Nas entrelinhas: Chegada eletrizante

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“A maior dificuldade enfrentada por Haddad para virar a eleição é sua própria rejeição. A de Bolsonaro subiu de 41% para 44%, mas a do petista é quase intransponível: 52%  não votam nele”

Caiu a distância entre Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT), segundo pesquisa Datafolha divulgada ontem, o que confirma as previsões de que parcela significativa dos eleitores começa a definir ou mesmo rever o voto que pretende sufragar no próximo domingo. Realizada na quarta e na quinta-feira, a pesquisa mostra uma diferença de 12 pontos percentuais entre os dois candidatos, considerando-se os votos válidos: 56% a 44%, ou seja, uma queda de seis pontos no decorrer de uma semana. Dessa vez, a movimentação de ambos está fora da margem de erro.

A alteração decorre dos erros cometidos por Bolsonaro e seu filho, Eduardo Bolsonaro. Os ataques ao Judiciário, à imprensa e às ameaças de prisão e exílio aos adversários “vermelhos” favoreceram as acusações de Fernando Haddad quanto ao viés autoritário do adversário. O petista também foi beneficiado pela adesão de personalidades e políticos que são desafetos do PT, mas foram empurrados para esse reposicionamento em razão dessas atitudes. Na verdade, o salto alto e o fogo amigo complicaram uma disputa que parecia decidida. Entretanto, a pesquisa ainda mostra que uma virada nos próximos dois dias é muito difícil.

Os votos totais revelam queda de 50% para 48% de Bolsonaro e a subida de 35% para 38% de Haddad; redução de 10% para 8% nos votos nulos e brancos; e aumento de 5% para 6% dos que não sabem ou não quiseram responder. Ambos estão na margem de erro. A maior dificuldade enfrentada por Haddad para virar a eleição é sua própria rejeição. A de Bolsonaro subiu de 41% para 44%, mas a do petista, mesmo caindo de dois pontos, continua sendo uma muralha quase intransponível: 52% dizem que não votam no petista de jeito nenhum. Enquanto 94% dos eleitores de Bolsonaro não admitem mudar de posição, no caso de Haddad, são 91%.

Narrativas

Na reta final da campanha, Haddad centralizou sua propaganda eleitoral na defesa da democracia, com uma narrativa alarmista em relação aos riscos de implantação de uma ditadura por Bolsonaro. Ao mesmo tempo, mudou o discurso para atrair os políticos e personalidades que apoiaram outros candidatos no primeiro turno, como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que já admite votar no petista, e Ciro Gomes, que somente chegará do exterior hoje à noite. Todas as declarações autoritárias do candidato do PSL estão sendo exibidas à exaustão. Criou-se um clima de verdadeiro pavor entre os militantes das chamadas causas identitárias, como os movimentos negro e LGBT, que temem perseguições racistas e homofóbicas.

Em resposta, Bolsonaro centralizou seus ataques no envolvimento do PT com os escândalos de corrupção, principal causa da rejeição de Haddad. Foram exibidos depoimentos do ex-ministro Antônio Palocci e da marqueteira Mônica Moura ao juiz Sérgio Moro, na Operação Lava-Jato, nos quais ambos acusam Haddad de ter se beneficiado de recursos desviados da Petrobras. Também as ligações de Haddad com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que foi visitado todas as semanas pelo candidato petista no primeiro turno. Até o assassinato do prefeito Celso Daniel, de Santo André, foi exumado por Bolsonaro, que aparece no vídeo como paladino da luta contra a corrupção.

O tempo é muito curto para uma mudança de curso das campanhas, o jogo já foi jogado. Agora, o que vai decidir a eleição é a vontade soberana do eleitor. Os erros cometidos na reta final da campanha vão pesar apenas na faixa de eleitores que admitem ainda mudar o voto: 6% no caso de Bolsonaro; 9% no de Haddad. Essa margem é muito estreita, sobretudo, se não houver um fato extraordinário na campanha. A artilharia dos dois candidatos, porém, não tem nenhum Exocet capaz de pôr a pique o adversário. Não há outro protagonista na eleição que possa influenciarr no processo. A carta do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em apoio a Haddad, depois que a pesquisa do Ibope revelou que apenas 11% estão votando no petista por causa do apoio de Lula, serviu mais para atrapalhar do que para ajudar o candidato petista.

A diferença entre os dois candidatos está em 13 milhões de votos, num universo de 147, 3 milhões de eleitores. O próximo presidente da República governará um país dividido, que precisará ser pacificado. O Congresso terá um protagonismo grande na negociação das políticas governamentais, assim como o Supremo Tribunal Federal (STF), como poder moderador. O grande apoio de militares, policiais e agentes de segurança a Bolsonaro — uma militância política armada — aumenta sua responsabilidade na reta final de campanha, para evitar incidentes. Não são em vão os apelos que faz para que seus partidários mantenham a calma e evitem confrontos.