Tupã é inocente

Publicado em português

Há algo tão certo quanto o suceder dos dias e das noites, das estações do ano e das fases da Lua? Há. As chuvas de verão estão escritas nas estrelas deste país tropical. Não por acaso os povos primitivos têm deuses dos ventos, dos furacões, das tempestades. Sem ciência para explicar os fenômenos, eles apelavam para o sobrenatural. Punham na conta de Tupã a responsabilidade pela violência das forças brutas da natureza.

Os tempos mudaram. O conhecimento avançou. A tecnologia responde aos mais sofisticados desafios. Apesar do progresso, porém, governantes reprisam o velho comportamento dos pajés. Atribuem a culpa da tragédia das chuvas às mudanças climáticas.

Com a estratégia, lavam as mãos. Quando as águas despencam, revivem velho espetáculo que, de tão repetido, se tornou o normal das grandes cidades: mata gente, alaga ruas, destrói pontes, desaloja moradores, desabriga famílias, fecha escolas, prejudica as atividades econômicas.

Gastam-se milhões em band-aids para conter hemorragias. A pausa é temporária. No ano seguinte, o enredo se repete e causa a mesma “surpresa”. Passou da hora de conjugar o verbo assumir: o inferno não é Tupã nem é Zeus. São os governantes que, independentemente da experiência ou da cor política, pouco ou nada fazem para evitar as catástrofes.

Impõem-se medidas de curto, médio e longo prazo. Urbes brasileiras nasceram sob o signo da improvisação e cresceram horizontalmente. Subiram morros e encostas. Represaram rios. Passaram o trator sobre a vegetação. Resultado: asfalto e cimento roubaram o espaço de escoamento da água. Há que remediar para prevenir o horror do verão.

Mesmo as planejadas como Belo Horizonte e Brasília, pagam o preço da negligência. Apesar da realidade, novas obras são autorizadas sem os critérios ambientais. Pior: fecham-se os olhos para construções irregulares que, sem alvará, são palco de tragédias anunciadas. Os governantes, em vez de olhar para o céu, devem olhar para as moradias, o saneamento e a limpeza urbana. A resposta não está nas estrelas. Está no chão.

(Editorial do Correio Braziliense de hoje)