A inconstitucionalidade e a precarização da minirreforma trabalhista proposta por Temer

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Gustavo Ramos*

As medidas que Michel Temer pretende encaminhar, via projeto de lei, ao Congresso Nacional, intituladas de “minirreforma trabalhista” derivam da premissa – absolutamente equivocada – de que rebaixar as condições de trabalho e suprimir direitos mínimos previstos na legislação trabalhista seriam a solução para a geração de mais empregos e para o crescimento da economia brasileira. O principal aspecto de mudança pretendida será a autorização – inconstitucional – de prevalência do que for negociado entre empresas e empregados (por intermédio de sindicatos) em relação ao que está escrito na legislação trabalhista, especialmente na CLT.

A esse respeito, cumpre esclarecer, inicialmente, que a Constituição de 1988 previu expressamente a força normativa dos acordos e convenções coletivas de trabalho – fruto de negociação coletiva – contanto que esses instrumentos visem à melhoria da condição social dos trabalhadores (art. 7º, caput e inciso XXVI, da Constituição). Noutras palavras, desde 1988, pelo menos, já é possível que normas coletivas de trabalho livremente pactuadas possam ampliar direitos. Daí porque o aspecto – não dito – da proposta de Temer é que as negociações coletivas, a partir de agora, possam suprimir direitos previstos na CLT e na legislação trabalhista, tais como: I) o intervalo mínimo de 1h para refeição e limites à jornada de trabalho, em desrespeito às normas de saúde e segurança no trabalho, o que invariavelmente ampliará o número de acidentes e de adoecimentos no trabalho no Brasil; II) o parcelamento no pagamento de PLR; III) a renúncia do trabalhador ao recebimento das horas in itinere (tempo gasto no deslocamento para o local de trabalho em locais de difícil acesso ou naqueles em que não haja transporte público regular), entre outras possibilidades.

Além disso, a proposta enunciada quer aumentar de três para oito meses o tempo em que o empregador poderá se valer do contrato temporário, quando é sabido que há muitas fraudes nesse campo e que grande parte dos contratos de trabalho por prazo indeterminado não chegam a oito meses.

Também se propõe a responsabilidade subsidiária, e não mais solidária, das empresas tomadoras de serviços de terceiros, modificação que ampliará, significativamente, o calote que os trabalhadores terceirizados recebem no pagamento de seus direitos. Cumpre lembrar, a esse respeito, que a grande maioria das ações em trâmite na Justiça do Trabalho discute apenas o não-pagamento de verbas rescisórias, sendo o aviso prévio o principal direito frustrado por empregadores.

Consoante vem sendo divulgado pela mídia, há muitas outras mudanças no projeto que será encaminhado ao Congresso Nacional, a maior parte delas com o objetivo de minar a estrutura de direitos trabalhistas vigente no ordenamento jurídico brasileiro. As que não são querem apenas dar um ar de temperança ao projeto, mas pouco afetarão a clara tendência de ampliação da precarização de direitos e subjugação do trabalhador, ainda em maior medida, ao capital.

Em breve síntese, o mínimo de dignidade ao trabalhador brasileiro – que já é uma das mãos-de-obra mais baratas do mundo – é o que pretende derrogar, Michel Temer em sua propalada minirreforma trabalhista.

Como fez com a reforma do ensino médio – imposta por intermédio de medida provisória (atualmente questionada no Supremo Tribunal Federal na ADI 5604), Temer busca legislar, agora, no campo da legislação trabalhista, e vai se convertendo, a passos largos, num “déspota esclarecido às avessas”, ao enunciar mudanças estruturais, sem qualquer debate social, mesmo sabedor dos reflexos sociais gravíssimos que serão causados por suas espúrias medidas, que seguramente mergulharão o país numa recessão ainda maior, em desarrazoado sacrifício à população brasileira, tudo em prol dos interesses mesquinhos de um pequeno, mas poderoso grupo empresarial que o guindou ao poder. O tiro de misericórdia talvez deva ser a reforma da previdência.

Resistir é preciso, enquanto é tempo.

*Gustavo Ramos é advogado de Direito do Trabalho e sócio do escritório Roberto Caldas, Mauro Menezes & Advogados