Ubook/Divulgação. Ator André Ramiro. Ubook/Divulgação. Ator André Ramiro.

André Ramiro: Um ator multiplataformas

Publicado em Entrevista

André Ramiro grava audiolivro Infiltrado na Klan, está na GloboPlay em Ilha de ferro e na série Rio Heroes, da Fox. Haja fôlego!

Não existe plataforma ou linguagem que limite o ator André Ramiro. O eterno Aspirante Matias do filme Tropa de elite (2007) pode ser visto na série A ilha de ferro, disponível no GloboPlay, na série Rio heroes, da Fox, e em seu mais recente trabalho, o audiolivro Infiltrados na Klan, disponível no serviço Ubook.

“Como ator, é uma prática de leitura e interpretação sem a imagem, apenas com a voz. A única diferença é que quem vai criar as imagens será o público”, avalia André. “Estamos na era moderna, os conteúdos estão sendo mais assistidos nas telas do celular, tablets e computador. Quem não se adaptar vai ficar para trás”, completa o ator.

Livro que deu origem ao filme homônimo de Spike Lee, a obra tem uma forte pegada contra o racismo. André conta que isso não foi determinante para que ele fizesse o trabalho, mas acredita numa “conspiração do universo”. Isso porque, segundo André, “em grande parte das vezes são os personagens que nos escolhem”.

Na série A ilha de ferro, André dá vida a Norato, chefe da cozinha da plataforma de petróleo onde se passa a série e traficante de drogas. “Queremos personalidades com quem nos identifiquemos, que façam a diferença, que elevem nossa autoestima, que nos deem orgulho de sermos quem somos e nos empoderem cada vez mais. E isso se aplica a várias camadas da nossa sociedade. O mais interessante no Norato é que ele é gay e chefe da cozinha de uma plataforma petrolífera. É necessário estudar e batalhar para se tornar líder nessa função. No caso de ele traficar, eu o vejo como uma pessoa que faz uma má escolha na vida assim como qualquer outra sendo branco, preto e etc… Não me preocupo com o estigma e sim com me superar e fazer um bom trabalho”.

Em entrevista ao Próximo Capítulo, André Ramiro fala sobre política, sobre a carreira, novas tecnologias e hip-hop, uma grande paixão na qual ele é atuante. Confira!

Leia entrevista com André Ramiro

Como é a experiência de narrar um audiolivro? É muito diferente de atuar?
A experiência foi ótima. Fui muito bem assessorado pela equipe do Ubook. Como ator, é uma prática de leitura e interpretação sem a imagem, apenas com a voz. A única diferença é que quem vai criar as imagens será o público.

A temática de Infiltrado na Klan influenciou na sua decisão de aceitar o convite para o livro?
Não necessariamente. Poderia ter sido outro livro. Mas acredito que o universo tenha conspirado a favor. Em grande parte das vezes são os personagens que nos escolhem.

Como é a sua relação com audiolivros? Já se rendeu a essa plataforma?
Até o momento não tinha tido nenhuma relação com audiolivros. Gosto do papel, de ter o livro em mãos, de colecionar. Mas acho uma ótima e útil ferramenta para o dia a dia. Você pode ganhar informação enquanto está no caminho pro trabalho, enquanto está arrumando a casa e etc… é só acessar e por um fone no ouvido.

O espaço para atores negros vem crescendo na televisão brasileira numericamente. Mas raramente vemos negros em papéis principais. Isso vem mudando também?
Não só para nós, pretos. Todos sabemos que as oportunidades não são iguais, que ainda falta equilíbrio em vários aspectos no nosso país e no mundo. Acredito ser uma falta de respeito à humanidade classificar ou julgar qualquer pessoa pela classe social ou cor da pele e não pelo caráter. Mas, com todo respeito e humildade que me cabem, vou responder sua pergunta: Sou carioca, minha mãe é preta, baiana de sangue nordestino e mesmo sendo preto não foi isso o que aprendi em casa. Mas, no nosso caso (do povo preto), é só uma questão de tempo, estamos estudando, nos sofisticando e trabalhando com afinco para sermos os criadores, os realizadores, os donos de nossos próprios negócios para criarmos cada vez mais oportunidades, para gerarmos empregos e não sermos apenas os empregados esperando que alguém faça algo por nós. Temos exemplos disso que estou falando na atualidade e desde de muito antes do século 19, como por exemplo Luiz Gama, André Rebouças, Machado de Assis, Mãe Menininha do Gantois, Antonieta de Barros, Tereza de Benguela, e muito mais.

O Norato, de A ilha de ferro, é um traficante. Já sentiu medo de ficar estigmatizado por esse tipo de papel pelo fato de você ser negro?
Deixo claro que todos sabemos muito bem que o povo brasileiro, ou seja, “a maioria” quer se ver representado nas telas de uma maneira contrária à estatística da marginalização. Queremos personalidades com quem nos identifiquemos, que façam a diferença, que elevem nossa autoestima, que nos deem orgulho de sermos quem somos e nos empoderem cada vez mais. E isso se aplica a várias camadas da nossa sociedade. O mais interessante no Norato é que ele é gay e chefe da cozinha de uma plataforma petrolífera. É necessário estudar e batalhar para se tornar líder nessa função. No caso de ele traficar, eu o vejo como uma pessoa que faz uma má escolha na vida assim como qualquer outra sendo branco, preto e etc… Não me preocupo com o estigma e sim com me superar e fazer um bom trabalho.

Os jovens de hoje estão mais preparados para o combate ao racismo tanto na militância como no respeito ao próximo?
Vejo que nos tempos atuais, tendo em vista a globalização digital e nossos conflitos sociais, temos muita gente causando mais problemas ao invés de resolvê-los, saindo do armário e praticando desserviços à humanidade com seus preconceitos. Mas também muita gente, principalmente jovens, extremamente conscientes, batalhando e lutando por um futuro melhor, mais igualitário, de mais empatia e identificação humana. No mais, estamos todos aprendendo.

Como o governo pode ajudar nessa luta?
O start pode ser iniciado na sala de aula. Trabalhando todas essas questões e conflitos com uma base educacional boa e forte. Respeitando a dignidade de um povo que paga impostos caríssimos e não é ressarcido pelo que é seu por direito constitucional. Acabando com a corrupção, condenando justamente o corrupto e por aí vai … No mais todos já sabemos.

Tropa de elite comemorou 10 anos. Ainda sente a repercussão do filme?
Sim muito. O filme fez história no Brasil e no mundo. Sempre que sou abordado recebo muito carinho e respeito das pessoas.

Acha que ele é mais atual hoje ou quando foi lançado?
Infelizmente acho tão atual quanto. Mas sou otimista e acredito no ser humano, em um futuro melhor. Sempre!

O filme Tropa de elite marcou a carreira de André Ramiro
Crédito: Alexandre Lima/Divulgação O filme Tropa de elite marcou a carreira de André Ramiro

 

Você interpretou o Norato em Ilha de ferro. Como avalia a chegada de uma nova plataforma ao mercado?
Estamos na era moderna, os conteúdos estão sendo mais assistidos nas telas do celular, tablets e computador. Quem não se adaptar vai ficar para trás. Gratidão a Afonso Poyart, meus companheiros de elenco e toda equipe técnica por esse trabalho incrível. Não percam Ilha de ferro!

A política polarizou vários segmentos da cultura. Como o movimento hip hop sai dessa eleição? Mais fortalecido ou dividido?
O movimento e a cultura hip hop no Brasil nasceram com base no protesto pela reivindicação por poder para a maioria. Não estamos fora e tão pouco à margem da sociedade. Estamos cada vez mais fortes, mais profissionais e cada vez mais conscientes. De uma maneira geral, estamos todos nos adaptando e a luta é constante.

As letras do rap e as palavras de um filme ou espetáculo ditas pelo ator podem de alguma forma ajudar na união do país? Como?
Claro que podem. Um artista como Bob Marley, por exemplo, foi capaz de unir a Jamaica no meio de um conflito político beirando a guerra civil. Ou você acha que as palavras e atitudes de artistas como Mano Brown, Racionais MCs, Sabotage, RZO, Criolo, Emicida, Lázaro Ramos, Taís Araújo, Milton Gonçalves, Lea Garcia, Carol Konca, Gabi Amarantos, Iza, Anitta, Ludmila, Pablo Vittar entre outros e outras não afetaram, inspiraram e influenciaram a vida de muitas pessoas? Mas, de fato, o que vai unir o nosso país é a empatia humana, a sabedoria e a consciência coletiva. Na minha humilde opinião, o artista é um serviçal da arte e interlocutor do povo.