O que é abusivo diante da alta de preços gerada pela greve dos caminhoneiros?

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Movimento de paralisação começou há duas semanas e os preços se elevaram diante da escassez dos produtos, em especial, o gás e a gasolina

Por Érika Manhatys*

combustível

A alta tributação sobre o óleo diesel e a falta de regulação no valor dos fretes foram o estopim da greve decretada pelos caminhoneiros há duas semanas. A paralisação provocou o desabastecimento e encareceu os produtos que escassearam nas prateleiras. Apesar de ter afetado a precificação de inúmeros itens, a alta mais significativa ocorreu no combustível e no gás de cozinha. O segundo, de acordo com apuração feita pelo Correio, chegou a ter aumento de até 100%. Ou seja, o botijão de gás foi vendido pelo dobro do preço chegando a ser comercializado a R$ 200, sete dias após o início das manifestações.

A gasolina também teve majoração repentina, literalmente da noite para o dia. Segundo levantamento do Instituto de Defesa do Consumidor (Procon), realizado nos pontos de venda de combustível do Distrito Federal, nove foram autuados e um foi multado por comercializar a gasolina por R$ 5,99. Fotos de postos cobrando até R$ 9,99 por litro circularam em grupos de aplicativos de mensagem instantânea, mas o valor não foi constatado pela operação conjunta entre Procon e Polícia Civil, representada pela Coordenação de Repressão aos Crimes Contra o Consumidor, a Ordem Tributária e a Fraude (Corf).

 

O posto de Taguatinga Sul que recebeu multa de R$ 294 mil como sanção à prática abusiva, também apresentava outra irregularidade, a dupla precificação para um produto. Era cobrado R$ 4,70 durante o dia e R$ 5,99, à noite. Para o Procon, o comerciante cometeu oportunismo de ocasião, uma vez que o aumento não teve motivo justo e, segundo informações recebidas pelo órgão, a alteração no preço foi sendo testada pelo proprietário, que, recebendo um grande número de clientes, foi elevando o valor até chegar a quase R$ 10, retornando ao custo original quando desconfiou da fiscalização.

 

A designação de preços diferentes para o mesmo produto é condenada pelo Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 6°, que trata dos direitos básicos do consumidor, sobretudo no inciso que obriga o comerciante a evitar dúvidas em seu cliente. “A informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem”, destaca o texto.

 

Um estabelecimento que aumenta sobremaneira o valor de seus produtos pode incorrer em crime contra a economia popular e as relações de consumo, de acordo com o diretor da Divisão de Direito do Consumidor da Polícia Civil, Fábio Rodrigues Vieira. Além dos órgãos de defesa do consumidor, as promotorias de Justiça de Águas Claras e de Santa Maria estão atuando na fiscalização de postos de combustível das duas cidades, a fim de reprimir infrações cometidas pelos proprietários; os relatórios gerados serão encaminhados ao Procon e ao Ministério Público do Distrito Federal do DF (MPDFT).

 

Escassez

 

Os motoristas brasilienses se depararam com uma situação nova na capital, a escassez. Além de pagar caro pelo litro da gasolina, tiveram de enfrentar filas gigantescas nos postos de combustível. Vinícius Vivas, 51 anos, diretor comercial de uma empresa de tecnologia, foi um dos consumidores que amargaram longas horas em filas em busca de gasolina. “Eu esperei por quase duas horas em um posto localizado no Cruzeiro, quando estava próximo às bombas, uma atendente informou que a gasolina não atenderia a todos. Nesse momento, um senhor que estava à minha frente recebeu uma ligação informando que no SIA, havia. Fui até lá e esperei por mais de três horas para conseguir abastecer a R$ 5. Fiquei praticamente sete horas à espera de atendimento”, lamentou.

 

Ele precisou adotar medidas para economizar durante os dias de escassez. “Usei o carro só para ir ao trabalho e tive que reprogramar minhas atividades para conseguir fazer a pé. Em vez de ir ao Parque da Cidade com meu filho, vou ao Parque de Águas Claras ,que fica próximo à minha casa. Também deixei de frequentar festas, churrascos ou comemorações com os amigos”, disse.

 

Consequências

A greve trouxe prejuízo a diversos setores que compõem a economia e o mercado brasileiro. Somente no setor produtivo, está orçada uma perda de R$ 6,6 bilhões, segundo estudo da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). A cifra corresponde ao faturamento bruto na produção primária, desconsiderando o processamento e as indústrias. Em larga escala, vai gerar graves consequências à economia nacional.

 

O professor de economia da Universidade de Brasília (UnB) Roberto Bocaccio Piscitelli explicou que uma paralisação de grandes proporções, como a dos caminhoneiros, afeta a globalidade econômica. “Com toda certeza, terá queda no PIB do trimestre, a arrecadação cai e ocorre mais pressão no orçamento. É algo que afeta as finanças do país e a cada um de nós individualmente, por diversos fatores, inclusive o aumento da inflação, que será sentido em breve no bolso do consumidor. A escassez de produtos faz o preço aumentar e vira objeto de especulação”, reflete.

 

Para ele, outras questões também devem ser consideradas, além dos efeitos negativos no mercado brasileiro interno e externo, os casos de abuso nas relações comerciais trazem imensos prejuízos. “Há abuso na cobrança elevada, outro na adulteração dos produtos. Estamos vendo donos de postos inescrupulosos que misturam uma série de químicos no combustível para ter mais volume e atender a um número maior de clientes. Se formos comparar os valores anteriormente exercidos e os atuais, veremos uma grande discrepância. Na minha opinião, esses estabelecimentos deveriam ser lacrados e os proprietários, sofrerem sanções mais sérias”, ressalta.

 

Proteção

 

Durante a paralisação, uma imagem ganhou grande repercussão após circular em grupos do WhatsApp. Nela, um conhecido mercado instalou placa na entrada do estabelecimento restringindo a quantidade de itens por produto. A justificativa era resguardar o acesso a uma maior quantidade de consumidores. A legislação não permite a prática, conforme explica o professor Fabrício Dias Rodrigues, mestre em direito das relações econômico empresariais da Universidade Católica de Brasília (UCB). “É possível restringir quando houver justo motivo. A legislação defende que o consumidor disposto a pagar em moeda corrente e tendo a oferta do produto, a venda deve ser concretizada. Entretanto, em situações específicas que apresentem uma motivação coerente, o fornecedor pode limitar para privilegiar o coletivo”, afirma. O professor esclarece que o Código de Defesa do Consumidor (CDC) utiliza a técnica legislativa de normas vetor, que não enumeram situações, mas sim parâmetros, como neste caso de controle da compra.

 

Em situações de preços excessivamente caros, o especialista aconselha as pessoas a procurarem os órgãos de defesa. “O consumidor pode denunciar a prática a qualquer momento, mesmo que ele tenha adquirido o bem ou serviço. O cliente pode recorrer às delegacias de polícia e ao Procon que representam a via administrativa”. Rodrigues aponta que a adoção de preço abusivo sem justa motivação pode ser considerada um vício no produto e que, a depender da situação, o consumidor poderá fazer usufruto de reembolso. Entretanto, o professor esclarece que o caso do combustível segue um rito diferenciado de precificação e as oscilações são praticamente diárias.

 

“O Brasil está na contramão mundial de sistema de cálculo da gasolina. Ele fica atrelado ao dólar e sofre alterações diárias no preço que chega ao consumidor final. O cenário de crise é consequência a dessa política doentia de regulamentação do valor dos combustíveis que gera instabilidade, pois quase todos os outros setores dependem do transporte rodoviário”, comenta Fabrício. De toda forma, mesmo que as oscilações sejam constantes, uma alta repentina como ocorreu em Brasília, pode ser questionada pelos consumidores e, caso seja comprovada a prática ilícita, o estabelecimento sofrerá sanções administrativas como multa, podendo ainda responder na Justiça pelo crime.

 

*Estagiária sob supervisão de Margareth Lourenço (Especial para o Correio)

Pousos e decolagens no aeroporto de Brasília estão restritos

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 Apenas aviões sem necessidade de abastecimento em Brasília poderão pousar no terminal

 

Credito: Minervino Junior/CB/D.A. Press
Credito: Minervino Junior/CB/D.A. Press

A Inframerica, administradora do Aeroporto Internacional Juscelino Kubitschek, comunicou que o terminal vai autorizar o pouso apenas dos aviões sem necessidade de abastecimento em Brasília. A concessionária informou que o combustível para a aviação é insuficiente para a manutenção da operação regular do terminal.

Desde o período da manhã, a concessionária havia avisado que só teria combustível estocado para as operações até o fim da tarde desta quarta-feira (23/5). A carga de querosene para abastecer as aeronaves está retida no Entorno do DF por conta do protesto dos caminhoneiros. O aeroporto de Brasília é o terceiro maior do país e o principal hub nacional.

 

A concessionária informou que “é fundamental a liberação dos caminhões para normalizar o atendimento no aeródromo” e que, até às 17h, não havia registro de atrasos ou cancelamentos relacionados à restrição de combustível.

 

De acordo com a Inframerica, a decisão foi tomada em conjunto com as companhias aéreas, empresas de fornecimento de combustível e órgãos responsáveis durante reunião convocada pela Inframerica na tarde desta quarta-feira. A empresa pede ainda que os passageiros procurem as companhias aéreas para informações sobre a situação dos voos.