Acuado pelas denúncias e isolado, o PT aposta todas as fichas no protagonismo de Lula
A incursão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em Brasília, para um jantar com a presidente Dilma Rousseff, na noite de terça-feira, no Palácio da Alvorada, e uma reunião na residência do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), ontem pela manhã, com 25 senadores, enfraqueceu ainda mais o atual governo. Deixou um rastro de especulações de que assumirá a articulação política do governo, tese defendida pelo secretário-geral da Presidência, Ricardo Berzoini, o que faria da presidente da República uma espécie de boneca de ventríloquo.
Às vésperas de mais uma grande manifestação de protesto contra o governo, convocada pelos grupos de oposição das redes sociais e pelos partidos oposicionistas para o próximo domingo, os fatos corroboram a impressão de que o governo Dilma virou suco. Perdeu completamente a capacidade de iniciativa política e reage de forma atabalhoada em todas as frentes da crise que o país atravessa.
No Congresso, o governo tenta aprovar a fórceps na Comissão Mista de Orçamento propostas que apontam na direção contrária às expectativas dos agentes econômicos e da sociedade: insiste na volta da CPMF, o imposto do cheque; com apoio da AGU, tenta aprovar nova pedalada fiscal ao transformar créditos judiciais ainda não sacados pelos contribuintes em saldos de superavit; para completar, quer usar um terço das reservas internacionais para compensar a queda na arrecadação e cobrir o rombo nas contas públicas.
No Judiciário, o governo sofreu ontem grande revés: por ampla maioria, o Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu a nomeação, pela presidente Dilma Rousseff, do novo ministro da Justiça, Wellington César Lima e Silva, empossado na semana passada. Contra o parecer do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que defendeu a permanência do ministro, a maioria dos ministros acolheu pedido do PPS, representado pelo advogado Renato Campos Galuppo, contra a nomeação. A medida é extensiva a todos os procuradores que exercem cargos no Executivo, em níveis municipal, estadual e federal. Diante da decisão, o PT voltou à carga para indicar um de seus deputados para a pasta. O mais cotado é Paulo Teixeira (PT-SP), que é advogado e muito ligado ao presidente Lula.
Dilma dorme e acorda pensando no seu impeachment, ameaça que recrudesce na medida que surgem novas delações premiadas. O governo teme a confirmação de que os empreiteiros Léo Pinheiro e Marcelo Odebrecht estejam negociando as respectivas delações com a força-tarefa da Lava-Jato. Mais ainda a delação premiada do ex-líder do governo no Senado Delcídio do Amaral (PT-MS), que dependeria apenas da aprovação do ministro Teori Zavascki, relator da Lava-Jato no STF.
Ontem, o senador Telmário Mota (PDT-RR), relator da representação que apura quebra de decoro parlamentar por parte de Delcídio no Conselho de Ética, apresentou relatório favorável à continuação do processo de cassação do senador petista no colegiado. Agora, os senadores têm cinco dias úteis para analisar o relatório antes de votá-lo, o que deve ocorrer na próxima quarta. A cassação do mandato de Delcídio do Amaral seria uma espécie de gatilho da delação, pois ele perderia o foro privilegiado.
Foro privilegiado
Acuado pelas denúncias e isolado, o PT aposta todas as fichas no protagonismo de Lula, que ofusca Dilma. A legenda deseja que o líder petista assuma a articulação política no lugar de Berzoini, o que lhe garantiria foro privilegiado. Lula resiste, porque seria uma espécie de confissão de culpa, mas pode mudar de posição em razão do seu indiciamento pelo Ministério Público de São Paulo. Desde ontem, é acusado de estelionato, falsidade ideológica, organização criminosa e lavagem de dinheiro por causa da suposta compra do tríplex em Guarujá.
Mais 15 pessoas foram denunciadas, entre a ex-primeira dama dona Marisa Letícia e um dos filhos de Lula, Fábio Luís Lula da Silva, que seriam beneficiários do tríplex. Os crimes foram cometidos em empreendimentos da Bancoop — cooperativa dos bancários — que foram repassados posteriormente à construtora OAS.
O Instituto Lula negou as acusações: “O ex-presidente não cometeu nenhuma ilegalidade e não é dono do apartamento no Guarujá nem do sítio em Atibaia. O promotor Cássio Conserino já tinha anunciado que faria a denúncia em 22 de janeiro na revista Veja, o que mostra que ele não é imparcial. Além de não ser o promotor natural do caso e haver um recurso no STF sobre a competência desta investigação, se é do Ministério Público Federal ou do Ministério Público de São Paulo”