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Uma despedida melancólica

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A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, deixa o cargo amanhã com um desgaste do tamanho do prédio espelhado da sede do órgão, na Avenida das Nações, mais por circunstâncias e até mesmo acertos do que propriamente os erros, que, evidentemente, entram na conta, caso se tente fazer um balanço da gestão. A imagem do Ministério Público termina pior do que começou, depois dos dois anos de mandato da chefe — mais uma vez, para além do trabalho dela e da equipe.

Dodge sai mal diante da categoria porque vetou algumas tentativas de privilégios inimagináveis aos olhos da população e por ter dinamitado — mesmo que de modo juridicamente controverso — o tal fundo com recursos da corrupção da Petrobras, que seria gerido pelo Ministério Público. Nos dois casos, fez favores ao contribuinte brasileiro. Senhoras e senhores, tudo estaria pior para procuradores — e para cada um de nós — se, diante do vazamento dos diálogos dos integrantes da força-tarefa em Curitiba, a ideia amalucada do pessoal tivesse vingado. Fomos salvos pelo gongo batido por Dodge.

E aqui chegamos a mais um dos desgastes do Ministério Público que nada tem a ver com Dodge, afinal, a procuradora já assumiu a chefia da PGR com a Lava-Jato de vento em popa, e com a força-tarefa e o então juiz Sergio Moro fortalecidos e sem qualquer impedimento do ponto de vista institucional e político. A procuradora, tal qual os principais atores dos Três Poderes, deixou a bola rolar, sem apitar as infrações. Por mais que ela possa ser acusada de omissão, pelo menos pode dizer que não foi a única.

Por fim, cabe, a partir de agora, uma avaliação dos próprios integrantes da carreira em como reverter o desgaste na imagem, independentemente de Dodge. A recusa do presidente Jair Bolsonaro em reconhecer a lista tríplice da categoria é um dos pontos mais delicados. Se o debate acabou pendendo para a interferência do capitão da reserva no MP, também deixou claro o corporativismo da categoria, considerando vários movimentos ao longo dos últimos meses. De forma geral, se salvou quem não foi pedir a bênção ao presidente no Palácio do Planalto. Teve gente que passou por lá e, mesmo assim, acabou preterido. Mas aqui não tratamos de casos particulares e, sim, da imagem de uma corporação que precisa se mostrar forte em favor da sociedade.

Desafios

O escolhido por Bolsonaro para procurador-geral da República, Augusto Aras, jogou o jogo e se saiu bem. Se era a primeira indicação de Bolsonaro, acabou sendo isca de adversários para os ataques de bolsominions. Os estrategistas e os mercenários disfarçados de assessores em Brasília perceberam que, para queimar alguém com o presidente, basta entregar alguma história — seja ela falsa ou verdadeira — a influenciadores digitais da turma ideológica. Foi o que ocorreu com Aras, que agora tem o desafio de aceitar o enredo montado por Bolsonaro sem se desgastar com os integrantes da carreira do MP a ponto de se inviabilizar. Se tiver algum sucesso, termina o mandato melhor do que o recebeu de Raquel Dodge. Considerando a expectativa do capitão reformado, a tarefa é quase impossível.

Militares

Os próximos movimentos da equipe econômica em relação à preservação de pelo menos uma pequena parte do orçamento dos militares serão acompanhados com lupa na Esplanada. Como mostrou o Correio ao longo dos últimos dias, desde sábado, 7 de setembro, os cortes em projetos prioritários podem afetar diretamente as Forças Armadas. Em todas as entrevistas e notas, os representantes do Ministério da Defesa dizem acreditar na reversão dos números iniciais apresentados para 2020 em relação a despesas discricionárias — as que tratam de investimentos. O argumento é que Bolsonaro, um político com origem militar, teria sensibilidade para evitar queda total das verbas, afinal existem projetos que não receberão nenhum tostão. A ver.