Patrocinio Gama registrou deficit de R$ 980 mil; Brasiliense ainda não divulgou balanço. Fotos: Bárbara Cabral e Ed Alves Gama registrou deficit de R$ 980 mil; Brasiliense ainda não divulgou balanço. Fotos: Bárbara Cabral e Ed Alves

Saiba quantos times do Candangão divulgaram o balanço financeiro. Levantamento ajuda a entender por que é mais seguro patrocinar o Flamengo do que alavancar um clube do Distrito Federal

Publicado em Esporte

Quer entender a razão pela qual o futebol do Distrito Federal está atolado desde 2014 na Série D, a última divisão do futebol do país? Por que a Federação de Futebol do Distrito Federal ocupa o 21°lugar no ranking nacional da CBF, à frente apenas de Mato Grosso do Sul, Espírito Santo, Tocantins, Rondônia, Amapá e Roraima? O motivo de a capital ter apenas seis times no ranking de mais de 200 equipes do país, o melhor deles na 94ª colocação? Vai um pouco além do futebol…

O argumento dos clubes quase sempre é o mesmo: falta de apoio financeiro do Governo do Distrito Federal e/ou do Banco de Brasília, o popular BRB. Dificilmente algum dirigente será sincero e colocará o dedo na própria ferida para assumir que também falta transparência, credibilidade corporativa. Ajuda pública e privada existem. São pequenas, claro, mas quando não se consegue prestar conta de “centavos” e terceirizaa-se a culpa, torna-se inviável reivindicar “milhões”.

A FFDF responde por processos de gestões marcadas por falta de prestação de contas de verbas repassadas pelo GDF no início do século na gestão de Joaquim Roriz, que morreu em setembro de 2018. O montante foi, ou ao menos deveria ter sido dividido igualitariamente entre a entidade e times do Candangão. A FFDF tem o repasse mensal da CBF diminuído por conta de empréstimos que não foram pagos por um filiado à entidade máxima do futebol brasileiro. A falta de credibilidade nas finanças cobra caro, e é comprovada pelo desleixo no cumprimento da divulgação do balanço financeiro anual previsto em lei.

Os times de futebol do DF reclamam da badalada parceria do Banco de Brasília com o Flamengo, oficializada em 19 de junho pelo clube carioca e a instituição financeira, mas comportam-se administrativamente pior do que equipes amadoras. Enquanto o time carioca divulgou o demonstrativo em dia, levantamento do blog apurou que, dos 12 clubes da primeira divisão da capital do país em 2020, dois publicaram o balanço financeiro referente ao exercício de 2019, como prevê a Lei Pelé. Este blogueiro solicita o demonstrativo há um mês aos 12 dirigentes. Virou aquela brincadeira cujo bordão é “não tá comigo”. Muito jogo de empurra, descaso, falta de comprometimento. Enfim, o reflexo da triste realidade do futebol local.

Apesar da falta de transparência de times que até continuam recebendo dinheiro público, o BRB acenou, em reunião realizada na quinta-feira (25), com a possibilidade de investir um pouco mais nas equipes de Brasília. A iniciativa é interessante. No entanto, em alguns casos, uma graça imerecida. De nada adiantará turbinar o porquinho se os clubes não forem reeducados, submetidos a controles rígidos quanto ao uso do repasse de qualquer investimento público ou privado.

Até agora, o Gama publicou o balanço no site. O Capital encaminhou o documento. E os outros 10? Há um repertório vasto de desculpas. Alguns dão de ombros. Outros se escoraram na pandemia do novo coronavírus para alegar impossibilidade de manter contato com o contador e que, consequentemente, não houve tempo para reunir o conselho para aprovação das finanças. Contraditoriamente, alguns tiveram tempo (de sobra) para se reunir mais de uma vez por videoconferência para deliberar sobre a tentativa de retomada forçada do Candangão em meio à crise sanitária.

 

Apenas dois clubes divulgaram balanço financeiro até a publicação deste post. Ambos registraram deficit: o Gama fechou 2019 no vermelho em R$ 980.609,71; e o Capital em R$ 1.267.894,02.

 

Há quem desconheça a regra. Quem usa a desculpa de estar dentro no prazo flexibilizado pelo Congresso Nacional devido aos efeitos da covid-19 para empurrar a prestação de contas com a barriga. Aprovada na Câmara, a ampliação do prazo para apresentação e publicação das demonstrações financeiras ainda não é lei (aguarda análise do Senado Federal e sanção posterior).  Vários clubes não divulgam o balanço há anos no site oficial e muito menos encaminham o documento à Federação de Futebol do Distrito Federa, entidade responsável por cobrar e fazer esse tipo de controle.

Há time que não está nem aí, mas, mesmo assim, continua recebendo patrocínio de empresa pública. Por sinal, cinco são apoiados pelo BRB nesta temporada – Capital, Taguatinga, Paranoá, Luziânia e Unaí, ex-Paracatu. Ganham R$ 6 mil por jogo. Os outros sete se negaram a aderir. Alguns sob protesto, por considerar a verba irrisória. Ironizam até. Alguns chegaram a usar a expressão “merreca” para justificar o desdém. Existe, ainda, a turma do gerúndio. Os cartolas que dizem assim: “Estou enviando, providenciando, publicando, fazendo…”. No entanto, o documento nunca chega ao destino prometido. O blog continua esperando e atualizará o post quando o documento for enviado, como fizeram Gama e Capital até a publicação deste post.

Para se ter uma ideia da falta dos efeitos causados pela falta de transparência no futebol do DF, uma empresa privada de Tecnologia da Informação com sede na cidade anunciou na camisa do Vasco na final da Copa São Paulo de Futebol Júnior do ano passado contra o São Paulo, mas passou longe do Candangão. O blog contou a história à época. Portanto, acordem. Acordem. Gestões amadoras não são levadas a sério.

Desleixo e desordem à parte, vale lembrar o que diz o artigo 46-A da Lei Pelé:

As ligas desportivas, as entidades de administração de desporto e as de prática desportiva envolvidas em qualquer competição de atletas profissionais, independentemente da forma jurídica adotada, ficam obrigadas a: elaborar suas demonstrações financeiras, separadamente por atividade econômica, de modo distinto das atividades recreativas e sociais, nos termos da lei e de acordo com os padrões e critérios estabelecidos pelo Conselho Federal de Contabilidade, e, após terem sido submetidas a auditoria independente, providenciar sua publicação, até o último dia útil do mês de abril do ano subsequente, por período não inferior a 3 (três) meses, em sítio eletrônico próprio e da respectiva entidade de administração ou liga desportiva.

Especialista em direito desportivo, o advogado Maurício Corrêa da Veiga alerta: “A Lei Pelé determina que todos os clubes, sem distinção em razão de sua constituição (associações, empresas limitadas, sociedades anônimas e outras), devem publicar sua demonstração financeira em seus sítios eletrônicos até o último dia de abril do ano subsequente ao exercício. A não observância desta obrigação poderá acarretar na inelegibilidade do presidente do clube durante cinco anos para cargos em entidades desportivas. A publicação do balanço financeiro também é determinada pelo Profut, programa de refinanciamento de dívidas que a maioria dos clubes aderiu”, interpreta o sócio do Corrêa da Veiga Advogados.

Responsável por administrar e cobrar transparência dos seus filiados, a Federação de Futebol do Distrito Federal deu exemplo: publicou o balanço no site da entidade. Até falamos recentemente sobre o resultado. Menção honrosa também a um clube que nem pertence à elite, mas enviou o documento à entidade – o Samambaense. A seguir, saiba, por ordem de classificação na primeira fase do Candangão, o que os demais informaram no contato iniciado pelo blog em 30 de maio.

 


O que os 12 clubes da primeira divisão do DF dizem sobre a publicação do balanço financeiro referente ao exercício de 2019


Gama

O balanço financeiro referente ao exercício 2019 está publicado na abra transparência do site do clube e aponta deficit de R$ 980.609,71 no período. O portal também disponibiliza outros 11 demonstrativos desde 2008. O clube recebe recursos do governo federal como a Timemania. No ano passado, o clube recebeu pouco mais de R$ 639 mil por participar da loteria. Uma receita interessante do clube foi a participação nas transferências do volante Sandro, ex-Inter, Tottenham, Queens Park Rangers, Udinese e medalha de prata com a Seleção nos Jogos Olímpicos de Londres-2012. O jogador que atualmente defende o Goiás rendeu R$ 63.574,37 ao Gama via mecanismo de solidariedade.


Brasiliense

O clube informou ao blog que o prazo não expirou com base no PL 1.013/2020 votado pela Câmara dos Deputados que aprovou ampliação, por sete meses, do prazo para apresentação e publicação das demonstrações financeiras. A ampliação ainda não é lei (aguarda análise do Senado Federal e sanção posterior). Questionada sobre a localização dos resultados de anos anteriores no site do clube, a agremiação informou que verificaria o que foi feito nas edições anteriores e retornaria. Assim como o Gama, o Brasiliense integra a Timemania. O blog continua aguardando o demonstrativo e divulgará o resultado assim que tiver acesso ao documento.


Real Brasília

O clube informou que não costuma ser publicado sob o argumento de não ser uma S/A. O texto da Lei Pelé fala “independentemente da forma jurídica adotada”. Mesmo assim, a diretoria comprometeu-se a checar com o contador, mas ainda não divulgou o balanço. O blog aguarda demonstrativo e divulgará o resultado quando recebê-lo.


Formosa

Consultado em 30 de maio, o clube informou que o balanço financeiro referente a 2019 seria divulgado em 15 dias. Ainda não há nada publicado na aba transparência do time do Entorno. O blog aguarda demonstrativo e divulgará o resultado quando recebê-lo.


Taguatinga

Não publicou nem respondeu ao blog. É um dos clubes patrocinados pelo BRB nesta edição do Candangão. Aguardamos e divulgaremos o resultado quando recebê-lo.


Capital  

O clube enviou o balanço financeiro e registra deficit de R$ 1.267.894,02 no exercício de 2019. É um dos clubes patrocinados pelo BRB nesta edição do Candangão. Transparente, o clube informa que recebeu R$ 65.450 do banco na edição anterior, quando o clube terminou o Candangão em terceiro lugar, e R$ 40.809,16 da tevê Globo pelos direitos de transmissão da edição passada da competição.


Luziânia

É o caso mais crítico de completa desorganização administrativa. A atual diretoria diz que não recebeu documento da anterior. Há registro apenas dos jogos realizados no Serra do Lago, que deram prejuízo em torno de R$ 25 mil. O clube é alvo de investigação do Ministério Público por possível uso irregular de recursos públicos e tem recursos bloqueados. É patrocinado pelo BRB. Aguardamos o demonstrativo e divulgaremos o resultado do período quando recebê-lo.


Sobradinho

Ninguém sabe ninguém viu. Além de não ter publicado, há jogo de empurra. A empresa terceirizada que assumiu o clube alega ter iniciado o trabalho em 2020, logo, o que ficou para trás não é com ela. Sendo assim, pediu que entrássemos em contato com um outro dirigente que informou não ter o documento e recomendou que entrasse em contato com um outro, que não respondeu até hoje ao pedido. O blog continua aguardando.


Unaí

A diretoria informou, em 30 de maio, que não estava pronto e cobraria. O blog aguarda. É um dos clubes patrocinados pelo BRB nesta edição do Candangão.


Ceilândia

O clube alega que, devido à pandemia, a prestação de contas e a assembleia de aprovação do resultado de 2019 foi prorrogada para setembro. Diante disso, não publicou. Aguardamos e divulgaremos o resultado quando recebê-lo.


Ceilandense

O clube foi questionado em 30 de maio, mas não respondeu. Aguardamos e divulgaremos o resultado quando recebê-lo.


Paranoá

A diretoria informou que veria com o contador. Alega que, como o clube jogou na segunda divisão no ano passado e não teve receita de patrocínio, o clube não se preocupou. Aguardamos e divulgaremos o resultado quando recebê-lo.


 

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