Militares se unem para ficar fora da reforma

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Em informe divulgado na terça-feira, integrantes das Forças Armadas reforçam a necessidade de esclarecer à sociedade diferenças da categoria. Presidente da ANMB diz que, caso regras sejam igualadas, associação lutará para estender direitos de civis, como FGTS, a todos

ALESSANDRA AZEVEDO

LEONARDO CAVALCANTI

HAMILTON FERRARI*

Intocados pela proposta de reforma na Previdência divulgada em dezembro pelo presidente Michel Temer, os militares começam a se preocupar com a possibilidade de se submeter a algumas das regras que começarão a ser votadas pelo Congresso Nacional este mês. Entre elas, a idade mínima de 65 anos para aposentadoria e benefício máximo de R$ 5.578. Em informe divulgado na última terça-feira, os militares, que costumam ser discretos quando o assunto é Previdência, deixaram clara a necessidade de discutir essa diferenciação com a sociedade.

“Nossa maior preocupação é inserir a discussão na sociedade sobre a importância das Forças Armadas e como funciona o sistema”, explicou o general Otávio Santana do Rêgo Barros, chefe do Centro de Comunicação Social do Exército. Segundo o informe, assinado por ele, o ministro da Defesa, Raul Jungmann, e as Forças Armadas montaram grupos de trabalho com o objetivo de defender a necessidade de haver um regime separado do dos civis. A ideia é usar estudos técnicos sobre o assunto para esclarecer as peculiaridades da atividade, “inclusive com a interlocução com vários órgãos públicos”, disse Rêgo Barros.

Para ilustrar essa relação, ele citou a conclusão de um estudo recente da Fundação Getulio Vargas (FGV), que considera “a inclusão das Forças Armadas na PEC da reforma da Previdência seria um grave erro”. Opinião compartilhada pelo coronel Elizeo Ferraz Forquim, presidente da Associação de Defesa dos Direitos dos Policiais Militares Ativos, Inativos e Pensionista (AMAI), que define a ideia como “uma grande injustiça”. “Essa decisão não deve ser baseada apenas em números, precisa ser também capaz de fazer justiça aos militares. O governo não pode impor as mesmas condições que os trabalhadores civis. As Forças Armadas não vão permitir que isso aconteça”, declarou Forquim.

Entre as justificativas para a necessidade de regras próprias, o coronel lembrou que os policiais militares trabalham, no mínimo, 60 horas semanais, alcançando 80 em alguns casos. Além das condições de trabalho serem diferentes, os direitos garantidos a eles não são os mesmos propostos aos civis. “O militar recebe salário médio muito menor que outras profissões, dedica-se exclusivamente à carreira e não possui os direitos assegurados a qualquer trabalhador, como, por exemplo, direito de greve, remuneração por horas extras, FGTS etc”, listou Rêgo Barros. “Soluções simplistas, genéricas ou que contenham apenas o viés contabilista não podem ser aplicadas à atividade militar”, defendeu.

Incluir a categoria nas regras gerais causaria, segundo os militares, “irreversíveis danos aos alicerces que fundamentam o comportamento e o estado de permanente prontidão das Forças Armadas”. Além disso, o presidente da Associação Nacional dos Militares do Brasil (ANMB), Marcelo Machado, ressaltou que a medida não faria diferença no deficit da Previdência. “O rombo vai continuar, porque não são os militares que causam, mas os que não contribuem e recebem o benefício, como, por exemplo, pessoas da aposentadoria rural”, disse.

Só faria sentido incluir a classe nas mesmas regras se os direitos também fossem equiparados, afirmou Machado. “Se tiver benefícios como FGTS, auxílio periculosidade, hora extra, certamente nenhum militar se importaria com a equiparação”, disse. “Se o governo insistir em nos colocar nas mesmas regras, vamos brigar para ter os mesmos direitos dos trabalhadores civis através das nossas associações”, anunciou o presidente da ANMP.

Oficial

Incluir os militares na reforma não foi o combinado com o governo federal, que reforçou várias vezes, desde que propôs a reforma, que elaborará uma lei específica para lidar com o problema previdenciário da carreira militar. Afinal, as Forças Armadas são responsáveis por 44% do deficit dos servidores da União, embora sejam apenas um terço dos funcionários públicos federais — fatia que correspondeu a R$ 34 bilhões em 2016. O problema é que os policiais federais e civis também demandam tratamento diferenciado. Alegando também ter peculiaridades na carreira, a União dos Policiais do Brasil (UPB), que inclui várias entidades de classe dos profissionais de segurança pública do Brasil, já se organizam para manifestações nacionais a partir da semana que vem.

Ao Correio, o ministério da Defesa negou que esteja sendo discutida a possibilidade de incluir as Forças Armadas na Proposta de Emenda à Constituição nº 287/2016, que trata da reforma da Previdência. O informe que trata do assunto teria sido apenas “mais um” para reiterar que os militares não se encaixam nas mesmas regras. Os militares garantem que o governo está alinhado a eles nessa questão. “O governo federal comprometeu-se com as Forças Armadas, afiançando reconhecer as peculiaridades da carreira militar e tratando-a de maneira diferenciada”, disse Rêgo Barros, no informe. Apesar de defenderem a manutenção do regime específico de Previdência, os militares não negam a necessidade de mudanças — para o general, o melhor termo é “reorganização”. “Nós entendemos que é preciso uma reforma de caráter geral nas Forças Armadas”, disse.

A gestão do sistema de proteção social, no entanto, foi definida como objetivo principal de 2017 pelas Forças Armadas, que pretendem alocar “todos os recursos para a solução deste assunto, tao caro aos militares”, reforçou o comunicado da última terça-feira.