Código de Defesa do Consumidor completa 25 anos entre vitórias e desafios

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Hábitos como o de trocar um produto com defeito, olhar a data de validade no rótulo de um alimento e comprar com nota fiscal são comuns no dia a dia do consumidor brasileiro. Mas o que parece tão presente no cotidiano das relações de consumo é uma conquista recente, fruto do nascimento de uma das mais modernas legislações brasileiras, o Código de Defesa do Consumidor (CDC). Exemplo de eficiência em outros países e bem incorporada pelo consumidor brasileiro, a lei de defesa comemora 25 anos em 2015 e, o Correio aproveita a data para publicar, a partir desta segunda (17/8), uma série de reportagens mostrando a história da lei, a recepção do brasileiro, o que deu certo e o que precisa melhorar e os desafios para o futuro.

Em 25 anos, a legislação consumerista se consolidou como uma das que o brasileiro mais conhece e usa. Segundo pesquisa do Data Senado, o CDC é a segunda lei na qual a população mais se beneficia no dia a dia, perdendo apenas para o seguro-desemprego. No levantamento feito em 81 municípios, 46% dos entrevistados afirmaram que já tinha usado a norma em uma situação particular ou que conhecia algum beneficiado. 

A proteção de defesa do consumidor ganhou tal proporção no Brasil que, em média, 5,2 mil consumidores são atendidos nos Procons diariamente. Somente nos últimos cinco anos, mais de 9,5 milhões de brasileiros recorreram a um órgãos de defesa. Um reflexo não só da procura do brasileiro por seus direitos, como também do crescimento da rede de atendimento pelo país. “Nesses 25 anos conseguimos bons resultados: o empoderamento do brasileiro com o Código, a criação de um plano nacional, a melhoria nos índices de resolutividade das empresas. Ainda há muito o que fazer. Mas estou otimista com os próximos 25”, analisa Juliana Pereira, líder da Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), do Ministério da Justiça.

   

O motorista Roberto Carlos Silva Araújo Lima, 49 anos, se declara um consumidor ativo. Ele conta que há 15 anos passou a exercer o seu direito com mais frequência e, em caso de problemas, ele não hesita em procurar a empresa e instâncias como o Procon e o Judiciário. “Eu entendi que quando eu reclamo não estou pedindo um favor. É o meu direito”, explica. Para ele, é um absurdo que empresas ainda cometam práticas abusivas mesmo após 25 anos de existência do CDC, como venda casada, ausência de nota fiscal e dificuldade na troca de produtos com defeito. “Tem consumidor que tem medo e vergonha de correr atrás do seu direito. Se todo mundo abrisse a boca, as lojas iam pensar duas vezes antes de descumprir as leis”. 
Oposição 
Até se consolidar como lei, o CDC enfrentou muitos obstáculos, principalmente para conseguir entrar em vigor. Embora tenha sido aprovado no dia 11 de setembro de 1990, a legislação passou a valer efetivamente em março de 1991. Reportagens da época (veja fac-símile abaixo) mostram que os setores produtivos, em especial a indústria, o varejo e os bancos, faziam duras críticas e oposições ao Código. Os argumentos eram de que a legislação era “policialesca” e excessivamente punitiva. “Para os empresários, ele (o Código) é o resultado de uma compilação do que existe de mais rigoroso em países do primeiro mundo, tornando-o mais rigoroso dos rigorosos, a ponto de empresas multinacionais estarem receosas com sua implantação e até retardando a vinda de algumas que pretendiam vir para o Brasil”, dizia uma reportagem de 10 de março de 1991, publicada no Correio Braziliense.   

As empresas cogitaram desabastecimento do país e até falência da indústria nacional por causa das exigências do CDC, por isso, a solução do governo foi adiar o início da vigência do Código em 180 dias. Elici Bueno, coordenadora executiva do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), conta que o Código chegou a ser chamado de comunista. “O país passava por uma redemocratização, estava saindo de uma ditadura militar. Muita gente não entendia porque a sociedade civil poderia pedir direitos”, explica. Na época, o Idec foi convidado pelas Nações Unidas para ajudar as diretrizes do Código. “A ideia da ONU era estabelecer uma lei de consumo modelo para a América Latina”, comenta. 
O atual governador de São Paulo e autor do projeto do CDC, Geraldo Alckmin, lembra que a lei foi acusada por empresários, entidades e políticos de interferir no livre comércio. “Foi dito até que ele (o CDC) nascia como uma babá para milhões de pessoas. A principal crítica era que seria uma medida indevida do Estado no livre comércio e que as relações deveriam ser reguladas pelas próprias leis de mercado”.