Causídico

Publicado em ABERTURA

Friedrich Nietzsche, com a verve que lhe era característica, certa feita afirmou que os advogados de um criminoso só raras vezes são suficientemente artistas para aproveitar em favor do réu a terrível beleza do seu ato. Observando a frase mais de perto e confrontando-a contra o pano de fundo de nosso escandaloso presente, podemos inferir que, “nunca na história recente deste país”, uma categoria profissional foi tão ardorosamente solicitada .

Verdadeiramente, os causídicos vivem dias de grande bonança, com os escritórios repletos de políticos de todas as matizes ideológicas e empresários de todo o ramo de atividade. A movimentação frenética ganha maior agitação, conforme avançam as investigações policiais, catalisadas ainda pela adesão crescente das delações premiadas.

No salve-se quem puder do momento, os custos das causas variam de acordo com o grau de envolvimento do cliente e sua posição no organograma do Estado ou da empresa. O que não varia são os altos valores dos honorários, necessários até para tornar crível a defesa de cada um.

Para os despeitados, que não puderam participar do banquete da rapinagem, resta o consolo de que a maior parte do butim será dissipada com o pagamento das dispendiosas defesas. Pouco importa aqui saber se é lícito o uso de dinheiro de fonte contaminada para custear causas jurídicas.

Conselhos, como feitos pelo saudoso Sobral Pinto, que recomendava aos advogados ser, antes de qualquer ação, o juiz inicial da causa para se certificar de que a justiça está com a parte, já não fazem adeptos. Em um governo, em que os mais renomados jurisconsultos do país assumiram definitivamente o protagonismo político, é fácil perceber que alguma coisa não vai bem no interior do Estado.

Para uma administração em que as Controladorias e Advocacias da União vão na dianteira dos ministérios da Educação, Saúde ou Planejamento e postas sob a luz constante de holofotes, a defesa dos reais interesses da população são deixados de lado.

Impossibilitados de questionar, no mérito, as inúmeras e severas acusações que recaem sobre os ombros do grosso desse governo, dezenas dos estrelados advogados partiram para a chicana e acabam de divulgar uma carta aberta em que fazem manifesto contra a Lava-Jato.

No documento, a elite do direito afirma que “nunca houve um caso penal em que as violações às regras mínimas para um justo processo estejam ocorrendo em relação a um número tão grande de réus e de forma tão sistemática”. Trata-se de inverdade que revela como estratégia a tentativa de desacreditar as investigações, seus métodos e principalmente sua figura central, na pessoa do juiz Sérgio Moro.

Como importância, o documento deixa o scripta manent para a posteridade, o registro de um tempo em que a Justiça fica nua deixando-se interpretar por manejos por leis feitas sob medida para acomodar, com conforto, os que dela desdenharam.

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