AssIBGE – “Não à intervenção do governo no IBGE”

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A Associação dos Servidores do Instituto Brasileiro de Geografia  e Estatística (AssIBGE) convoca servidores e a população para uma manifestação em frente à sede do órgão no dia 2 de maio, a partir das 10 horas. O ato é contra a “intervenção do governo, no processo de construção do Censo 2020, que fere a autonomia técnica” da instituição

De acordo com a Associação, a indicação do economista Ricardo Paes e Barros resultará em “quebra da imparcialidade e a possibilidade de conflito de interesse”, já que “um pesquisador usuário do censo ficou responsável por realizar cortes no questionário da pesquisa”. “Consideramos essa atitude uma INTERVENÇÃO no IBGE, que fere sua autonomia técnica. Não há outra palavra, um rompimento com os princípios fundamentais de estatísticas oficiais, um desrespeito ao corpo técnico e a todos (entidades, pesquisadores, grupos da sociedade civil, pessoas que participaram da consulta) que contribuíram até agora com o processo de construção do Censo 2020”

“Veja a carta da AssIBGE:

“Através da imprensa, no dia 16 de abril, o corpo técnico do IBGE soube que todo o processo de consulta à sociedade, a avaliação dos técnicos sobre o tamanho do questionário do Censo 2020 e a relevância de cada quesito foi jogada por terra.

Na reunião da Comissão Consultiva do Censo 2020, realizada no dia 15 de abril, a Presidente do IBGE desconsiderou propostas de ajuste pontuais e decidiu criar um Grupo de Trabalho para fazer mudanças drásticas no questionário. Esse grupo será conduzido por uma pessoa de fora da instituição, o senhor Ricardo Paes de Barros, a quem a Presidente está dando total autonomia, o que jamais aconteceu no IBGE.

Ainda que possua currículo considerável, Paes de Barros não substitui todo o acúmulo construído ao longo de anos, com arranjos institucionais e diferentes instrumentos de escuta da sociedade a respeito das demandas para o Censo Demográfico 2020, que ocorreram entre 2016 e 2019, a saber:
• Infoplan 2016 (Confest/Confege) – Fórum previsto em lei
• Consulta usuários na internet via hot site 2018
• Reunião com especialistas temáticos – 2017/2018/2019
• Consulta a usuários internos – 2018
• Fórum de usuários – 2018
• Consultas públicas a grupos específicos – 2018-2019
• Testes cognitivos – 2016 2017 e 2018
• Prova Piloto 1 em 13 estados – 2018
• Prova Piloto 2 em 14 estados – 2019
• Seminários internos temáticos – 2017-2019
• Seminário internacional de avaliação da Prova Piloto 2 em 2019 com outros Institutos de Estatística

Consideramos essa atitude uma INTERVENÇÃO no IBGE, que fere sua autonomia técnica. Não há outra palavra, um rompimento com os princípios fundamentais de estatísticas oficiais, um desrespeito ao corpo técnico e a todos (entidades, pesquisadores, grupos da sociedade civil, pessoas que participaram da consulta) que contribuíram até agora com o processo de construção do Censo 2020.

Lembremos os “Princípios Fundamentais de Estatísticas Oficiais” estabelecido pela ONU. O Princípio 1 fala de relevância, imparcialidade e igualdade de acesso. De acordo com este princípio, “os órgãos oficiais de estatística devem PRODUZIR e divulgar, de forma IMPARCIAL, estatísticas de utilidade prática comprovada, para honrar o direito do cidadão à informação pública”.

Esse princípio aponta para a necessidade de todo o Instituto ter seu programa de trabalho próprio, suas metodologias e orientações preservados diretamente da influência dos governos ou de interesses particulares. Um pesquisador usuário do censo ficou responsável por realizar cortes no questionário da pesquisa. Isso aponta uma quebra da imparcialidade e a possibilidade de conflito de interesse.

As informações são relevantes se cumprem as necessidades dos usuários: população, governos, academia, sociedade civil, movimentos sociais, empresas, entre outros. O que produzir? O que perguntar? Qual instrumento? A relevância deve ser avaliada pelo corpo técnico, de acordo com consultas à sociedade, através de arranjos institucionais abrangentes, como conselhos, fóruns, encontros, câmaras técnicas e consultas populares.

O censo brasileiro é muito barato. Já conseguimos fazer muito com pouco. Ele custa 17 reais por pessoa e foi orçado em US$ 3,4 bilhões. O Censo Demográfico dos EUA está orçado em US$ 15, depois de revisão do valor para cima.

Diante de falta de justificativa lógica, a redução do questionário está sendo colocada como um pré-requisito para a realização do Censo, por ter apelo midiático e de prestação de contas aos superiores da Presidente. O ministro Paulo Guedes quer reduzir a pesquisa a uma mera contagem da população. O que está ocorrendo, de fato, é o desejo de se pesquisar menos, informar menos, conhecer menos. É um ataque ao conhecimento e à produção da estatística pública. Essa postura remete à afirmação do ministro da Economia na posse da Presidente do IBGE: “QUEM PERGUNTA DEMAIS DESCOBRE O QUE NÃO QUER”.

Paulo Guedes ainda insiste em propagar mentiras quando retoma, na noite do dia 17 de abril em programa na televisão por assinatura, a sua “tese” de que censos do mundo inteiro fazem 10 perguntas. Confira:
Censo da Inglaterra – 57 questões
Censo da Austrália – 60 questões
Censo da Canadá – 60 questões
Censo da Itália – 82 questões
Censo da Alemanha – 43 questões
Censo da Irlanda – 47 questões

Além disso, afirma que o censo brasileiro tem 360 perguntas, quando na verdade são 149. Lembrando que é impossível a pessoa passar por todas as perguntas pois o questionário contém um fluxo em que há salto de perguntas dependendo do perfil de cada pessoa.

Outro absurdo proferido por Paulo Guedes na entrevista de ontem foi sua comparação com o IBOPE. Entretanto, senhor Ministro, o Instituto Oficial de Geografia e Estatísticas possui atribuição e áreas de competência definidas em lei (Lei 5.878/1973). Produz estatísticas e pesquisas geocientíficas públicas que não se confundem com um instituto privado que se orienta pelo lucro.

Fala-se da importância de melhorar a qualidade e a cobertura dos registros administrativos e o acesso do IBGE a esses registros, o que é correto. Entretanto, enquanto isso não ocorre, não podemos substituir os dados coletados pelo Censo por nada. Esse vazio causará enorme prejuízo ao conhecimento da realidade brasileira, sobre o que ocorreu com indicadores fundamentais ao longo de uma década. Como será possível construir e monitorar políticas públicas sobre o país sem dados para os municípios?

O problema do IBGE não é o tamanho do Censo Demográfico e o seu questionário, mas sim a falta de pessoal efetivo e de orçamento. Os concursos têm sido negados pelo governo federal, e a sua ausência coloca em risco a manutenção do programa de trabalho da instituição.

Convocamos os trabalhadores a defenderem o Censo 2020, sem cortes e defender a autonomia técnica do IBGE. Depois que um censo de questionário retalhado e sem condições adequadas de coleta for feito, quem vai ficar com o seu espólio? Seremos nós, os trabalhadores dessa instituição e não uma Presidente que está de passagem.

O que está ocorrendo é um ataque às estatísticas públicas e ao IBGE, não é problema exclusivo dos trabalhadores envolvidos diretamente com o Censo Demográfico, a maior pesquisa do órgão. Se permitirmos isso, haverá precedente para impor essa lógica sobre outras pesquisas e projetos. Credibilidade e qualidade são elementos difíceis de serem conquistados e muito fáceis de serem perdidos e isso impacta todos os trabalhos da casa, bem como o país, que será privado de estatísticas confiáveis.

Todos na frente da Sede do IBGE, no dia 2 de maio, a partir das 10 horas. Vamos nos manisfestar contra essa intervenção.

Tirem a mão do Censo Demográfico!
Por um Censo sem cortes!
Concurso público, já!”