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Cristiane, Rosana, Formiga and Marta of Brazil celebrate a goal against Norway during their Women's World Cup Group D soccer match in Wolfsburg Reuters/Fabian Bimmer

A luta social por trás da debandada das jogadoras da Seleção

Publicado em Futebol

Enquanto atletas de diferentes ligas esportivas dos Estados Unidos protagonizaram uma onda de manifestações contra o racismo, há mais de três décadas o Brasil não vê um grande movimento criado por esportistas. Na última semana, porém, a aposentadoria em massa de jogadoras da Seleção Brasileira de futebol feminino mostra que a falta de posicionamento político em questões sociais por parte de atletas brasileiros está mudando.

Cinco atletas prometeram não vestir mais a camisa verde-amarela em protesto à demissão da ex-técnica da Emily Lima do comando da Seleção de futebol feminina. Ela foi a primeira mulher a assumir o cargo. Contudo, a saída da Emily foi apenas a gota d`água para a debandada das jogadoras. As atletas também reivindicam por mais estrutura e transparência no futebol feminino. E as exigências não se limitam ao aspecto esportivo. Os protestos são também por oportunidades e tratamentos iguais a homens e mulheres.

“É futebol feminino, mas praticamente não tem mulher”, criticou Cristiane, no comunicado de despedida dela da Seleção. Maior artilheira da história das Olimpíadas com 14 gols, a atacante abriu as portas para a meia Fran, a lateral Rosana, a zagueira Andreia e, nesta semana, a meia Maurine anunciarem que apoiam a treinadora.

O preço que elas estão se propondo a pagar é carregado de frustrações. “Não estamos desistindo do futebol feminino. Mas, sim, estamos abrindo mão dos nossos sonhos por um futuro melhor para nossa futura geração”, ressaltou Andreia, ao justificar nas redes sociais a decisão de não defender mais o Brasil em campo.

No Brasil, onde o esporte é considerado território conservador por Dulce Filgueira, professora de sociologia da faculdade de educação física da Universidade de Brasília (UnB), o último movimento social criado por esportistas soma 35 anos. Liderada pelo ex-jogador Sócrates, a Democracia Corintiana se consolidou como uma frente importante contra a ditadura militar no país, entrando para a história como a maior ação ideológica do futebol brasileiro.

Entre os movimentos mais recentes, há o Bom Senso F.C., criado em 2013 por jogadores de grandes clubes de futebol do Brasil, que buscavam melhores condições no futebol nacional. Este ano, jogadores das duas principais divisões do Campeonato Brasileiro também se manifestaram em campo contra a proposta de reforma trabalhista na Lei Pelé, que regula os vínculos entre jogadores e clubes. Estes dois movimentos, porém, se diferenciam ao das jogadoras de futebol por terem sido voltados exclusivamente a questões esportivas.

Para a professora Dulce Filgueira, os movimentos esportivos ganham outros contornos no momento em que se enxerga o esporte como fenômeno social. Mas a especialista em psicologia do esporte, Katia Rubio, alerta que, por mais que a imagem de um atleta possa dar peso para tratar de problemas sociais ou políticos, a opção por fazê-lo é somente da pessoa. Ninguém tem o dever de se posicionar em relação a tema algum. Mas, claro, todos têm o direito de fazê-lo, caso queira. E, no caso de esportistas, a visibilidade ajuda a promover a causa.

Declarações das jogadoras que anunciaram aposentadoria da Seleção

“Não temos força e nem voz. E isso, um dia cansa”
Rosana
35 anos, 18 deles na Seleção Brasileira

“Para que serve o curso de treinadores que é cedido às atletas e ex-atletas se amanhã ou depois a gente não pode trabalhar ou se vai trabalhar sob pressão”
Cristiane, maior artilheira da história das Olimpíadas
32 anos, 17 deles na Seleção Brasileira

“Muitas vezes não temos força nem coragem para falar nada, talvez pelo medo de não ser mais convocada. Mas hoje, precisamos colocar aí dentro pessoas que sonham e que realmente acreditam no futebol feminino”
Andreia
33 anos, sete deles na Seleção Brasileira

“Fico triste por está encerrando (trajetória na Seleção) antes do tempo esperado”
Maurine
31 anos, 16 deles na Seleção Brasileira

“Estou cansada de tanta injustiça e hipocrisia. Se nada muda, mudo eu”
Fran
27 anos, prata nos Jogos Olímpicos de Pequim-2008

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