Pedro Jesus pediu centroavante, mas negou o discípulo Pedro e escalou Diego. Foto: Alexandre Vidal/Flamengo Jesus pediu centroavante, mas na hora de apostar no discípulo Pedro, preferiu Diego.

De Tite a Jesus: o erro que o mister não pode (nem deve) cometer na nova temporada do Flamengo

Publicado em Esporte

Primeiro de setembro de 2016. Estádio Olímpico Atahualpa, estreia de Tite à frente da Seleção Brasileira. Com num passe de mágica, o técnico descobre o time ideal na vitória por 3 x 0 sobre o Equador nas Eliminatórias. Agarra-se aos 11 até a Copa. Hierarquiza o elenco e vira escravo do próprio conceito. Roberto Firmino pedia passagem antes e durante o Mundial da Rússia, mas Tite não abriu mão de Gabriel Jesus. O autor de dois gols na estreia do treinador na altitude de Quito estava em má fase. Passou a Copa inteira sem fazer gol, mas não perdeu a posição. Sem os lesionados Renato Augusto e Daniel Alves, Tite não encontrou plano B e deu adeus ao sonho do hexa contra a Bélgica nas quartas de final.

Dezenove de fevereiro de 2020. Estádio Olímpico Atahualpa, jogo de ida da final da Recopa Sul-Americana. Jorge Jesus só não chega totalmente agarrado ao time ideal campeão do Brasileirão e da Libertadores devido às perdas de Gabriel Barbosa (suspenso) e de Pablo Marí (vendido ao Arsenal). Ao optar por Diego — e não Pedro — na vaga de Gabriel Barbosa, Jorge Jesus se manteve refém da hierarquia. Passou recado ao grupo de que o camisa 10 é seu 12º jogador. Não importa se a produtividade de quem chegou peça passagem.

Jorge Jesus tem todos os méritos pela excelente fase do Flamengo, mas não é perfeito. Erra. Falhou no jogo de ida contra o Emelec no início do mata-mata na campanha do bi na Libertadores, se perdeu na decisão do Mundial contra o Liverpool e escolheu mal no primeiro tempo desta quarta-feira contra o Independiente Del Valle. Mais do que hierarquização da escolha, a opção por Diego é totalmente contraditória.

O português passou o segundo semestre passado inteirinho reclamando a ausência de um centroavante. A diretoria tentou até Balotelli a fim de agradar Jorge Jesus. Não conseguiu, mas o time se virou muito bem sem um reserva à altura de Gabriel Barbosa. Quando houve emergência, Lincoln entrou em ação para o bem e o mal: fez o gol da vitória sobre o Botafogo no Nilton Santos pelo Brasileirão, mas desperdiçou a chance do empate contra o Liverpool.

Pedro não é jogador para abafa, desespero, bolas cruzadas para área em busca de um grandalhão que empurre a bola para a rede e desafogue o time. Tem muito mais qualidade do que isso. Sabe jogar para ele e para o time. É diferente. São três gols e uma assistência em quatro jogos (53 minutos) no Flamengo. Em tese, era o nome da vez para substituir Gabriel Barbosa. No entanto, a hierarquia pesou. Diego não conseguiu ajudar a cadenciar o jogo e muito menos tornou o time mais agressivo na linha de frente, atrás e, às vezes, ao lado de Bruno Henrique no ataque rubro-negro. Cabe dizer que Jorge Jesus avisou que ouviria a fisiologia. Há relatos de quem estava em Quito que Pedro sentiu demais a altitude de 2.850m.

Por mais que soe provocação, Vanderlei Luxemburgo está certo. A fórmula de Jorge Jesus não será mais surpresa nesta temporada. Alguns adversários começaram a decifrá-lo no fim do ano passado. O próprio Luxemburgo no histórico 4 x 4 entre Flamengo e Vasco. Argel Fucks (CSA) e Adílson Batista (Ceará) peitaram a equipe rubro-negra dentro do Maracanã. Jorge Sampaoli goleou os campeões brasileiros por 4 x 0 na Vila Belmiro na última rodada. Até o fantástico Barcelona da era Guardiola foi decodificado e superado pela Internazionale de José Mourinho nas semifinais da Champions League de 2010. O futebol pós-moderno  mais reinvenção e menos aprisionamento ao que está ou vem dando certo.

Altitude à parte, o Independiente Del Valle deu seu recado no empate por 2 x 2, em Quito. Jorge Jesus definiu o time equatoriano campeão da Copa Sul-Americana como “impressionante”. Não é de hoje, Mister. De vez em quando, é bom descer do salto e olhar com lupa o que acontece deste lado do Oceano Atlântico. O Independiente Del Valle foi finalista da Libertadores em 2016. Desbancou River Plate, Pumas e Boca Juniors no caminho até a derrota para o Atlético Nacional da Colômbia na final.

O Independiente Del Valle provou mais de uma vez que não teme camisa pesada nem estádio lotado por fanáticos. Na campanha da Sul-Americana, eliminou os gigantes Independiente da Argentina e Corinthians no mata-mata antes de superar o Colón na final. Portanto, Jorge Jesus tem duas escolhas para o duelo de volta na quarta-feira: manter-se apegado à hierarquia do ano passado ou reinventar o Flamengo para evitar surpresas (desagradáveis) no Maracanã.

Banco de reservas é para ser utilizado, como ele fez muito bem no segundo tempo com as entradas de Vitinho e Pedro. É preciso acelerar as inserções de Pedro Rocha, Michael e Thiago Maia no sistema de jogo. Afinal, o calendário brasileiro e sul-americano não dá muito tempo para pensar. Como dizia um velho slogan de virada de ano da tevê Globo, tente, invente, faça um Flamengo diferente em 2020, mister Jorge Jesus. Para melhor, claro.

 

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