Nas entrelinhas: A blindagem de Temer

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A Lava-Jato não é uma mosca na sopa dos políticos, é um tigre solto nos corredores do Congresso, que ameaça devorar quem encontrar pelo caminho

A aprovação do projeto de lei sobre a nova meta fiscal de 2016, que prevê um rombo de R$ 170,5 bilhões na economia, ao final de uma sessão do Congresso que durou 16 horas, foi comemorada de forma exultante pelo presidente interino, Michel Temer, que acompanhou a votação de seu gabinete até alta madrugada. Representou não apenas a blindagem da política econômica do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, mas uma demonstração, na avaliação dos ministros da Casa Civil, Eliseu Padilha, e da Secretaria de Governo, Geddel Vieira Lima, de que o Palácio do Planalto tem condições de garantir a aprovação definitiva do impeachment da presidente Dilma Rousseff.

A vitória governista fechou uma semana cheia de sobressaltos para Temer, que começou com a demissão do ministro do Planejamento, senador Romero Jucá (PMDB-RR), em razão da divulgação pela Folha de S.Paulo de seus diálogos com o ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado. Ex-senador pelo Ceará, muito ligado à cúpula do Senado e ex-tucano, Machado é o novo homem-bomba da Operação Lava-Jato, pois acaba de ter a sua delação premiada homologada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Teori Zavascki. No mesmo dia da votação, o jornal revelou seus diálogos com Renan; ontem, com o ex-presidente José Sarney.

Em todas as gravações, Machado cita o presidente do PSDB, Aécio Neves, e conduz a conversa no sentido de comprometer seus interlocutores numa grande operação abafa da Lava-Jato, que precisaria envolver também ministros do Supremo. Acredita-se que outras gravações foram feitas pelo ex-presidente da Transpetro, o que aumentou os sobressaltos no Congresso. As conversas serviram para corroborar a tese do PT de que o objetivo do impeachment é acabar com a Operação Lava-Jato.

Num dos diálogos, Sarney confidenciou a Machado que a oposição no Congresso estava resistindo à ideia de apoiar uma transição com Michel Temer na Presidência da República e que o seu apoio só foi aceito após “certas condições”, as quais ele não detalhou. Disse, porém, que o acordo para o impeachment somente saiu depois de uma negociação com Renan, que, até então, publicamente, demonstrava resistência ao impeachment: “Nem Michel eles queriam, eles querem, a oposição. Eles aceitam o parlamentarismo. Nem Michel eles queriam. Depois de uma conversa do Renan muito longa com eles, eles admitiram, diante de certas condições”, disse Sarney.

Diante da delação premiada de Machado e de informações de que as empreiteiras Odebrecht e OAS preparam acordos de leniência com Ministério Público, com base nas delações premiadas de seus principais executivos, políticos da oposição podem de fato serem arrastados para o olho do furacão da Operação Lava-Jato, principalmente do PSDB, partido citado de forma ameaçadora por Machado: “Renan, eu fui do PSDB 10 anos. Não sobra ninguém, Renan”.

A corrida
Começa uma corrida para aprovar o pacote fiscal de Meirelles. A base parlamentar de Temer chega a 360 dos 513 deputados e 60 dos 81 senadores. As principais medidas são: limitação da alta dos gastos públicos, que não poderá ser superior à inflação do ano anterior, com limite dos investimentos em Saúde e Educação, o que depende de emenda constitucional; fim da exclusividade da Petrobras nas atividades do pré-sal e da obrigação de a estatal participar com pelo menos 30% dos investimentos em todos os consórcios de exploração da camada, que precisa ser aprovado pela Câmara; mudança nos critérios para se requerer o benefício da aposentadoria; Lei de Responsabilidade das Estatais, que estabelece critérios para nomeação de dirigente, também já aprovada pelo Senado; critérios meritocráticos para escolha do presidente dos conselhos de administração e de diretores das empresas, inclusive presidente, diretor-geral ou diretor-presidente.

Acredita-se que a aprovação dessas medidas pode trazer de volta os investimentos e cimentar a maioria necessária para o afastamento definitivo da presidente Dilma Rousseff pelo Senado. Ocorre que a Lava-Jato não é uma mosca na sopa dos políticos, é um tigre solto nos corredores do Congresso, que ameaça devorar quem encontrar pelo caminho. As conversas de Machado com Jucá, Renan e Sarney revelam uma disposição política de tentar abafar a Lava-Jato, embora todos neguem. Quem tentou, até agora, quebrou a cara.