Hífen: os iguais se rejeitam

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Situações constrangedoras? Há muitas. Uma delas: bancar o par de vasos. Imagine a cena. Socialite chega majestosa à festa. Cabeça erguida, ombros eretos, barriga chupada, bumbum encaixado, chama a atenção de homens, mulheres, gays, lésbicas e simpatizantes. Ninguém resiste ao ímã. Os sentimentos variam. Alguns se excitam. Outros reverenciam a aparição. Há os que experimentam o gostinho da inveja. Não faltam os que bancam a raposa do La Fontaine. Sem poder alcançar as uvas, a faminta as desdenhou. Disse que estavam verdes.

De repente, não mais que de repente, a elegante se vê diante de um clone. Outra convidada veste roupa igualzinha à dela – modelito Channel, na mesma cor, mesmo tecido, mesmos dourados. Nada mole, convenhamos. O que fazer? Os manuais de boas maneiras ensinam: “Mostre-se simpática e jovial. Faça um comentário leve do tipo “que ótimo termos o mesmo bom gosto”. Depois, mude de roda.

A história se repete na língua. No universo dos prefixos, os iguais se rejeitam. Quando duas letras iguais se encontram, ops! Pinta o constrangimento. A saída é uma só. Chamar o hífen e deixar uma lá e outra cá. Assim: contraataque, antiinflamatório, semiirregular, miniinternato, autoobservação, microondas, hiperrico, interracial, subbloco, superromântico.

Olho vivo! A Constituição diz que todos são iguais perante a lei. Mas sabemos que existem os mais iguais e os menos iguais. Na ortografia também ocorre essa discriminação. O sub- pertence ao time maioral. Além do b, rejeita o r. Por quê? Com o hífen, dá um recado aos falantes. O r não forma encontro consonantal como em abraço. Deve ser pronunciado (sub-raça, sub-região, sub-rogar).

Os pequeninos co-, re-, pre- e pro se juntam ao segundo elemento mesmo quando ele acaba com a mesma letra: coordenar, coobrigação, reeleição, preencher, proótico (e derivados).