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SENTAR-SE À JANELA DO AVIÃO

Publicado em Filosofia, Psicologia

Mais uma contribuição de ADRIANA ZILLER, para reflexão, para uma profunda reflexão.

SENTAR-SE À JANELA DO AVIÃO

Texto atribuído a Alexandre Garcia

 
Era criança quando, pela primeira vez, entrei em um avião. A ansiedade de voar era enorme.
 
Eu queria me sentar ao lado da janela de qualquer jeito, acompanhar o voo desde o primeiro momento e sentir o avião correndo na pista cada vez mais rápido até a decolagem.
 
Ao olhar pela janela via, sem palavras, o avião rompendo as nuvens, chegando ao céu azul. Tudo era novidade e fantasia.
 
Cresci, me formei, e comecei a trabalhar. No meu trabalho, desde o início, voar era uma necessidade constante.
 
As reuniões em outras cidades e a correria me obrigavam, às vezes, a estar em dois lugares num mesmo dia.
 
No início pedia sempre poltronas ao lado da janela, e, ainda com olhos de menino, fitava as nuvens, curtia a viagem, e nem me incomodava de esperar um pouco mais para sair do avião, pegar a bagagem, coisa e tal.
 
O tempo foi passando, a correria aumentando, e já não fazia questão de me sentar à janela, nem mesmo de ver as nuvens, o sol, as cidades abaixo, o mar ou qualquer paisagem que fosse.
 
Perdi o encanto. Pensava somente em chegar e sair, me acomodar rápido e sair rápido.
 
As poltronas do corredor agora eram exigência .. Mais fáceis para sair sem ter que esperar ninguém, sempre e sempre preocupado com a hora, com o compromisso, com tudo, menos com a viagem, com a paisagem, comigo mesmo.
 
Por um desses maravilhosos ‘acasos’ do destino, estava eu louco para voltar de São Paulo numa tarde chuvosa, precisando chegar em Curitiba o mais rápido possível.
 
O voo estava lotado e o único lugar disponível era uma janela, na última poltrona.
 
Sem pensar concordei de imediato, peguei meu bilhete e fui para o embarque.
 
Embarquei no avião, me acomodei na poltrona indicada: a janela. Janela que há muito eu não via, ou melhor, pela qual já não me preocupava em olhar.
 
E, num rompante, assim que o avião decolou, lembrei-me da primeira vez que voara.
 
Senti novamente e estranhamente aquela ansiedade, aquele frio na barriga. Olhava o avião rompendo as nuvens escuras até que, tendo passado pela chuva, apareceu o céu.
 
Era de um azul tão lindo como jamais tinha visto. E também o sol, que brilhava como se tivesse acabado de nascer.
 
Naquele instante, em que voltei a ser criança, percebi que estava deixando de viver um pouco a cada viagem em que desprezava aquela vista.
 
Pensei comigo mesmo: será que em relação às outras coisas da minha vida eu também não havia deixado de me sentar à janela, como, por exemplo, olhar pela janela das minhas amizades, do meu casamento, do meu trabalho e convívio pessoal?
 
Creio que aos poucos, e mesmo sem perceber, deixamos de olhar pela janela da nossa vida.
 
A vida também é uma viagem e se não nos sentarmos à janela, perdemos o que há de melhor: as paisagens, que são nossos amores, alegrias, tristezas, enfim, tudo o que nos mantém vivos.
 
Se viajarmos somente na poltrona do corredor, com pressa de chegar, sabe-se lá aonde, perderemos a oportunidade de apreciar as belezas que a viagem nos oferece.
 
Se você também está num ritmo acelerado, pedindo sempre poltronas do corredor, para embarcar e desembarcar rápido e ‘ganhar tempo’, pare um pouco e reflita sobre aonde você quer chegar. A aeronave da nossa existência voa célere e a duração da viagem não é anunciada pelo comandante. Não sabemos quanto tempo ainda nos resta. Por essa razão, vale a pena sentar próximo da janela para não perder nenhum detalhe. Afinal, a vida, a felicidade e a paz são caminhos e não destinos.

 

3 thoughts on “SENTAR-SE À JANELA DO AVIÃO

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