto

Reunidos em São Paulo no mesmo dia entrega da chamada PEC Emergencial do governo de Jair Bolsonaro, em 5 de novembro, representantes das principais centrais sindicais do Brasil decidiram denunciar contra o “pacote de maldades” do governo que atinge em especial a classe trabalhadora e os mais pobres.

Para isso, será necessário muito debate público, mobilização e luta, incluindo a ação parlamentar no Congresso Nacional, que vai debater a proposta. Nesta quarta-feira (13), as centrais sindicais realizaram um ato, com início às 9 horas, em frente ao Teatro Municipal de São Paulo (SP), “contra o pacote de maldades do governo Bolsonaro”.

Reforma administrativa terá impacto de R$ 15 bilhões em 10 anos

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Governo quer manter carreiras de Estado, por 10 anos, em uma situação híbrida: sem estabilidade garantida, mas com características do Regime Jurídico Único (RJU), criado pela lei 8.112/1990, que define as regras próprias da estabilidade

A confusão de conceitos e as controvérsias são os motivos do novo atraso para a entrega do texto ao Congresso. Embora o Executivo tenha reiterado, inúmeras vezes, que a proposta de reforma administrativa estará pronta, “na semana que vem”, técnicos do governo garantem que ainda não será dessa vez. “O atraso, agora, é a discussão exclusivamente sobre como será ‘esse estado de teste’ e por quanto tempo”, dizem membros da equipe econômica. A principal dúvida é sobre como tratar a elite do funcionalismo (20% dos federais).

“Tem muita discussão inconclusa. A ideia de uns é manter uma espécie de RJU,  que pode não ser juridicamente possível. Como disse o ministro Paulo Guedes (da Economia), eles terão que ‘servir primeiro’ para depois conquistar a estabilidade. Outros pensam em usar por um tempo mecanismos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Tudo está nublado na secretaria que trata do assunto. É claro que ninguém do governo vai admitir, mas o quadro é esse. É uma contradição sem fim”, explicou o técnico que preferiu o anonimato.

A falta de coordenação entre as equipes ficou clara, lembrou o técnico, na terça-feira, durante a entrega formal do Plano mais Brasil, que propôs ajustes para conter o crescimento das despesas obrigatórias. “Uma versão menos atualizada foi entregue no Congresso. Por que? Porque cada um vai fazendo de uma maneira. Os ministérios não conversam entre si”, reforçou outro técnico que não quis se identificar. Outra questão é como definir o que é carreira de Estado. O Fórum Nacional das Carreiras Típicas de Estado (Fonacate) aponta “aquelas que exercem atribuições relacionadas à expressão do Poder Estatal, não possuindo, portanto, correspondência no setor privado”.

Como exemplo, o Fonacate cita atividades de “fiscalização agropecuária, tributária e de relação de trabalho, arrecadação, finanças e controle, gestão pública, comércio exterior, segurança pública, diplomacia, advocacia e defensoria públicas, regulação, política monetária, inteligência de Estado, planejamento e orçamento federal, magistratura e o Ministério Público”. Mas há controvérsias, por exemplo, se funcionários do Banco Central, Susep, CVM, entre outros, estão nesse rol. Várias ações correm no Judiciário.

O foco

A reforma administrativa deve tratar, de acordo com especialistas, de quatro pontos: redução de 117 para 20 u 30 carreiras; novo plano de cargos e salários (previsão de queda no salários de acesso para o teto do INSS, de R$ 5,839); extinção da estabilidade, em alguns casos; e o prazo (provavelmente 25 anos) para que o servidor chegue ao final da carreira. “Não é pouca coisa”, disse Rudinei Marques, presidente do Fonacate. A previsão é de que os quatro itens tenham impacto financeiro de R$ 15 bilhões, em 10 anos, contou.

“A Frente Parlamentar em Defesa do Serviço Público esteve na terça-feira com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e ele nos disse que a economia seria de R$ 15 bilhões em 10 anos e que a reforma administrativa já vem sendo discutida”, contou Marques. O ponto mais importante, disse o presidente do Fonacate é a estabilidade, que não é prerrogativa do servidor, é do cargo. “Maia admitiu que o assunto tem que ser muito bem detalhado”, assinalou Marques.

Para o presidente do Fonacate, é preciso que o Parlamento tome consciência que o discurso do governo é “desonesto”, quando fala em cortar gastos com servidor. “Com a reforma da Previdência, em média, quem passou a descontar entre 14% a 22%, teve redução no salário líquido de 5%”, explicou. Para quem recebe mensalmente, por exemplo R$ 15 mil, são R$ 750 a menos. Outro assunto foi a redução de 25% da jornada, com queda proporcional do salário, um dos itens do Plano Mais Brasil apresentado ao Congresso no mesmo dia.

“Se somarmos os 25% aos 5%, já são 30% a menos, ou R$ 4,5 a menos por mês para quem ganha os R$ 15 mil”, disse Marques. Esses 25%, reiterou, são perigosos para o país. Não são apenas menos um-quarto do salário para os servidores. “É como se, dos atuais 600 mil ativos, 150 mil deixassem de atuar. O que o governo não explicou é que a população terá menos pessoas em hospitais, escolas, universidades e creches. A sociedade deveria estar preocupada”, assinalou Marques.

Contratação pela CLT é incompatível com o serviço público, dizem técnicos

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Para reduzir o gasto com servidores, estimado em R$ 336,6 bilhões, em 2020, o governo pretende editar um pacote de medidas, com profunda reforma administrativa, que inclui desde redução de salário de acesso ao serviço público, à extinção da estabilidade para novos funcionários e até uma contratação futura pelo regime da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), a exemplo do que acontece na iniciativa privada. Esse pessoal da CLT poderia, após 10 anos na administração federal, conquistar o direito à estabilidade. Essas, entre outras, seriam saídas estratégicas para o controle das contas públicas, já que cada servidor custa para a União, em média, de R$ 12,5 mil por mês, sendo que os 5% do topo embolsam 12% do total da folha de pagamento e recebem subsídios de R$ 26 mil mensais.

Para os servidores, a cada vazamento de informação sobre a reforma administrativa que há mais de três anos vem assombrando o funcionalismo, a impressão é de que o governo “está fazendo a população de balão de ensaio para sentir a reação e, dependendo do que vier, recuar ou avançar”, disse um técnico que preferiu o anonimado. Osiane Arieira, presidente do Sindicato Nacional dos Servidores Federais da Superintendência de Seguros Privados (SindSusep), garante que é impossível ter servidores, seja qual for o modelo de gestão, contratados pela CLT. “As funções de Estado são incompatíveis com as práticas do setor privado. Creio que o governo precisa se planejar, o que parece que não está acontecendo”, assinalou.

Segundo Osiane, primeiro, é fundamental fazer os cálculos: nos próximos dois anos, de 30% a 40% de todo o efetivo (cerca de 640 mil ativos federais) vão se aposentar. “A reforma da Previdência já ajustou o tempo de serviço e elevou a contribuição para a aposentadoria. Agora, é preciso avaliar exatamente quantos profissionais serão necessários, na próxima década, diante do avanço da tecnologia. Isso é básico”, afirmou. A estabilidade no serviço público é outro item que sequer merece ser tocado. E a redução do salário de acesso ao serviço público, para o valor do teto da aposentadoria do INSS (R$ 5.839,45), é outra artimanha impensada da equipe econômica, na análise da presidente do SindSusep. “Alguns ajustes podem ser feitos, mas não nessa ordem. Talvez de R$ 15 mil iniciais (salários) para R$ 10 mil, uma queda de 30%”, avaliou.

Menos qualificados

Quanto ao projeto de reduzir as férias do pessoal do Judiciário e do Ministério Público de 60 dias para 30 dias, Osiane observou apenas “que não consegue entender a fundamentação que permite duas férias por ano”. Florisvaldo Gonçalves, presidente do Sindicato Nacional dos Funcionários da Comissão de Valores Mobiliários (SindCVM), ressalta que, “mesmo que se faça análise de alguns pontos positivos, a reforma é muito perigosa”. No longo prazo, com todas essas ameaças de redução de salário e falta de segurança no emprego público, a administração federal, perderá a capacidade de atrair os melhores quadros. “Não tenho acesso ao texto do Ministério da Economia, mas é um grande risco, se efetivamente essa contratação pela CLT se tornar a regra, que os mais qualificados desistam do concurso público”, reforçou.

Rudinei Marques, presidente do Fórum Nacional das Carreiras de Estado (Fonacate) lembrou que o governo divulga insistentemente que servidores têm privilégios, ganham muito, são caros é ineficientes, o que está longe da verdade. “É preciso deixar claro que a contratação pela via da CLT, por si só, não garante maior eficiência”, alertou. “Estudos recentes apontam que a produtividade e a inovação estão ligadas a incentivos em um ambiente saudável de trabalho, no qual um dos principais fatores é a segurança (para inovar, propor, criar e, inclusive, discordar do chefe), como ficou claro em pesquisa recente da empresa Google, com suas equipes de sucesso”, apontou. Precarizar as condições de trabalho – com salários baixos e ameaças de demissão -, significa retirar a segurança psicológica necessária para o exercício pleno das capacidades laborais e criativas, finaliza.

O ministério esclareceu que “está preparando uma ampla agenda de transformação do Estado brasileiro, que propõe a criação de um novo serviço público, cujo objetivo primordial é ampliar a oferta de serviços públicos de qualidade aos cidadãos”.

A empresa pode proibir o uso do celular no ambiente de trabalho?

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“Não existe no ordenamento jurídico uma lei específica para tal proibição no dia a dia da empresa. Contudo, os empregadores possuem assegurado, no artigo 444 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), o direito de estipular normas internas que especifiquem o que é conveniente ao ambiente corporativo”

Ruslan Stuchi*

Com a globalização e especialmente a influência do meio eletrônico no ambiente de trabalho, a utilização da telefonia celular surge como uma forma de complementar e respaldar as atividades realizadas no meio corporativo. Entretanto, o uso deste dispositivo móvel deve ser muito ponderado, tendo em vista que ele pode trazer benefícios para empresa diante do seu dinamismo e praticidade, assim como prejuízos diante da utilização incorreta, que resulta em dispersão, no atraso da finalização de atividades e até em acidentes de trabalho.

Dessa forma, o empregador deve se ater em verificar a necessidade da utilização do dispositivo móvel e, principalmente, quando possível, em disponibilizar um aparelho que seja da empresa, evitando assim a utilização em atividades paralelas particulares que não são atreladas aos assuntos da empresa. Nota-se que a razoabilidade e o bom senso devem ser sempre alcançados. Na verdade, a maioria das dúvidas sobre o aparelho particular móvel possui relação com uma pergunta: a empresa pode proibir o uso do celular ou do smartphone no ambiente de trabalho?

Não existe no ordenamento jurídico uma lei específica para tal proibição no dia a dia da empresa. Contudo, os empregadores possuem assegurado, no artigo 444 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), o direito de estipular normas internas que especifiquem o que é conveniente ao ambiente corporativo.

Conforme diz o artigo citado, “as relações contratuais de trabalho podem ser objeto de livre estipulação das partes interessadas em tudo quanto não contravenha às disposições de proteção ao trabalho, aos contratos coletivos que lhes sejam aplicáveis e às decisões das autoridades competentes”.

Traduzindo: o empregador pode, sim, regulamentar ou proibir o uso do celular no horário de trabalho!

A criação de normas internas asseguradas na legislação trabalhista visa a produtividade e também fomenta o bom senso de comportamento profissional, que algumas vezes não se manifesta no ambiente de trabalho por parte dos empregados, criando-se assim a conscientização do uso desde a gestão até a produção.

Uma vez abordado o tema das normas internas da empresa, que podem ser inclusas em cláusula no contrato de trabalho, o empregado que descumprir as regras poderá sofrer advertências, de modo que possa até ser dispensado por justa causa em razão de indisciplina. Caso a empresa imponha como regra que é proibido usar o aparelho móvel particular no ambiente corporativo, deve o empregado respeitar esta norma sob pena de infração.

Ainda para a penalização de justa causa, o empregado deve ter sido anteriormente advertido sobre a infração cometida, de preferência por escrito. A justa causa é a última penalização após outras reiterações e com a devida suspensão. Não pode o empregador de maneira direta, e sem advertência e suspensão, punir o empregado já em um primeiro momento com a pena mais dura. A penalidade deve ser gradativa.

Também é importante esclarecer que apesar do empregador poder restringir o uso do celular, ele não pode proibir o uso no horário de descanso por exemplo, o chamado horário “intrajornada”. O uso é livre no famoso horário de almoço.

O assunto em questão gera polêmica, tendo em vista a crescente demanda de utilização de aparelhos celulares e também de aplicativos sociais de interação, onde certamente o empregado deve ater-se que o ambiente de trabalho deve ser levado com respeito e probidade. É por conta disso que deve ser evitada a utilização do aparelho para fins pessoais. Caso o empregador permita a sua utilização, é fundamental sempre ter em mente a palavra “moderação”.

*Ruslan Stuchi – Especialista em Direito do Trabalho e sócio do escritório Stuchi Advogados

Governo confirma intenção de acabar com unicidade sindical

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No lançamento do Grupo Grupo de Altos Estudos do Trabalho (Gaet), o secretário especial de Trabalho e Previdência do Ministério da Economia, Rogério Marinho, anunciou que o grupo vai tratar da continuação da reforma trabalhista e uma das prioridades é o fim da unicidade sindical

O governo deverá enviar ao Congresso – Marinho não disse quando – mais uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para tratar da reestruturação da unicidade sindical (apenas um sindicato representativo da categoria profissional ou econômica). Também está no radar do grupo a intenção de consolidar do item específico da reforma – que entrou em vigor em 2017 -, que é a retirada da obrigatoriedade do imposto sindical (desconto de um dia de salário dos trabalhadores, uma vez por ano), extinto com a chamada modernização da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

“Queremos acabar com a unicidade sindical, que é uma herança de 70 anos, do período Getúlio Vargas. Esse cartório sindical que se estabeleceu no país distorceu de forma muito grave a relação de quem trabalha e de quem empreende. Nós somos efetivamente uma jabuticaba”. Uma das distorções, afirmou, vem do fato de, até agora, ser o Estado brasileiro quem dá a carta sindical.

“E isso tem sido fonte de corrupção de uma relação promíscua que nós acreditamos que tem que ser banido. Por isso, a necessidade de trabalharmos uma reestruturação. Faremos isso com muita responsabilidade. Se propomos o fim da unicidade sindical, não se pode criar uma terra de ninguém, um vale tudo. Tem que se criar um regramento”.

Marinho falou também da representatividade das entidades sindicais. Nos últimos dois anos, com a consolidação da jurisprudência da reforma trabalhista, grande parte de sindicatos que existiam em função do imposto, ficaram pelo meio do caminho. “Mas os que tenham representatividade, precisam de alguma forma continuar existindo. Para isso nós temos que buscar instrumentos que vão definir de que maneira essas entidades vão sentar numa mesa de negociação e critérios de representatividade”.

Mensalidades

Questionado sobre se o Gaet vai estudar também os parâmetros impostos por uma MP, editada às vésperas do carnaval, que proibia o desconto em folha da contribuição sindical (dos associados que concordam em pagar mensalidade) na folha de pagamento, ele desconversou. “Nós vamos discutir inclusive práticas antissindicais. As normas de estabelecer representatividade por ocasião de acordos e convenções coletivas e eventualmente até a questão do financiamento. Explicitamente não vou adiantar esse ou aquele termo ou detalhe, porque o grupo de trabalho está trabalhando”.

NRs

O terceiro aspecto, disse Marinho, é a modernização da legislação. A cada semana será apresentado estudo para alterar normas regulamentadoras do trabalho. “A reforma trabalhista é um êxito extraordinário”, qualificou. Desde o início da vigência, em 2017, diversos instrumentos legais mostraram a confluência entre trabalho e Previdência e a necessidade de reformular, disse o secretário, incongruências que porventura tenham sido criadas no passado. Como, por exemplo, a importância de alteração de normas, decretos e portarias “anacrônicas, bizarras ou absolutamente sem sentido no mundo moderno”.

Exemplos foram as mudanças das normas regulamentadoras (NRs 12, 15 e 22, que tratam da saúde e segurança do trabalho). “Essas foram as primeiras. Já apuramos com organismos de pesquisas que o impacto positivo de redução de custo é de R$ 68 bilhões, em 10 anos, com apenas três NRs reformuladas. Essa semana ou na próxima serão mais três. Todo mês, a gente vai entregar mais três o u quatro, sem perder de vista a saúde e a segurança do trabalhador. Não queremos o aumento do número de acidente de trabalho. Por outro lado, não queremos que o custo Brasil e a ineficiência sejam uma tônica no nosso país”.

Empregos

Marinho garante que a reforma trabalhista gerou empregos, embora não tenha divulgado quantos. “Não há esse parâmetro de quantos empregos a reforma criou. O que temos é a convicção de que, se não modernizarmos a legislação, corremos o risco de sermos atropelados”. Com base no Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), divulgado mensalmente pela Secretaria do Trabalho, que ele comanda, Marinho argumentou que se for considerado o número de empregos formais líquidos (diferença entre contratações e demissões), “foram gerados no Brasil quase 15 milhões de postos de trabalho”.

“Há uma rotatividade na nossa de obra. Mas nos últimos dois anos, o Caged sempre foi positivo”, reforçou Marinho. “Então, esse negócio de que a reforma gerou mais desemprego não é verdade. Só esse ano, já tem mais de 400 mil empregos positivos. O nível de emprego no Brasil não tem se alterado nos últimos 10 anos. Nós temos hoje mais de 100 milhões de pessoas na força de trabalho. Isso não é diferente dos últimos cinco ou seis anos”.

Marinho também justificou que a reforma por si só para reverter a situação de desemprego no país. “Nós precisamos reativar a economia brasileira e fazer o ajuste fiscal”. O Estado tem que reduzir os gastos. “No Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA), enviado ao Congresso, o governo provou que 93% das despesas são obrigatórias. Assim não é possível crescer”, reforçou Rogério Marinho.

Anamatra – MP da Liberdade Econômica revoga dispositivos sobre repouso remunerado e cria insegurança jurídica

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Presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) aponta que o texto também pode estimular fraudes e prejudicar pagamento de créditos trabalhistas

Na contramão do que prevê a Constituição Federal, o texto aprovado alterou a Lei nº 605/1949, sobre o repouso semanal remunerado, retirando dispositivos que determinavam a vedação do trabalho em dias de feriados civis e religiosos e o respectivo pagamento em dobro. Com a supressão, de acordo com a Anamatra, haverá dúvida e discussão sobre se o pagamento em dobro só será devido nas atividades em que não for possível, em virtude das exigências técnicas das empresas, a suspensão do trabalho, salvo se o empregador determinar outro dia de folga.

A Lei 10.101/2000, que fala da participação dos trabalhadores nos lucros ou resultados da empresa, também foi alterada com a aprovação do projeto de lei de conversão. O texto suprimiu as previsões da lei que determinavam que o repouso remunerado deveria coincidir, pelo menos uma vez no período máximo de três semanas, com o domingo e a que preconizava que o trabalho em feriados nas atividades de comércio deveria ser autorizado em convenção coletiva de trabalho.

Também foram suprimidos da CLT artigos que determinavam – para os trabalhadores de empresas que explorem serviços de telefonia, telegrafia submarina ou subfluvial, de radiotelegrafia ou de radiotelefonia – que o trabalho aos domingos e feriados seria considerado extraordinário e sua execução e remuneração obedeceria acordo ou contrato coletivo de trabalho e que as horas extras, nos demais dias, deveriam ser pagas com acréscimo de 50%.

Fraudes

Outras mudanças também afetam direitos e garantias fundamentais contidos na Constituição, avalia a presidente da Anamatra, entre elas o “ponto por exceção”, que prevê que o horário de chegada e saída do empregado só será registrado se houver horas extras, atrasos, faltas e licenças. O registro de entrada e saída, por sua vez, somente será exigido de empresas com mais de 20 funcionários. “As medidas podem prejudicar a fiscalização e a contagem de horas extras, bem como a produção de provas, caso o trabalhador acione a Justiça do Trabalho, estimulando fraudes”, analisa a juíza Noemia Porto, presidente da Anamatra.

Na avaliação da presidente da Anamatra, essa “invisibilidade do descontrole”, afeta a possibilidade da fiscalização do trabalho no Brasil e poderá potencializar, inclusive, conflitos sociais e ações judiciárias. “É um paradoxo criticar o número de ações judiciais no Brasil, mas, ao mesmo tempo, prejudicar a fiscalização. Se existe preocupação com o aumento das ações judiciais, ela deve ser proporcional ao incremento e ao fortalecimento da etapa anterior à judicialização, que é justamente a da eficiente fiscalização’’, aponta.

Mudanças feitas pelo texto aprovado ao Código Civil também podem afetar os direitos trabalhistas, explica a presidente da Anamatra. Isso porque o incidente de desconsideração da personalidade jurídica só poderá ocorrer em caso de abuso. “A mudança corrobora o cenário de inadimplemento do pagamento dos créditos trabalhistas, distanciando o trabalhador do recebimento de direitos sistematicamente violados. Subverte-se, portanto, o equilíbrio protetivo que a Constituição Federal exige, sacrificando direitos de caráter alimentar em detrimento de preocupações meramente econômicas”, alerta Noemia Porto.

Histórico

O Senado Federal aprovou, na noite da última quarta (21/8), o projeto de lei (PLV 21/2019), decorrente da Medida Provisória 881/2019, conhecida como MP da Liberdade Econômica. O texto fez mudanças no Código Civil, em regras dos fundos de investimento e na legislação trabalhista. De acordo com o governo, o objetivo foi a desburocratização e a simplificação de processos para empresas e empreendedores. A proposta seguiu para sanção do presidente da República, Jair Bolsonaro.

A aprovação no Senado ocorreu após votação para suprimir da proposta artigos que acabavam com a restrição do trabalho aos domingos e feriados. A supressão foi um avanço. Contudo, o texto final, divulgado na noite de sexta, também revogou dispositivos das Leis nº 605/1949 e 10.101/2000 e da própria CLT, que tratavam do tema, indo de encontro ao que prevê a Constituição Federal, explica a presidente da Anamatra, juíza Noemia Porto.

“As mudanças criam um ambiente de insegurança jurídica. Isso porque, caso os dispositivos não sejam vetados pelo presidente da República, porque inconstitucionais, haverá a situação inédita de o Senado ter aprovado um coisa e o texto final, com a lista de revogações, significar outra”, explica. A Constituição Federal prevê como direitos dos trabalhadores urbanos e rurais o repouso semanal remunerado, preferencialmente aos domingos, a remuneração do serviço extraordinário superior, no mínimo, em 50% à do normal e o reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho.

 Mudanças positivas

Algumas previsões do texto que preocupavam a Anamatra, e foram objeto da atuação da entidade, foram suprimidas do texto, ainda no Plenário da Câmara dos Deputados como a modalidade de contrato de trabalho subordinado não sujeito à legislação trabalhista; a extinção da obrigatoriedade das Comissões Internas de Prevenção de Acidentes (Cipas) para “locais de obra” ou estabelecimentos com menos de 20 trabalhadores e para as micro e pequenas empresas; a ampliação da possibilidade da duração de contratos de trabalho por prazo determinado; a dispensa do encaminhamento da Guia da Previdência Social ao sindicato representativo da categoria profissional; entre outras.

Atuação

A Anamatra, desde o início da tramitação do projeto de lei de conversão, atuou no sentido de alertar os parlamentares para diversas mudanças preocupantes na legislação trabalhista, bem como para o necessário debate sobre o tema. Nesse sentido, a associação reuniu-se com diversos parlamentares, emitiu nota técnica conjunta com outras entidades (clique aqui e confira) e participou de audiências públicas e eventos sobre o tema.

“Declaração de Direitos de Liberdade Econômica” pode afetar direitos trabalhistas

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“A MP, ao invés de abraçar conceitos de justiça social, garantindo a proteção das partes vulneráveis nas relações econômicas e laborais, trata de afastar a atuação estatal, não apenas no que tange à fiscalização da atividade econômica, mas também à resolução de litígios, prevendo mecanismos para impedir “abusos regulatórios” e o questionamento “abusivo” de normas contratuais pelas partes”

Cíntia Fernandes*, Pedro Mahin** e Verônica Quihillaborda Irazabal Amaral***

No último dia 11 de julho, a Comissão Mista do Congresso Nacional responsável pela análise da Medida Provisória nº 881/2019, que institui a “Declaração de Direitos de Liberdade Econômica”, aprovou o parecer do Deputado Jerônimo Goergen (PP/RS) sobre a matéria. Este concluiu pelo atendimento aos pressupostos constitucionais de relevância e de urgência da Medida Provisória, bem como pela sua constitucionalidade, juridicidade e boa técnica legislativa. Com a aprovação do parecer, a MP foi enviada à Câmara dos Deputados, como Projeto de Lei de Conversão nº 17/2019.

Apesar da aprovação do relatório, a MP nº 881/2019, que altera onze leis existentes – entre elas a CLT, o Código de Defesa do Consumidor e o Código Civil –, suscita preocupação e importa questionamentos.

Primeiramente, deve-se pontuar que alterações tão amplas e profundas como as propostas pela MP nº 881, que incluem uma minirreforma trabalhista, demandariam um debate mais detido com a sociedade. Assistiu-se até aqui, porém, a um processo legislativo deformado, açodado e carente de maior participação popular.

Por outro lado, surgem objeções jurídicas consideráveis à noção de que o princípio da liberdade econômica não admitiria qualquer tipo de ponderação com os demais princípios da ordem econômica previstos na Constituição brasileira. Ocorre que a ordem econômica brasileira, tal como prevista em nossa Constituição, é norteada não apenas pelo livre exercício da atividade econômica, mas também por outros princípios estruturantes, dentre os quais a valorização do trabalho humano, a justiça social, a função social da propriedade, a defesa do consumidor e do meio ambiente, e a busca pela redução das desigualdades regionais.

A MP, ao invés de abraçar conceitos de justiça social, garantindo a proteção das partes vulneráveis nas relações econômicas e laborais, trata de afastar a atuação estatal, não apenas no que tange à fiscalização da atividade econômica, mas também à resolução de litígios, prevendo mecanismos para impedir “abusos regulatórios” e o questionamento “abusivo” de normas contratuais pelas partes.

O crescimento econômico potencialmente impulsionado por tais medidas deve ser visto com ressalvas, pois, se confirmado, tende a ser concentrado nas elites econômicas detentoras dos meios de produção. Essas medidas esvaziam ainda mais o conteúdo protetivo das normas trabalhistas, desconsideram que o emprego constitui um dos principais instrumentos de distribuição de renda e podem redundar no agravamento da concentração de renda no Brasil.

Neste sentido, a MP nº 881 propõe mais de 30 alterações na legislação trabalhista, dentre as quais se destacam a liberalização do trabalho aos domingos e feriados, o fim da obrigatoriedade das Comissões Internas de Prevenção de Acidentes (CIPA) em determinadas hipóteses e a autorização de funcionamento de estabelecimento empresarial sem a necessidade de inspeção prévia em relação às regras de saúde e segurança do trabalho.

Quanto à liberalização do trabalho aos domingos e feriados, a Constituição brasileira estabelece que todo trabalhador, urbano ou rural, tem direito a um repouso semanal remunerado, que deverá se dar, preferencialmente, aos domingos. Segundo o texto atual da CLT, esse descanso deverá ser de 24 horas consecutivas e coincidir com o domingo, salvo nas hipóteses de conveniência pública ou necessidade imperiosa do serviço. Ou seja, a regra atual prevê que o descanso semanal será usufruído em dias alternativos aos domingos apenas em hipóteses excepcionais.

A MP subverte essa regra, tornando exceção o gozo do descanso semanal remunerado aos domingos. Segundo a Medida Provisória, o repouso semanal deverá coincidir com o domingo apenas uma vez a cada quatro semanas. Além disso, a MP permite ao empregador decidir, unilateralmente, se o empregado gozará do descanso semanal no domingo, feriado ou dia alternativo, ou se receberá a remuneração em dobro pelo dia de descanso não usufruído.

A preferência da Constituição pelo repouso semanal aos domingos decorre da premissa de que todos os trabalhadores gozarão de um dia comum de descanso. Isso permite a melhoria da condição social dos trabalhadores, com o exercício conjunto do direito social ao lazer, com a ampliação e a intensificação do convívio familiar e comunitário, bem como com a construção de laços de sociabilidade dentro e fora do ambiente de trabalho.

Por outro lado, caso o empregador opte por não conceder os repousos semanais, ainda que com o pagamento da remuneração dobrada dos dias de descanso não usufruídos, isso poderá gerar prejuízos à saúde, à segurança no trabalho e à própria produtividade dos empregados afetados. O repouso é essencial para a recomposição da saúde física e mental do trabalhador.

O fim da obrigatoriedade das Comissões Internas de Prevenção de Acidentes (CIPA) em empresas com menos de 20 empregados e em micro e pequenas empresas, independentemente da quantidade de empregados e da atividade econômica desenvolvida, também pode contribuir para o aumento da incidência de acidentes de trabalho e de adoecimentos ocupacionais.

Hoje, a CLT estabelece a obrigatoriedade de constituição de CIPA para empregadores que admitam trabalhadores como empregados, observada a tabela de dimensionamento anexa à Norma Regulamentadora nº 5 (NR-5), que regulamenta a constituição, o funcionamento e as atribuições das CIPAs. De acordo com essa tabela, as empresas com mais de 19 empregados são obrigadas a constituírem uma CIPA. Na hipótese de o quadro de pessoal ser inferior a 20 empregados, apesar de as empresas serem dispensadas de instalar a CIPA, elas são obrigadas a designar um responsável pela fiscalização do cumprimento daqueles que seriam os objetivos de uma eventual CIPA (“prevenção de acidentes e doenças decorrentes do trabalho”). Em síntese: atualmente, nenhuma empresa está dispensada do cumprimento desses objetivos.

Nesse sentido, o fim da obrigatoriedade das Comissões Internas de Prevenção de Acidentes (CIPA) em empresas com menos de 20 empregados e em micro e pequenas empresas contraria as diretrizes constitucionais de promoção da segurança e da saúde no trabalho. Potencialmente, sobretudo se considerarmos que as micro e pequenas empresas são as maiores geradoras de empregos no Brasil, essa liberalização pode implicar o aumento no número de mortes, acidentes e doenças relacionadas ao trabalho no País, que já ocupa posição de destaque negativo no mundo quanto a esse quesito.

Soma-se a esse quadro a proposta de revogação do artigo 160 da CLT, que condiciona o início das atividades de uma empresa a uma prévia inspeção e aprovação das respectivas instalações por autoridade regional competente em matéria de segurança e medicina do trabalho. Essa revogação seria motivada pela suposta necessidade de simplificar e desburocratizar a legislação trabalhista, para alavancar o desenvolvimento do País.

O requisito de inspeção prévia para liberação do funcionamento de novas empresas tem como principal finalidade a garantia de que o estabelecimento iniciará suas atividades livre de riscos de acidente ou doença decorrentes do trabalho. A retirada desse requisito do ordenamento jurídico sujeitará empregados a ambientes de trabalho com instalações potencialmente irregulares e prejudiciais à saúde e à segurança, contribuindo para a ocorrência de acidentes e adoecimentos de origem ocupacional.

Percebe-se que a liberdade econômica, tal como proposta na MP nº 881/2019, pode resultar na intensificação da exploração dos que vivem do trabalho, com a eliminação de fatores importantes de controle social sobre a atividade econômica e, consequentemente, o abandono daqueles que são os objetivos fundamentais da República brasileira: a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, a garantia do desenvolvimento nacional, a erradicação da pobreza e da marginalização, a redução das desigualdades sociais e regionais, e a promoção do bem de todos.

*Cíntia Fernandes – advogada, subcoordenadora de Direito Privado da Unidade Brasília e sócia do escritório Mauro Menezes & Advogados

* Pedro Mahin – especialista em Direito do Trabalho e sócio do escritório Mauro Menezes & Advogados

***Verônica Quihillaborda Irazabal Amaral – especialista em Direito do Trabalho e advogada de Processos Especiais do escritório Mauro Menezes & Advogados

O projeto de liberação do FGTS para o consumo tem eficácia limitada e contém risco social

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“Não podemos afirmar se os valores do fundo são suficientes para alcançar o objetivo, mas não é recomendável que um seguro social seja utilizado para tal, uma vez que a ideia tem o condão de desguarnecer futuramente o empregado em caso de desemprego, habitação, doenças e calamidades”

Cássio Faeddo*

O art. 7º, III, da Constituição trouxe o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço como sistema para a proteção do trabalhador em caso de dispensa sem justa causa.

Soma-se ao fundo a existência do seguro desemprego para imprevistos nas relações de trabalho que conduzam ao desemprego.

Por muito tempo, inclusive em contemporaneidade ao FGTS, o art. 478 da CLT contemplava a estabilidade decenal, inclusive ocorrendo a possibilidade de opção ou não ao regime fundiário. Ou seja, caso o empregado atingisse dez anos de contrato de trabalho conseguiria a estabilidade no emprego. Algo impensável para nossos dias.

O recolhimento mensal soma reserva de 96% do salário por ano. É recomendável que o empregador reserve, mais 3,2% sobre o salário em conta a parte, como cautela para eventual dispensa do empregado. Por essas características o FGTS é também uma poupança compulsória em favor do empregado regulado pela Lei nº8.036/90.

Há uma série de possibilidades para o saque do FGTS previstas na Lei nº 8.036/90: demissão sem justa causa, aposentadoria, casos de inundações que atinjam a residência do trabalhador, empregado portador do HIV, neoplasia maligna, conta sem depósito por 3 anos ininterruptos para os contratos rescindidos até 13/7/1990 e, para os demais, a permanência do trabalhador por igual período fora do regime do FGTS, dentre outros casos. São claramente necessidades primárias de subsistência.

A remuneração do FGTS é irrisória sendo de 3% ao ano mais a variação da TR. Por ser um “dinheiro barato” o FGTS passou a ser utilizado para uma série de investimentos, desde a habitação até recentemente o previsto pela lei 13.778/18 que permite a utilização dos recursos do FGTS para aplicação de operações de crédito destinadas a entidades hospitalares filantrópicas bem como a instituições que cuidam de pessoas com deficiência e, sem fins lucrativos, participem de forma complementar do Sistema Único de Saúde – SUS.

Ou seja, os recursos do FGTS são utilizados conforme convier ao governo, e a última ideia é a utilização dos recursos para alavancar a economia.

Não podemos afirmar se os valores do fundo são suficientes para alcançar o objetivo, mas não é recomendável que um seguro social seja utilizado para tal, uma vez que a ideia tem o condão de desguarnecer futuramente o empregado em caso de desemprego, habitação, doenças e calamidades.

Finos ajustes, como a compra de um segundo imóvel urbano, que poderia ser utilizado para a família ou para locação, aplicação em fundos para novos projetos imobiliários, podem ser mais eficazes para o desenvolvimento econômico do que mera liberação para consumo.

*Cássio Faeddo– Advogado. Mestre em Direitos Fundamentais, MBA em Relações Internacionais – FGV

MP da liberdade econômica: associações de servidores requerem adiamento da votação

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Servidores destacam que o relatório da MP da liberdade econômica representa uma “minirreforma trabalhista”. Anamatra, ANPT, Abrat e Sinait encaminham ofício ao presidente da Comissão Mista e se reúnem com parlamentares. Votação da matéria está prevista para essa quinta (11/07)

A Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), juntamente com a Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT), o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait) e a Associação Brasileira dos Advogados Trabalhistas (Abrat), encaminharam ofício ao senador Dário Berger (MDB-SC), requerendo o adiamento da votação do projeto de lei de conversão da MP 881/19, conhecida como MP da Liberdade Econômica. A votação está prevista para acontecer na manhã desta quinta (11/7), na Comissão Mista presidida pelo parlamentar. Dirigentes da Anamatra também se reúnem, nesta quarta, com parlamentares para tratar do tema.

No requerimento, as associações explicam que o texto original da MP, que estabelece normas de proteção à livre iniciativa e ao livre exercício de atividade econômica, foi alterado substancialmente pelo relator na Comissão Especial, com efeitos graves no mundo do trabalho e que ameaçam a segurança jurídica do país. Segundo as entidades, o projeto de lei de conversão, nos moldes propostos, padece de inconstitucionalidade, se for considerada a ADI já julgada no STF (5127), que declarou inconstitucional emenda parlamentar em projeto de conversão de MP em lei, por conteúdo temático distinto daquele originário, situação avaliada no presente caso.

“Trata-se de uma minirreforma trabalhista, propondo alterações normativas preocupantes e de grande impacto social, o que denota a importância de se aprofundar o debate sobre o tema, inclusive com a abertura de apresentação de propostas pela própria sociedade”, defende a presidente da Anamatra, juíza Noemia Garcia Porto.

Principais pontos

Entre as mudanças destacadas pelas associações está a previsão de regimes especiais de contratação, suspendendo leis, atos normativos infralegais, acordos e convenções coletivas, que vedam o trabalho aos finais de semana, incluindo sábados, domingos e feriados. Também ficam suspensos diversos artigos da CLT que estabelecem jornadas especiais de trabalho, por exemplo, para bancários, jornalistas profissionais, entre outros, inclusive com restrições à remuneração diferenciada de horas extras.

A MP amplia, ainda, a possibilidade da duração de contratos de trabalho por prazo determinado, atualmente, de acordo com a CLT, restritos a, no máximo, dois anos. Também está entre as preocupações das associações a possibilidade aberta pela MP de se firmar contratos de trabalho regidos pelas regras do Direito Civil, sendo as de Direito do Trabalho, dispostas em lei, consideradas todas subsidiárias.

Questões relativas às normas de segurança e medicina do trabalho também são afetadas pela MP 881 na redação dada pelo relatório da Comissão Mista. Isso porque torna-se facultativa a constituição de Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA). “Em um país que registra, de acordo com estatísticas oficiais, uma morte por acidente em serviço a cada três horas e 40 minutos, é inaceitável. Não se trata de uma questão econômica, mas sim de saúde pública”, aponta a presidente da Anamatra. De acordo com estatísticas do Observatório Digital do MPT/OIT, com dados oficiais da Previdência Social, entre 2012 e 2018, foram registrados no Brasil 16.455 acidentes fatais e 351.796.758 dias de trabalho perdidos por afastamento. O gasto nesse período, incluindo benefícios iniciados em anos anteriores, supera R$ 79 bilhões.

A fiscalização do cumprimento da legislação trabalhista e previdenciária também é afetada pelo texto proposto. Pelo relatório da MP, as empresas ficam dispensadas de encaminharem cópia da Guia da Previdência Social ao sindicato representativo da categoria profissional mais numerosa entre seus empregados.

Segundo as associações, as propostas apresentadas afrontam a Constituição Federal, normas internacionais do trabalho, a dignidade da pessoa humana e o valor social do trabalho. “As regras constitucionais estão absolutamente atreladas à dignidade da pessoa humana e qualquer alteração que vise a livre iniciativa deve se dar por causa da garantia dessa dignidade e não da garantia tão e somente da ordem econômica como vem estampado no texto, que elimina regras de segurança e saúde no trabalho”, alertam.