Coluna Eixo Capital/Por Ana Maria Campos
À QUEIMA-ROUPA
Deputado distrital Fábio Félix (PSol), presidente da Comissão de Direitos Humanos, Ética e Decoro Parlamentar da Câmara Legislativa
O governo tem pesquisas que indicam a aceitação da comunidade à gestão compartilhada das escolas com a PM. Por que você é contra?
O que o Governo do Distrito Federal está vendendo para a população do DF é uma ficção. As escolas públicas militarizadas nem de longe se assemelham aos colégios do Exército, dos Bombeiros e da própria PM. Assim como diversos especialistas em educação e em segurança pública que já se posicionaram contrários à militarização, não concordo com esse modelo porque ele não traz soluções efetivas para os problemas que tenta atacar: segurança e melhoria da educação. Fortalecer o batalhão escolar e nomear profissionais qualificados para atuação no espaço escolar são soluções muito mais efetivas.
O senador Cristovam Buarque, especialista em educação, avalia que o problema seria os policiais militares se envolverem nas questões pedagógicas e no conteúdo escolar, mas em alguns locais a autoridade pode impor uma necessária disciplina. Qual é a sua opinião?
Claro que é inadmissível que policiais não preparados para atuação pedagógica assumam essa função. Mas esse não é o único problema da presença de policiais militares dentro das escolas. A nossa principal preocupação, neste momento, é com o preparo dos profissionais que estão sendo designados para as escolas. Já recebemos denúncias de policiais que nem queriam estar nessa função. Eles não passaram por qualquer formação para atuar no ambiente escolar. As consequências disso são graves como as recentes denúncias de excesso de força e até mesmo assédio sexual nessas escolas. Mesmo para uma função disciplinar é necessário que haja uma formação diferente para os policiais lidarem com crianças e com adolescentes.
Como evitar que alunos agridam professores em sala de aula, a ponto de alguns docentes estarem com medo e doentes por terem de enfrentar o risco?
A escola reflete contextos comunitários e sociais. Estamos falando de comunidades com uma série de problemas graves como exclusão social, violência familiar, falta de acesso às políticas públicas. O DF tem profissionais preparados para atuar com esses problemas que acabam se tornando conflitos dentro da escola: em vez de policiais armados e disputando espaço com os professores, o GDF deveria contratar orientadores educacionais, psicólogos e assistentes sociais, que são os profissionais qualificados para lidar com situações dessa natureza.
Escolas militarizadas, como o Colégio Militar de Brasília, oferecem ensino de qualidade e formam bons alunos. Qual é o impedimento de policiais militares participarem da gestão das escolas públicas?
É importante deixar claro que não existe um projeto pedagógico para as escolas que estão sendo militarizadas. O GDF tomou essa decisão de forma acelerada e sem respaldo técnico algum. Outra coisa que precisa ser dita: nas unidades como o Colégio Militar de Brasília, filhos de militares têm prioridade na matrícula, existe processo seletivo e são cobradas taxas administrativas, além dos custos com fardamento. Os índices de desempenho educacional de fato sobem, mas porque o perfil socioeconômico da escola muda. A escola pública não pode adotar essa prática, a escola pública tem que ser para todos. É a Constituição quem diz. As experiências dos estados que adotaram um modelo igual ao nosso mostram que os índices educacionais melhoraram com a exclusão dos estudantes mais vulneráveis, o que é um absurdo.
Casos de assédio e confronto entre PMs e alunos são comuns ou exceções?
Infelizmente, não. Nas diligências que fiz nessas escolas militarizadas, junto com a Comissão de Direitos Humanos, ouvi relatos muito preocupantes: assédio moral, racismo, intolerância religiosa, LGBTFobia e até realização de culto religioso dentro da sala de aula são denúncias que nós recebemos e para as quais pedimos explicações do governo. Além disso, muitos alunos contaram que são coagidos com frases como “não tá gostando? Pede pra sair!”. São relatos que comprovam que não existe fiscalização, planejamento e respeito à diversidade nessas escolas.
Falta debate sobre esse tema?
Sem dúvidas! Nas duas vezes em que anunciou a militarização das escolas, o governo Ibaneis o fez no período de férias escolares e sem consulta prévia aos diretores, professores e comunidade escolar. Existe uma Lei de Gestão Democrática e que esse governo não tem respeitado adequadamente. As próprias assembleias são bastante questionáveis. Tivemos casos de escolas com votação anulada de forma unilateral pela Secretaria de Educação. Até hoje, o governo sequer foi capaz de dar transparência aos dados que motivaram essa decisão, se é que eles existem.