VISTO, LIDO E OUVIDO pelos brasilienses

Publicado em Íntegra

Autoria: Felipe de Souza Ticom  JUSTIÇA ESPECIALIZADA  Há exatos vinte anos, aos 26 de setembro de 1995, publicou-se a Lei n° 9.099, “que dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais e dá outras providências”. Em alternativa aos procedimentos ordinário e sumário, classificados como comuns, fez surgir o procedimento sumaríssimo, especializado, adequado às causas cíveis de menor complexidade e penais de menor potencial ofensivo, ambas jurídica e popularmente conhecidas como “pequenas causas”. Com vistas a dar um tratamento diferenciado aos litígios cíveis e criminais dessa natureza, delimitados, respectivamente, pelos artigos 8º e 61 da referida Lei, os Juizados Especiais Cíveis e os Juizados Especiais Criminais, ou simplesmente “JECs” e “JECRIMs”, pautaram-se pelos princípios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, dos quais apenas a simplicidade não se aplicou também à esfera penal, como se observa do cotejo entre os artigos 2º e 62. Considerando o complexo e rico princípio da ampla defesa, uma aparente contradição a ser evitada. Não obstante, a especialização no tratamento não se justificou pelos princípios, considerados norteadores, mas, sobretudo, pelo fim primário ao qual a norma se destinou, a saber: a democratização do acesso à justiça. Por intermédio do implemento de um microssistema que pudesse absorver os conflitos mais quotidianos ao cidadão, buscou-se o amplo acesso à prestação jurisdicional, notadamente aos que viam na Justiça Comum as inviabilidades econômica e processual, em razão dos custos financeiro e psicológico ainda inerentes aos seus procedimentos. Em paralelo, objetivou-se também amenizar a sobrecarga do Poder Judiciário, uma vez que as demandas mais corriqueiras, a exemplo das consumeristas, dispunham da mesma sistemática de composição quando comparadas a outras mais complexas, vale dizer, um contrassenso ao pleito social de racionalização das burocracias estatais. À luz do conceito de audiência UNA (Conciliação, Instrução e Julgamento), enfatizou-se o aperfeiçoamento técnico daqueles que atuam no momento inicial reservado ao emprego do mecanismo conciliatório. Por intermédio de técnicas previamente ensinadas aos conciliadores, a exemplo do rapport e do empowerment, são os litigantes compreendidos e estimulados ao diálogo, sobre o qual poderão alcançar a composição voluntária de suas lides. Cumpre observar que a composição não se restringe ao pedido objeto da audiência, mas também aos reais fatores sociais que os levaram a divergir, uma vez que a audiência de conciliação possui caráter pedagógico ‑ responsável por ensejar uma mudança de comportamento, e, consequentemente, mudança de cultura. Perceba-se que, paulatinamente, a cultura do dissenso evolui à cultura do consenso, estimulando-se, assim, a pacificação social. Obviamente, muito embora não tenha, por si só, alterado a realidade sócio-jurídica nacional, a Lei n° 9.099/95 muito contribuiu para as novas políticas públicas favoráveis à substituição da heterocomposição estatal pela autocomposição das partes, a exemplo da Resolução n° 125/2010 do Conselho Nacional de Justiça ‑ CNJ, que dispõe sobre a “Política Judiciária Nacional de tratamento adequado dos conflitos de interesses no âmbito do Poder Judiciário e dá outras providências”. Ainda, serviu de inspiração até mesmo para o novo Código de Processo Civil a entrar em vigor, o qual privilegia em muito esse e outros métodos de resolução consensual, com vistas às mesmas aspirações de amplo acesso, racionalização e pacificação. Por oportuno, em diapasão às comemorações alusivas ao vigésimo aniversário da Lei, a exemplo da proposta de redescoberta dos juizados especiais, conduzida pela Corregedoria do CNJ, pontua-se que o conceito de justiça não pode restringir-se ao necessário exercício da jurisdição estatal, muito embora dela necessite de supervisão, na medida em que também há que ser abarcado considerando-se iniciativa e participação individuais. Somente por intermédio da gradual transferência de responsabilidades ao cidadão, será possível o desenvolvimento de uma democracia madura, sadia e livre de paternalismos de toda espécie. Afinal, a liberdade não deve se traduzir apenas pelo reconhecimento de direitos, mas também pela emancipação social em relação ao Estado.   Felipe de Souza Ticom é graduando do curso de Direito pelo UniCEUB, estagiário do Gabinete da Presidência do Superior Tribunal de Justiça e conciliador membro do Quadro Geral de Conciliadores do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios.

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