Fabiana Karla
fabiana 1 Fabiana Karla se destaca fazendo graça como a Madá, de Verão 90 Fabiana Karla

Fabiana Karla: “O povo é minha matéria prima”

Publicado em Entrevista

Em entrevista ao Próximo Capítulo, a atriz Fabiana Karla como cria seus personagens, fala do sucesso de Madá, de Verão 90, e se revela escritora de livros infantis. Confira!

A década de 1990 não sai da mente ー nem do coração ー de Fabiana Karla. Na pele de Madá, ela é um dos destaques da novela Verão 90, folhetim de Izabel de Oliveira e Paula Amaral que se passa naquela época. Além disso, foi quando Fabiana teve seus três filhos, “o que marcou minha vida para sempre.”

Muito associada ao humor, Fabiana é um dos poucos nomes que transita também entre as novelas. Em Amor à vida, por exemplo, deu vida a Perséfone, personagem pela qual “nós acabamos libertando várias mulheres que sofreram com a gordofobia”. Ter Fabiana no elenco de uma novela é sinônimo de alegria.

Na entrevista a seguir, a atriz fala sobre o início da carreira, o lado de autora de livros infantis e de cantora e ainda manda um recado para um dos maiores novelistas do país: “Aproveito para fazer meus votos ao Manoel Carlos: sempre sonhei em fazer uma Helena gordinha.”

Entrevista// Fabiana Karla

Fabiana Karla
Fabiana Karla: “O humor é eterno.Mesmo que ela venha em formato de crítica, ele ainda causa bem estar”

Como você define seu papel em Verão 90?
Madá é uma mulher esotérica, acredita muito na energia do universo, com seus cristais, incensos, suas terapias alternativas, os astros e etc. Ela é apaixonada pelo seu marido Álamo (Marcos Veras). Em um certo momento da trama, ela começou a ter vidências que vão aflorando durante a novela. É uma mulher muito iluminada e divertida.

Você faz pouca novela. Sente cobrança por isso? É uma opção sua?
Geralmente, somos convidados para fazer os papéis que já são pensados para a gente. Então eu vejo se me identifico com a personagem. Se sim, eu aceito. Aproveito para fazer meus votos ao Manoel Carlos: sempre sonhei em fazer uma Helena gordinha. Não me sinto nada cobrada. Adoro a repercussão que os personagens têm quando são de novelas. As pessoas me param em todos os cantos para dizer como se divertem com meus papéis e que elas ficam só esperando para ver o que eu vou aprontar.

Verão 90 se passa na década de 1990. Do que você se lembra dessa época?
Me lembro de vários fatos curiosos como o tetra brasileiro e a morte do Ayrton Senna. Foi nessa década que eu tive meus 3 filhos — em 1997, 1998 e 1999–, o que marcou minha vida para sempre. Em 1991 foi quando eu ganhei o prêmio de melhor atriz no festival Arte viva ela, na minha cidade, com a Lucicreide que eu consegui colocar depois no Zorra total, e ainda trouxe para as telas de cinema. Também me diverti com a música e a moda da época. Coisas muito legais que a gente lembra com gostinho de saudade.

Você costuma ser uma pessoa saudosista?
Sim. Com certeza quem viveu essas duas décadas de 1980 e 1990, tem muita saudade. Eu ainda tenho camisa com logo de Fita cassete, melissa guardada, pochetes, e eu estou tendo oportunidade de usar tudo isso de novo. Eu me lembro de coisas muito gostosas daquela época e é claro que bate aquela saudade gostosa.

Você tem feito muitos filmes — está para estrear Uma pitada de sorte e Lucicreide vai pra Marte. Atualmente, há mais espaço para o humor no cinema do que na tevê?
Tivemos tempos muito áureos da comédia. As pessoas saíam de casa e lotavam o cinema para assistir aos filmes da Dercy Gonçalves, do Oscarito, aos filmes dos Trapalhões, todos eles recheados de humor. Mas hoje em dia também temos filmes muito legais no cinema. Colegas como Paulo Gustavo e Mônica Martelli, Ingrid Guimarães, Tatá Werneck, Samantha Schmutz estão arrebentando com os filmes de comédia. E isso está aquecendo ainda mais o cinema brasileiro para quando eu for botar o meu filme na telona.

Está mais complicado fazer humor nos dias de hoje do que quando você começou a carreira ou essa fase de dificuldade já passou?
Sinceramente eu nunca senti dificuldade de fazer humor porque eu sempre tive bons textos escritos para que eu pudesse defendê-los. Sempre fui uma intérprete envolvida em vários trabalhos que me deram destaque por meio do humor. Então, eu só tenho que agradecer ao humor que continua sendo uma arma muito importante, uma ferramenta muito valiosa e potente. O humor é eterno. Sempre haverá espaço para o humor, ele vai sempre ser um bálsamo nas nossas vidas, diante de momentos tão difíceis. Mesmo que ela venha em formato de crítica, ele ainda causa bem estar.

Apesar de ter alguns papéis dramáticos, as pessoas acabam te rotulando como humorista. Isso te incomoda de alguma forma?
Isso não me incomoda. As pessoas me percebem nos dois tons, só que elas me preferem na comédia. E eu fico envaidecida porque é muito difícil fazer comédia. Então, se elas me enaltecem como humorista, e me respeitam tanto na comédia quanto no drama, isso me deixa feliz. E pra mim, a opinião do público é como um termômetro.

Você emplacou vários bordões na época do Zorra total. Como fazer para conhecer tão bem o público?
Eu adoro observar as pessoas. O povo é minha matéria prima. Eu adoro ficar na praia, por exemplo, observando o comportamento das pessoas, de todos ao meu redor. Isso me dá material para trabalhar. Eu gosto de escutar o linguajar do cara que está fazendo sanduíche lá na baixada, quando o vendedor diz “manda um mendigão pra dentro ai!'”. Quando ele vê isso repercutir na televisão, ele se reconhece, ri. Faz parte viajar, conhecer pessoas, novas culturas, para você observar e ter material para trabalhar.

Você é mulher e nordestina. Sentiu muitos preconceitos e olhares tortos no início da carreira? Quem te incentivou a superá-los?
Nunca tive nenhum olhar torto, nunca sofri nenhum preconceito por ser nordestina. Nunca sofri bullying por causa dos meus padrões e estéticos e posso dizer que sempre tive as coisas ao meu favor porque eu tive grandes nomes nordestinos, como Chico Anysio, Renato Aragão e Tom Cavalcante, que abriram espaço para quando eu viesse depois. Quando você via um nordestino chegando era sinal de alguma coisa interessante.

Atriz Fabiana Karla em Amor à vida
A repercussão de Perséfone em Amor à vida surpreendeu Fabiana Karla

Em Amor à vida, sua personagem teve uma repercussão muito grande por discutir um tema raramente levado ao ar: a gordofobia. O retorno do público te surpreendeu à época?
Sim. Em Amor à vida eu me surpreendi muito até porque no início não se tocava nesse assunto. Essa questão da gordofibia foi se revelando ao longo da novela. Foi bom porque repercutiu tanto para quem sofria bullying quanto pra quem praticava. Abriu os olhos de muita gente. Foi um momento muito especial, fui muito bem recebida nas ruas, tanto eu quanto o Walcyr e nossos colegas da novela. Pela Perséfone nós acabamos libertando várias mulheres que sofreram com a gordofobia. E isso é um serviço a favor do público e só enaltece a arte que está sendo veículo disso.

Sente ter feito um trabalho social como essa novela? Ter mexido com a autoestima de outras mulheres acima do peso?
Pela Perséfone nós acabamos libertando várias mulheres que sofreram com a gordofobia. E isso é um serviço a favor do público e só enaltece a arte que está serviu de veículo para expor esse assunto.

Como foi reviver um personagem já consagrado em Escolinha do Professor Raimundo e outro que já havia sido defendido por outra atriz em Gabriela? A responsabilidade nesses casos aumenta?
A responsabilidade aumenta muito, até porque são duas atrizes maravilhosas. Temos a Ângela Leal que fez a Dona Olga maravilhosamente bem em Gabriela e depois a Claudia Gimenes. Eu tentei pegar um pouquinho de cada uma como uma forma de homenagem e dei o meu temperinho para dar um novo aspecto ao personagem sem perder a essência.

Chegou a procurar as atrizes que viveram esses papéis antes para conversar ou para afastar o medo de comparações?
Não procurei ninguém. Não queria passar a impressão de estar imitando, até porque não sou boa nisso. Por exemplo, quando fiz a Dilmaquinista no Zorra Total, que era inspirada na Dilma (Rousseff), eu optei por não ficar vendo nada referente a ela e cair na tentativa de imitá-la. Eu preferi pegar um pouquinho de cada uma e aderir ao meu jeito de atuar. Consegui passar isso para o público com delicadeza.

Fabiana Karla como Cacilda e Escolinha do Professor Raimundo
Como Cacilda em Escolinha do Professor Raimundo.

Você foi premiada pelo documentário O Caso Dionísio Diaz, que você dirige ao lado do Chico Amorim. Como foi a experiência de fazer esse filme?
Eu costumo dizer que não sou diretora, sou uma boa contadora de histórias. Então eu convidei o Francisco Amorim, que já tem experiência com direção e a gente partilhou desse sonho. Eu sabia da história e a gente tentou contá-la da melhor maneira possível. Sem pretensão levamos o filme pro festival, participamos de todos os processos seletivos e para nossa surpresa, competimos com filmes de níveis muito altos, mesmo assim ganhamos. Eu fiquei muito feliz, muito envaidecida e vou lembrar dessa história com muito carinho.

Você pensa em dirigir outros filmes?
Eu faço muito o que me inspira, se eu tiver uma nova inspiração para contar uma outra história, quem sabe eu me aventuro? Mas no momento, como direção uma tarefa muito árdua, há de se entender muito bem de tudo, o que funciona no set, eu não sei se estaria preparada no momento para dirigir um filme sozinha.

Muita gente se surpreendeu como sua performance no Popstar. Mas a música esteve presente em sua vida e na sua carreira antes, não?
A música sempre esteve presente na minha vida, até porque eu venho de um celeiro musical muito grande que é Pernambuco, então eu realmente tenho a música batendo no meu coração desde que eu nasci. Eu acho que bate no compasso do frevo (risos). Mas tudo foi uma grande novidade, com estrutura de um popstar de verdade. Fiquei em êxtase, me concentro de um jeito diferente quando canto, fico mais perto do céu. Eu ainda tive a alegria de dividir o palco com minha filha Laura, que foi minha backing vocal durante o programa. Foi uma das coisas mais maravilhosas que já fiz na minha carreira, adoraria poder participar novamente. O programa me rendeu bons frutos, inclusive pedidos para shows que eu estou retardando por causa da agenda, mas que não descartei a possibilidade. Cantar foi um presente, uma dádiva. Eu costumo dizer que atuar para mim é um casamento, mas a música é um amante (risos).

Como autora de livros infantis e mãe, você acha que nossas crianças precisam de mais incentivo a ler?
Sim, sempre. A leitura precisa ser incentivada em todas as idades desde pequenininho. Por isso, eu estou com vários projetos de bibliotecas itinerantes, tentando abrir bibliotecas em ONGs, onde eu sei que crianças vão ter acesso. Sempre procuro deixar meus livros lá. O rapto do galo, por exemplo, meu xodó por ser o primeiro, permite trazer um pouco da minha cultura para outras pessoas. Quem estiver no outro lado do mundo e pegar meu livro, vai achar curioso, bonito, com ilustrações de Rosinha Campos que retratou todo aquele carnaval que eu contei com cores vibrantes, chitas, xilogravuras, com a alegria que o livro pedia.

Como incentivá-las tendo a ferrenha concorrência da tecnologia?
Trazendo livros atrativos e coloridos que tenham um apelo que consiga prender a atenção daquela criança e assim criar o hábito. Assuntos que estimulem a criatividade, pois o livro tem a magia de fazer você viajar sem sair do lugar. Trazer um universo que interesse a criança.