MPF move ação de improbidade contra magistrado por decisões judiciais indevidas

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Washington Juarez praticou, deliberadamente e de má-fé, atos violadores a normas legais ao beneficiar empresa Caribean Distribuidora em mandado de segurança, destaca MPF/RJ

O Ministério Público Federal (MPF) entrou com ação civil pública contra o juiz Federal Washington Juarez de Brito Filho e mais cinco pessoas – Devamnir Ragazzi Filho, Cássio Eduardo Ragazzi, Jaime Fridman, Rita Vera Martins Fridman e Maria do Socorro Suky Oliveira Contrucci – por ato de improbidade administrativa. Em 2003, os réus estiveram envolvidos na prolação (ato ou efeito de articular ou pronunciar), por parte do magistrado, em decisões judiciais indevidas no Mandado de Segurança n° 2003.5101025645-2. (ACP n° 5081622-80.2019.4.02.5101), informa o MPF.

“O juiz Washington Brito Filho declarou falsamente, no papel de juiz distribuidor, a conexão entre o Mandado de Segurança nº 2003.51.01.025645-2 e a ação ordinária nº 2001.51.01.023168- 9; deferiu liminar de amplitude excessivamente superior ao objeto do pedido; e desprezou os graves vícios de representação processual e indícios de uso fraudulento de pessoa jurídica para lesar o Fisco”, detalha o Ministério Público.

O magistrado proferiu, no mandado de segurança, decisões beneficiando, de forma indevida, a empresa Caribean Distribuidora de Combustíveis e Derivados do Petróleo. Por isso, também são réus na ação os advogados da empresa: Jaime, Rita e Maria do Socorro; e os administradores da empresa, Devamnir e Cássio, protagonistas de diversas fraudes envolvendo alterações do contrato social e outorgas de instrumentos procuratórios. Eles, mesmo não sendo agentes públicos, induziram e concorreram para a prática do ato de improbidade ou que se beneficiaram dele de forma direta ou indireta.

Diante disso, o MPF requer, dentro outros pedidos, que seja condenado Washington pela prática de ato de improbidade administrativa previsto nos art. 11, caput e incisos I e II da Lei nº 8.492/92, com a aplicação das sanções previstas no art. 12, III, da Lei nº 8.429/92. Além disso, que sejam também condenados os réus Devamnir, Cássio, Jaime, Rita e Maria do Socorro pela prática de ato de improbidade administrativa previsto nos art. 11, caput e incisos I e II da Lei nº 8.492/92, na condição de terceiros, conforme art. 3º da Lei 8.429/92, com a aplicação das sanções previstas no art. 12, III, da Lei nº 8.429/92, no que couber.

Entenda o caso

A sociedade Caribean, nos autos do Mandado de Segurança nº 2003.5101025645-2, pleiteava que a Receita Federal se abstivesse de exigir os créditos tributários vencidos e vincendos relativos à Cide, PIS e Cofins até a plena compensação dos indébitos tributários decorrentes da alegada inconstitucionalidade dos valores cobrados a título de Parcela de Preço Específica (PPE), uma vez que, conforme alegou em sua petição inicial, a somatória da Cide, PIS e Cofins veio a suceder justamente a Parcela de Preço Específica (PPE).

Assim, no dia 10 de novembro de 2003, a empresa impetrou o mandado de segurança contra o delegado da Receita Federal de Administração Tributária do Rio de Janeiro, com pedido liminar de abstenção da cobrança da PPE. A empresa também pleiteou a distribuição por dependência à ação ordinária nº 2001.51.01.023168-9, proposta inicialmente por Auto Posto Tubarão, a fim de questionar PIS/Cofins incidentes sobre combustíveis.

Um dia depois, em 11 de novembro de 2003, o juiz Washington determinou a distribuição por dependência ao Juízo em que estava lotado à época. “Em outras palavras: reconhecendo uma conexão obviamente inexistente, ele conseguiu distribuir o Mandando de Segurança para si mesmo. Não só a conexão grosseiramente apontada nunca existiu, como já sabia disso. Ocorre que o réu conscientemente ignorou o fato de que as referidas ações, que versavam sobre matérias relativas a impostos que incidiam sobre a comercialização de combustíveis e derivados de petróleo, não possuíam identidade apta a ensejar a distribuição acolhida, tampouco a conexão reconhecida, pela singela razão de que ambas veiculavam pedidos totalmente distintos”, aponta o procurador da República, Rodrigo da Costa Lines, autor da ACP.

Mas a conduta ímproba do então magistrado não se encerra neste ponto. Outros desvios a ele se seguiram que denotam a prática dolosa de ato de improbidade. Passados poucos dias, em 24 de novembro, foi deferida liminar para o mandado de segurança.

Na liminar, o juiz determinou que a Receita deixasse de exigir da empresa os créditos tributários vencidos e vincendos da contribuição de intervenção ao domínio econômico prevista na Lei nº 10.336/01, e das contribuições ao PIS E COFINS até plena compensação com os indébitos tributários, corrigidos monetariamente e com os acréscimos moratórios calculados nos mesmos moldes que a Secretaria da Receita Federal procede ao ressarcimento à restituição na esfera administrativa, computados desde a data dos respectivos pagamentos indevidos, indébitos esses decorrentes da inconstitucionalidade dos valores cobrados a título de PPE (parcela de Preço Específica).

“Tais fatos só expõem como o Washington atuou dolosamente, pois mesmo diante da petição juntada pela União e da decisão no referido agravo de instrumento, preferiu atropelar a lei e a jurisprudência e conceder a liminar demasiadamente ampla”, destaca o procurador.

Deste modo, o juiz deu, na verdade, “uma carta branca à empresa para deixar de pagar outros tributos que sequer são da mesma alegada espécie de cobrança da PPE, em uma verdadeira permissão geral para não pagar exações”. Vale ressaltar que levou menos de 15 dias para a obtenção da liminar e menos de 8 meses para que o juiz confirmasse a tutela antecipada e proferisse a sentença favorável à empresa no caso.

Além disso, na ação de improbidade, o MPF apontou ainda que o magistrado desprezou solenemente, mesmo após firmes advertências da União e do Tribunal quando do julgamento do Agravo de Instrumento nº 2003.02.01.018050-0, os graves vícios de representação processual e indícios de uso fraudulento de pessoa jurídica para lesar o Fisco. Na ação, o MPF apontou diversos elementos de fraude no contrato social e no instrumento de procuração, todos ignorados por Washington.

“É possível observar que, muito embora a petição inicial tenha sido protocolada ao dia 10 de novembro de 2003, quando constava como único sócio quotista Paulo Roberto Rego (que inclusive assinou o instrumento procuratório em nome da dra. Leonilda Cassiano), no dia 28 de novembro de 2003 a Caribean informou à 18ª Vara Federal a retirada de Paulo Roberto Rego da sociedade, cedendo completamente suas quotas a outros, a quem coubera a administração da sociedade. No entanto, a alteração contratual está registrada na JUCESP no dia 22 de setembro de 2003, ou seja, dias antes da outorga do instrumento procuratório da inicial, datado do dia 25 de setembro de 2003, inclusive com reconhecimento de firma de Paulo Roberto Rego neste mesmo dia. Portanto, foi utilizado instrumento procuratório em data que tal pessoa já não era mais representante legal da sociedade”, detalha a ACP.

Em depoimento prestado no dia 21 de outubro de 2019 ao Ministério Público Federal, o próprio Paulo Roberto Rego declarou que nunca assinou qualquer documento como representante legal da Caribean, pois sequer tinha conhecimento que figurava no quadro societário da empresa, e portanto não era sócio da mesma. Nesse sentido, afirmou que à época era, na verdade, advogado de um escritório que prestava serviços à empresa entre os anos 2001 a 2003 aproximadamente, e identificou como verdadeiros proprietários e administradores da empresa os demandados os réus Devamnir e Cássio Eduardo.

“É explícito, portanto, o agir ímprobo do juiz: como se não bastasse o intento deliberado de forçar sua competência para julgar o Mandado de Segurança mediante burla à distribuição, deferindo após uma liminar demasiadamente ampla, resolveu atropelar as advertências sobre os graves elementos denotadores de fraude societária, fiscal e judiciária perpetrada pelos administradores de fato e de direito da Caribean e as confrontações levadas diante da violação das normas vigentes que regulavam a matéria sob a qual decidiu”, narra o MPF.

Processo Administrativo Disciplinar – PAD – Através Ofício MPF/PRR/RJ/RF nº 12, de 23/06/05, o Ministério Público Federal solicitou que fosse realizada a autuação de processo administrativo em face do então magistrado, pedido acatado pelo TRF-2ª Região. No dia 17/04/08, o Tribunal determinou a instauração do Processo Administrativo Disciplinar (PAD) contra Washington. No mesmo pleno também decidiram os membros do TRF-2, por maioria, pelo afastamento do magistrado e, em 06/09/2018, o relator manifestou-se pela procedência da acusação para decretar pena de aposentaria compulsória. Atualmente, por pedido de vista, o julgamento do PAD encontra-se suspenso (PAD n° 2005.02.01.006478-8).