Kaka O brasiliense Kaká: uma Copa do Mundo e uma Copa das Confederações pela Seleção. Foto: MowaPress

Kaká: a aposentadoria do futebol do único jogador nascido no Distrito Federal eleito melhor do mundo

Publicado em Esporte

Washington é o maior artilheiro de uma única edição do Campeonato Brasileiro com 34 gols em 2004. Amoroso foi goleador dos campeonatos Brasileiro, Italiano e Alemão, ganhou Libertadores, foi campeão mundial de clubes… Lúcio vestiu a braçadeira de capitão da Seleção no tri da Copa das Confederações em 2009 e na Copa de 2010. Felipe Anderson colaborou na conquista da inédita medalha de ouro nos Jogos Olímpicos do Rio-2016. Mas nenhum brasiliense foi tão longe no futebol quanto Ricardo Izecson dos Santos Leite — o único jogador nascido no Distrito Federal eleito melhor do mundo. Aliás, o último número 1 do planeta bola antes do início da dinastia de Lionel Messi e Cristiano Ronaldo.

Aos 35 anos (leia 35 curiosidades sobre o craque), Kaká anunciou a aposentadoria em entrevista a Galvão Bueno, na tevê Globo. “A minha palavra final é que o ciclo da minha carreira como jogador profissional acaba aqui. Cheguei à conclusão que é o momento de encerrar”, sentenciou como os olhos marejados.

O menino nascido no Gama e criado em Taguatinga pendurou as chuteiras. Saiu cedo da capital do país com seu Bosco, dona Simone e o irmão Digão para começar a carreira de futebol nas escolinhas do São Paulo. O plano quase foi interrompido por um acidente num tobogã, em Caldas Novas (GO). A família temeu que ele ficasse tetraplégico, mas a fé da família continuou movendo o sonho de Kaká — apelido dado pelo caçula Digão, que não conseguia pronunciar corretamente o nome do brother.  Aliás, Digão foi uma das vítimas de Kaká e do primo Delani nas partidas de golzinho durante as férias na casa dos avós. Quando duelavam em Taguatinga, os primos mais velhos enfrentavam os mais novos em uma ladeira do bairro do Distrito Federal. Os mais novos atacavam subindo a rua. Os mais velhos, descendo.

Os dois gols de Kaká na virada por 2 x 1 sobre o Botafogo na final do Torneio Rio-São Paulo de 2001 anunciavam que a safra do futebol brasileiro estava colocando em campo mais um fora de série. Era questão de tempo para a profecia se confirmar. Luiz Felipe Scolari viu potencial no menino. Bastaram dois amistosos, contra Bolívia, em Goiânia, e a Islândia, em Cuiabá, para Felipão se convencer de que teria de arranjar espaço para Kaká entre os 23 convocados para a Copa de 2002. E lá foi Kaká ser pentacampeão mundial precoce, aos 20 anos de idade. Entrou em campo na partida contra a Costa Rica. Na mais importante — a final diante da Alemanha — fez o trabalho de aquecimento durante um tempão à beira do campo, mas o árbitro italiano Pierluigi Colina encerrou a partida com Kaká na linha lateral do Estádio Internacional de Yokohama, no Japão.

Aqueles seriam os únicos minutos — talvez segundos — de Kaká em uma final de Copa do Mundo. Ele tentou em 2006. Insistiu em 2010, com a camisa 10 nas costas. No entanto, como titular, foi eliminado duas vezes nas quartas de final por França e Holanda, respectivamente.

 

TÍTULOS

  • São Paulo

Torneio Rio-São Paulo (2001) e Supercampeonato Paulista (2001)

  • Milan

Campeonato Italiano (2004), Supercopa da Itália (2004), Supercopa da Europa (2003 e 2007), Liga dos Campeões da Europa (2007), Mundial de Clubes da Fifa (2007)

  • Real Madrid

Copa do Rei (2011), Campeonato Espanhol (2012), Supercopa da Espanha (2012)

  • Seleção Brasileira

Copa do Mundo (2002), Copa das Confederações (2009)

PRINCIPAIS PRÊMIOS INDIVIDUAIS

  • Bola de Ouro, revista France Football (2007)
  • Jogador do Ano Fifa (2007)

 

Estava escrito que o ano da graça de Kaká seria msmo 2007. Cinco anos depois de chegar ao Milan por apenas 8,25 milhões de euros, o meia brindava o clube italiano com o heptacampeonato na Liga dos Campeões da Europa. Artilheiro do torneio, vingou a equipe rubro-negra do Liverpool, o algoz da histórica virada de 2005 na decisão do torneio. Na final do Mundial de Clubes da Fifa de 2007, pulverizou o temido Boca Juniors, no Japão, por 4 x 2. Dias depois, a consagração: Kaká recebia o prêmio de melhor do mundo da Fifa ao superar um tal de Cristiano Ronaldo e um tal de Lionel Messi na votação. Recebeu também o mais tradicional dos prêmios individuais do futebol — a Bola de Ouro da France Football.

Em 2008, Kaká finalmente jogou no bairro em que nasceu. Em 19 de novembro, vestiu a camisa 10 do Brasil na goleada por 6 x 2 sobre Portugal na reinauguração do Estádio Bezerrão, no Gama. Travou um duelo à parte Com Cristiano Ronaldo, seu sucessor no prêmio de melhor do mundo da Fifa. Curiosamente, Kaká pendura as chuteiras sem jamais ter marcado um gol em exibições no Distrito Federal. Não conseguiu pela Seleção e muito menos com a camisa do São Paulo.

 

“A minha palavra final é que o ciclo da minha carreira como jogador profissional acaba aqui. Cheguei à conclusão que é o momento de encerrar”

Kaká, em entrevista a Galvão Bueno na tevê Globo

 

Por alguns dias, Kaká chegou a assumir o status de segundo jogador mais caro da história do futebol ao ser vendido pelo Milan ao Real Madrid por 65 milhões de euros, em 1º de julho de 2009. Dias depois, o clube espanhol quebrou a banca ao depositar na conta do Manchester United 94 milhões de euros por Cristiano Ronaldo. Na época, a maior transação da história. Dez anos depois, Neymar trocou o Barcelona pelo PSG por 222 milhões de euros na última janela de transferências.

No Real Madrid de José Mourinho, Kaká passou a lidar diariamente com um marcador implacável: as dores causadas pela lombalgia (dores lombares). Jogou a Copa do Mundo de 2010 praticamente no sacrifício. Frequentou muito mais o banco de reservas do que o time titular do Real Madrid e viu que não tinha mais físico para acompanhar o estilo agressivo de jogo imposto por José Mourinho. Decidiu retornar ao Milan, mas foi uma caricatura dos tempos em que ganhou o apelido de Bambino D’Oro, na Itália. Estava chegando a hora deixar a Europa…

 

244 gols e 188 assistências em 762 jogos com as camisas de São Paulo, Milan, Real Madrid, Orlando City e da Seleção Brasileira

 

Topou o projeto do Orlando City na Major League Soccer. Passou a ter o salário mais alto da emergente liga norte-americana de futebol. Antes, fez uma escala  no São Paulo. Defendeu o clube do coração por empréstimo no Campeonato Brasileiro de 2014. Fez o time jogar bonito, diferente, ajudou Paulo Henrique Ganso a evoluir, mas sua presença tornou-se insuficiente para brindar o tricolor paulista com títulos. Mano Menezes, Felipão e o próprio Dunga tentaram resgatá-lo como líder da Seleção em novas tentativas de levá-lo para a Copa do Mundo de 2014 e de 2018, mas a idade, a dor e a tristeza causada pela separação da esposa Carol Celico foram minando a vontade de continuar.

Evangélico, Kaká tomou a decisão de pendurar as chuteiras com a ajuda de cinco pessoas próximas: seu Bosco, dona Simone, a namorada Carol Dias, o irmão Digão e a cunhada Rebeca. A pedido dele, todos o ajudaram em orações antes da palavra final. Em entrevista a Galvão Bueno, o agora ex-jogador anunciou que pretende estudar para ser dirigente de futebol. Mas há um outro projeto adormecido no coração de Kaká, que deve despertar em breve: ser pastor. Era o que ele mais queria na vida antes de ser jogador de futebol.