Sobre pactos e agressões

Publicado em CB.Poder

LEONARDO CAVALCANTI //

Quem um dia acompanhou movimentos políticos em cidades do interior sabe que há um limite aos ataques políticos. “No Brasil profundo, o candidato entende que, ao fim da campanha, vai encontrar o adversário na padaria, no bar, nas festas de aniversário de crianças. Se o clima na eleição for muito pesado, pode acabar em ressentimentos prolongados, quem sabe até em violência, a depender do grau dos insultos”, disse-me uma vez um experiente político nordestino. Engana-se quem pensa que tal regra valha apenas para eleições menores, do interior do país.
Uma campanha, em vários momentos, é feita pelo não dito, e as cortesias são estratégicas. Assim, episódios recentes da eleição presidencial são reveladores, principalmente com a perspectiva de um segundo turno tão disputado quanto a primeira fase da eleição. Veja, por exemplo, a situação do governador de São Paulo, Márcio França (PSB), que sempre acreditou na retribuição do presidenciável Geraldo Alckmin a toda dedicação e fidelidade ao longo dos anos. França, mesmo com todos os avisos do próprio partido, tinha a ilusão de gesto do tucano em favor da candidatura ao governo de São Paulo. Sim, imaginava dois palanques. Desilusão, danço eu, dança você…
Os próximos movimentos dos tucanos em São Paulo e a ação dos pedetistas — leia-se, o ex-governador cearense Ciro Gomes — darão o tom da desolação de França, um ser vaidoso, principalmente quando a capacidade de montar estratégias políticas é posta em dúvida. Os ataques da equipe e correligionários de João Doria — incluindo o próprio ex-prefeito — e de Alckmin podem levar França, por exemplo, a ser reticente em chancelar, de imediato, um eventual apoio ao presidenciável tucano em caso de segundo turno. Na pior das hipóteses, França cobraria mais caro à adesão pessebista ao tucano, principalmente se for derrotado na corrida no estado.
Um outro caso emblemático foi protagonizado pelo ministro da Secretaria de Governo, Carlos Marun. Incomodado com as negociações de Ciro com o DEM e o PP, o escudeiro de Michel Temer partiu para cima: “Espero que os partidos que apoiem Ciro Gomes deixem o governo. Queira destacar a completa hipocrisia de Ciro, ao buscar partidos do governo. É o querer ganhar de qualquer jeito. A volta da política oportunista”, disse Marun, segundo relatos da colunista de Política do Correio Denise Rothenburg e do repórter Rodolfo Costa.
O que está em jogo não é o ataque de Marun direcionado a Ciro, afinal é improvável uma aliança entre MDB e PDT no segundo turno, pelo menos em condições normais — mas, mesmo assim, não se pode desconsiderar nada na política. A declaração de Marun incomodou mesmo o DEM, deixando exposta a frágil relação da base de Temer. “Eu acredito que o Democratas tenha autonomia e independência para construir a aliança que entender e que é a mais apropriada para as eleições. E o governo toma as decisões que sejam de governo”, respondeu Efraim Filho, líder do DEM.
Por ora, fiquemos com esses dois exemplos. Há outros, que serão elencados aqui ao longo da campanha. Até que ponto poderão inviabilizar alianças de segundo turno — e os tais encontros na padaria e nas festas de criança —, apenas o tempo poderá dizer.

Resposta

Na segunda-feira passada, publiquei o artigo “A solidão de Temer e de tantos outros”. Escrevi que o poder não é algo compartilhado, assim, por óbvio, é apartado, distante, principalmente em meio às crises envolvendo presidentes da República. Dizia que sempre há um preço a ser pago e que ninguém chega ao topo da administração pública impunemente. Citava a solidão de Getúlio — neste caso, com base nas informações contidas na trilogia do escritor cearense Lira Neto —, de Fernando Henrique Cardoso, de Luiz Inácio Lula da Silva, de Dilma Rousseff e, por fim, de Michel Temer. Na terça-feira, uma carta assinada por Temer chegou às minhas mãos. A seguir, a resposta do presidente, na íntegra:

“Prezado Leonardo Cavalcanti,

Que bom seria se fosse verdadeira a solidão a que você se refere no artigo em que trata dos presidentes da República. No meu caso, você sabe que eu anseio por ‘solidão’ que não consigo obter. Durante a semana são dezenas de conversas, despachos, reuniões e eventos. No final de semana (em pequeno período naturalmente), a solidão fica só no meu desejo e no seu artigo. São reuniões e mais reuniões no Jaburu e no Alvorada. Telefonemas os mais diversos, com os mais variados problemas. De modo que a solidão que tanto almejo, não alcanço.

Cumprimentos do

Michel Temer”

 

Leia a coluna Entrelinhas da semana passada