Nas entrelinhas: O segundo

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“O principal beneficiado com a saída de Lula até agora é o ex-governador do Ceará Ciro Gomes (PDT)”

O atentado contra o candidato do PSL, Jair Bolsonaro, pode ter consolidado sua liderança nas eleições. Isso não significa, porém, que uma vitória no primeiro turno seja possível. O realinhamento eleitoral em curso, no qual a novidade é a saída efetiva do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva da disputa, mostra que seria derrotado. Embora a sua substituição pelo ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad esteja prevista só para hoje, nas redes sociais a impugnação da candidatura de Lula já estava influenciando o deslocamento dos seus eleitores para Haddad e outras candidaturas. O principal beneficiado com a saída de Lula até agora é o ex-governador do Ceará Ciro Gomes (PDT).

Segundo o analista das redes sociais Sérgio Denicoli, da Big Data AP/Exata, desde maio Bolsonaro liderava as citações no Twitter, seguido de perto por Lula. Com a impugnação, o petista começou a perder terreno e abriu mais espaço para Bolsonaro, que conseguiu cinco vezes mais citações do seu principal adversário nas pesquisas no dia em que foi esfaqueado em Juiz de Fora. Entretanto, quem emergiu nesse processo foi Ciro Gomes e não Haddad. Bolsonaro possui quase três vezes (2,8) mais menções do que o candidato do PDT e três vezes (3,1) mais citações do que o ex-presidente da República. Ciro e Lula se equivalem.

O domínio de Bolsonaro nas mídias digitais e sua forte presença no noticiário em razão do atentado que sofreu, de certa forma, neutralizaram a desvantagem do ex-capitão em termos tempo de propaganda na tevê e no rádio. “O caminho para o PSL já foi mais tortuoso, pois a visibilidade recente tem estimulado a militância e parece desestimular a atuação de uma esquerda difusa e acuada”, conclui Denicoli.

Para ele, “Ciro Gomes se mostra apto a angariar votos úteis dos que rejeitam Bolsonaro”. Surpreende, no monitoramento das redes sociais, o distanciamento de Haddad e Marina Silva. O primeiro “está preso à imagem de Lula, que o deixa sem personalidade própria”; à segunda, falta “fôlego e conteúdos polêmicos para aparecer mais nas conversações on-line”. João Amoêdo, do Novo, também é mais citado do que Haddad. O mesmo vale para o tucano Geraldo Alckmin, que nunca teve uma forte presença nas novas mídias. O candidato do PSDB aposta muito nos programas de tevê e rádio, pois é o que dispõe de mais tempo para isso.

As pesquisas, porém, parecem confirmar a tese de que o peso do programa eleitoral de tevê e rádio se reduziu. “Os únicos eventos de relevo das televisões têm sido os debates e sabatinas, e muito mais pela repercussão deles nas redes do que pelos programas propriamente ditos. Vivemos uma guerra de narrativas on-line e o fato de Bolsonaro dominar os discursos digitais deu a ele a chancela de uma grande liderança, construída, queiram ou não, fora do tradicional ambiente partidário dominado pelas grandes siglas”, conclui Denicoli, com base em amostragem de tweets geo localizados de 145 cidades do país.

Tensão

A consolidação da base eleitoral de Bolsonaro de certa forma foi antecipada — essa tendência já existia —, graças ao atentado que sofreu. A vitimização do ex-capitão, que continua internado no Hospital Israelita Alberto Einstein, conteve a desconstrução de sua candidatura pelos adversários, que ficaram sem saber direito o que fazer, principalmente o candidato do PSDB, Geraldo Alckmin. Entretanto, o tucano inicia uma recuperação em São Paulo, onde está em segundo nas pesquisas. No maior colégio eleitoral do país, porém, Ciro ultrapassou Marina, que é seguida por Haddad. João Amoedo e Meirelles também cresceram.

A pulverização do eleitorado paulista é um fato relevante na eleição, principalmente para o PSDB e o PT, que são os partidos, historicamente, mais fortes no estado. Ninguém ganha eleição no Brasil quando perde no seu próprio estado. Contribui para a fragilização tanto de Alckmin como de Haddad em São Paulo a disputa pelo Palácio dos Bandeirantes, que está sendo liderada pelo candidato do PMDB, Paulo Skaf (MDB), em empate técnico com João Doria (PSDB). Márcio França (PSB), candidato à reeleição, está terceiro, com o ex-prefeito de São Bernardo Luiz Marinho (PT) em quarto bem atrás.

Como acontece em toda campanha eleitoral, a primeira semana de horário eleitoral gratuito costuma balizar a estratégia dos candidatos. Nessas eleições, porém, há dois problemas novos: o primeiro, todos já sabiam, a campanha é muito curta para mudanças de estratégia; o segundo, era imprevisível o atentado contra a vida de Bolsonaro, que além de beneficiá-lo, ofuscou tremendamente a estratégia de vitimização de Lula pelo PT.